Os cuidados da estabilização de aterros com blocos de EPS
Por Juliana Nakamura
Embora no Brasil a execução de aterros rodoviários com blocos de poliestireno expandido (EPS) tenha um histórico recente, essa é uma técnica utilizada pelo menos desde os anos 1970 em países como Noruega, Japão, Chile e Venezuela. Indicada para locais onde há solos moles, ou seja, onde o solo de fundação é de baixa resistência, a execução de aterros com EPS é uma alternativa à aplicação de geossintéticos planos (filmes, laminados, grelhas etc.) que, embora melhorem significativamente os índices físicos do solo, não podem alterar o peso específico do maciço.
A técnica consiste na substituição parcial do aterro tradicional (terra, cinza, areia, pedras etc.) por blocos de EPS de alta densidade. Fácil de manipular, biologicamente inerte, extremamente leve e com alta resistência mecânica, sobretudo à compressão, o EPS é um material celular plástico que consiste de pequenas partículas de forma esférica. Com estrutura microcelular contendo aproximadamente 98% de ar, o poliestireno expandido tem peso específico da ordem de 1% em relação aos solos, mas com boas propriedades mecânicas. Dessa forma, quando devidamente aplicado, pode reduzir as possibilidades de deformações das camadas moles do terreno.
Blocos de EPS foram utilizados para estabilizar parte do aterro do viaduto da principal via de acesso à cidade de Tubarão (SC). Fatores como tempo e custo contaram a favor do EPS na comparação com outras técnicas, como jet grouting, para aumentar a resistência do solo mole |
Além disso, em comparação com soluções convencionais que utilizam o próprio solo como material de construção, o aterro com EPS proporciona fácil e rápida execução. "O clima representa um obstáculo enorme para a compactação de aterros com solos por causa da restrição à alta umidade. Já o aterro com EPS pode ser construído até sob chuva, aspecto que pode ser decisivo em obras em que o prazo de execução é um parâmetro importante", compara o engenheiro Marciano Maccarini, professor de geotecnia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
"Trata-se de uma excelente opção para a construção de aterros, especialmente em encontros de pontes ou viadutos, em que os esforços horizontais nas estacas são reduzidos a valores facilmente absorvidos por elas. Ao mesmo tempo, os recalques (deformações verticais), que para os solos moles podem ser muito altos quando os aterros são construídos com solos compactados, são reduzidos a valores muito menores quando carregados por EPS", acrescenta o professor, que é Ph.D. em mecânica dos solos pela Imperial College of Science and Technology da Universidade de Londres.
Elaboração de projetoO dimensionamento de aterros com blocos de EPS deve ser realizado em duas etapas considerando-se todas as solicitações (externas e internas) presentes na obra. A primeira fase consiste no dimensionamento global da estrutura e deve garantir a segurança contra os mecanismos de ruptura normalmente adotados em aterros convencionais, tais como deslizamento na base da estrutura, tombamento, capacidade de carga da fundação e ruptura global.
A segunda etapa baseia-se no dimensionamento local dos blocos de EPS e deve considerar a resistência mecânica dos blocos (compressão, tração, flexão, cisalhamento e fluência) e o controle de flutuação do aterro. É importante que, nesse momento, seja feita a modulação do aterro de forma a evitar continuidades verticais e horizontais entre as juntas de blocos.
Quando se fala em obras de geotecnia com poliestireno expandido, propriedades como resistência e capacidade de suporte de cargas estão diretamente associadas à densidade dos blocos.
Para aterros de rodovias, normalmente são utilizados blocos de densidade entre 20 e 30 kg/m3 com geometria retangular. São bastante comuns dimensões como 4 m x 1,20 m x 0,50 m e 2 m x 1 m x 1,20 m. Além disso, aceitam-se tolerâncias dimensionais de mais ou menos 0,5% e tolerância de formato de 0,5%/L.
No dimensionamento dos blocos, devem ser consideradas a estrutura global da construção, a resistência mecânica dos blocos e o controle de flutuação do aterro |
O que prever no editalÉ fundamental que a execução de serviços de geotecnia e o manejo de solo sejam respaldados por um projeto desenvolvido por profissional habilitado (Crea), que preveja ao menos:
● Detalhamento de cotas
● Diagramação da colocação dos blocos e suas respectivas camadas
● Informações sobre a base de colocação das camadas
● Informações sobre a cobertura do filme de polietileno
● Detalhes sobre a cobertura de proteção mecânica horizontal (aterro ou laje) e vertical (muros ou placas), conforme o caso
● Controles tecnológicos
● Detalhamento de cotas
● Diagramação da colocação dos blocos e suas respectivas camadas
● Informações sobre a base de colocação das camadas
● Informações sobre a cobertura do filme de polietileno
● Detalhes sobre a cobertura de proteção mecânica horizontal (aterro ou laje) e vertical (muros ou placas), conforme o caso
● Controles tecnológicos
"Na hora de elaborar uma licitação, é fundamental que a empresa contratada tenha experiência comprovada em obras com emprego de EPS ou que um especialista da área seja contratado para orientar a execução dos serviços de forma correta e segura", salienta Maccarini, lembrando ainda que a capacidade do fabricante de EPS atender ao cronograma da obra deve ser sempre considerada quando de sua contratação, sob o risco de comprometer o cronograma e o planejamento do serviço.
Aterros com EPS, em geral, estão associados em maior ou menor grau à execução de serviços paralelos, como muros de concreto, lajes de concreto, entre outros. Portanto, a velocidade de execução da obra não depende somente da aplicação do poliestireno expandido. "A produtividade para o caso do EPS tende a ser mais comprometida pela dificuldade do fabricante de atender à demanda do pedido, do que propriamente às dificuldades com relação às técnicas utilizadas para esse material", diz o professor da UFSC.
Controles de execução
A aceitação do EPS para uma determinada obra deve estar vinculada à verificação da resistência, densidade e geometria dos blocos. Eles devem apresentar superfície nivelada e boa soldagem das pérolas (flocos de EPS que formam as peças). É recomendável que uma amostra dos blocos seja previamente pesada e medida para verificar seu peso e volume. Também devem ser realizados ensaios de absorção de água. Após sete dias de imersão total, a absorção pelo material não deve ultrapassar 7%.
Antes de irem para o canteiro, as peças são cortadas na indústria a fio quente. Para garantir sua estabilidade dimensional, é recomendado que fiquem estocadas por pouco tempo, no máximo de 15 a 20 dias.
A incidência prolongada de raios UV altera as propriedades do poliestireno expandido, por isso, é importante manter os blocos protegidos.
Durante a execução dos serviços, deve-se considerar que o EPS, por ser muito leve e tendo em vista que os solos moles ocorrem em regiões baixas ou de banhado sujeitas a inundações, apresenta o inconveniente de ser facilmente flutuável. Para evitar problemas, ações simples como a colocação de um peso sobre as peças devem ser adotadas. "Durante a execução de obras com a utilização de EPS, é importante monitorar o clima continuamente para prevenir a possibilidade de ocorrer flutuação dos blocos, caso ocorra enchente, quando o peso que inibe a flutuação ainda não estiver sido construído", salienta o professor da UFSC.
Também por conta do seu baixo peso, os blocos de EPS demandam cuidados no armazenamento durante toda execução da obra para evitar serem carregados pelo vento ou até sofrerem algum tipo de vandalismo. "Tendo em vista que líquidos, como solventes, gasolina, óleo e outros produtos químicos que são normalmente transportados nas rodovias podem atacar o EPS, é fundamental que o conjunto dos blocos do aterro seja coberto por manta geossintética para evitar que acidentes com veículos que transportam esses materiais provoquem danos na estrutura do EPS e, consequentemente, do aterro", destaca Maccarini.
Método executivo de aterro com blocos de EPS | |
1. Sondagem e projeto - O projeto do aterro é antecedido por uma sondagem geotécnica, em que é medida a resistência do solo por meio de perfurações com o método Standard Penetration Test (SPT). Após a sondagem, são definidas características como a densidade dos blocos de EPS e o seu posicionamento no aterro. No projeto, leva-se em conta o tamanho padrão das peças para evitar cortes e ter melhor aproveitamento e produtividade. Se forem necessários, os recortes são feitos na própria obra.
2. Preparação do terreno - A camada base em que os blocos serão colocados deve ter cerca de 10 cm e estar nivelada. O grau de inclinação dessa base, feita geralmente com areia, não pode ultrapassar 0,25% (1 cm em 4 m). Eventualmente, pode ser necessário o rebaixamento do lençol freático para evitar que os blocos flutuem por ação do empuxo hidrostático em períodos de cheia.
3. Montagem - Os blocos de EPS são posicionados manualmente e de forma ordenada em juntas de amarração, seguindo o desenho do projeto. Na montagem, não devem sobrar vãos entre as peças, as camadas devem estar todas niveladas e as juntas não devem coincidir. Entre uma camada e outra da montagem, as peças são fixadas com conectores metálicos tanto na vertical, quanto na horizontal para favorecer a estabilidade do conjunto. Durante a montagem, é recomendável utilizar sacos de areia sobre as peças para evitar seu deslocamento.
4. Proteção - Após a montagem, o conjunto é revestido com uma geomembrana de polietileno de alta densidade (PEAD) contra possíveis ataques químicos. Sobre a geomembrana, é lançada uma camada com no mínimo 60 cm de terra a ser compactada e sobre a qual é executado o pavimento de maneira convencional.
5. Confinamento - Para uniformizar a dissipação de cargas nas camadas de EPS, os blocos devem ser confinados por muros de contenção laterais, aterro convencional, vala escavada ou sistemas de geotêxtil, conforme definido em projeto geotécnico. Para casos em que as tensões atuantes no EPS ultrapassem o limite elástico do material, também se indica a execução de uma camada de proteção mecânica com solo (de no mínimo 30 cm) ou de laje de concreto armado de aproximadamente 15 cm.
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Contenção em camadas | ||
Um aterro leve constituído por blocos de poliestireno expandido (EPS) possui cinco unidades básicas:
1. Blocos de poliestireno expandido: são responsáveis por formar o corpo do aterro. Além de resistirem às solicitações externas, possuem massa específica reduzida de forma a não comprometerem a fundação do aterro. Usualmente, são utilizados blocos de massa específica variando de 20 kg/m³ a 30 kg/m³.
2. Base: fina camada de solo que tem a função de regularizar a superfície e receber o aterro composto pelos blocos.
3. Cobertura: composta por uma camada com cerca de 80 cm de solo compactado (com ou sem uma laje de concreto, dependendo das condições da obra) sobre o aterro leve, que redistribui uniformemente as cargas de superfície, protege o EPS contra puncionamentos e impactos localizados e confina os blocos.
4. Sistema de drenagem: drenos de areia e/ou de geossintéticos que evitam subpressões de flutuação no aterro provenientes do contato extremamente prejudicial do EPS com a água. Outro motivo para impedir esse contato é a absorção de água pelos blocos, que resultam em um aumento drástico de sua massa específica e, consequente, perda da função de aterro leve.
5. Sistema de impermeabilização: formado por geomembranas, é indicado em aterros de rodovias para impedir o contato de substâncias nocivas aos blocos de EPS (por exemplo, derivados de petróleo).
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