sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Manejo de água no país é crítico, afirmam pesquisadores

Manejo de água no país é crítico, afirmam pesquisadores


09/10/2013
Por Elton Alisson
Agência FAPESP – A gestão de recursos hídricos no Brasil representa um problema crítico, devido à falta de mecanismos, tecnologias e, sobretudo, de recursos humanos suficientes para gerir de forma adequada as bacias hidrográficas do país. A avaliação foi feita por pesquisadores participantes do “Seminário sobre Recursos Hídricos e Agricultura”, realizado no dia 2 de outubro, na FAPESP.
O evento integrou as atividades do 58º Prêmio Fundação Bunge e do 34º Prêmio Fundação Bunge Juventude que, neste ano, contemplaram as áreas de Recursos Hídricos e Agricultura e Crítica Literária. Na área de Recursos Hídricos e Agricultura os prêmios foram outorgados, respectivamente, aos professores Klaus Reichardt, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), da Universidade de São Paulo (USP), e Samuel Beskow, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
“O Brasil tem problemas de gestão de recursos hídricos porque não há mecanismos, instrumentos, tecnologias e, acima de tudo, recursos humanos suficientemente treinados e com bagagem interdisciplinar para enfrentar e solucionar os problemas de manejo da água”, disse José Galizia Tundisi, pesquisador do Instituto Internacional de Ecologia (IIE), convidado a participar do evento.
“É preciso gerar métodos, conceitos e mecanismos aplicáveis às condições do país”, avaliou o pesquisador, que atualmente dirige o programa mundial de formação de gestores de recursos hídricos da Rede Global de Academias de Ciências (IAP, na sigla em inglês) – instituição que representa mais de cem academias de ciências no mundo.
De acordo com Tundisi, as bacias hidrográficas foram adotadas como unidades prioritárias de gerenciamento do uso da água pela Política Nacional de Recursos Hídricos, sancionada em 1997. Todas as bacias hidrográficas do país, contudo, carecem de instrumentos que possibilitem uma gestão adequada, apontou o pesquisador.
“É muito difícil encontrar um comitê de bacia hidrográfica [colegiado composto por representantes da sociedade civil e responsável pela gestão de recursos hídricos de uma determinada bacia] que esteja totalmente instrumentalizado em termos de técnicas e de programas para melhorar o desempenho do gerenciamento de uso da água”, afirmou.
Modelagem hidrológica
Segundo Tundisi, alguns dos instrumentos que podem facilitar a gestão e a tomada de decisões em relação ao manejo da água de bacias hidrográficas brasileiras são modelos computacionais de simulação do comportamento de bacias hidrográficas, como o desenvolvido por Beskow, professor do Departamento de Engenharia Hídrica da UFPel, ganhador da atual edição do Prêmio Fundação Bunge Juventude na área de Recursos Hídricos e Agricultura.
Batizado de Lavras Simulation of Hidrology (Lash), o modelo hidrológico foi desenvolvido por Beskow durante seu doutorado, realizado na Universidade Federal de Lavras (Ufla), em Minas Gerais, com um período na Purdue University, dos Estados Unidos.
“Há vários modelos hidrológicos desenvolvidos em diferentes partes do mundo – especialmente nos Estados Unidos e Europa –, que são ferramentas valiosíssimas para gestão e tomada de decisões relacionadas a bacias hidrográficas”, disse Beskow.
“Esses modelos hidrológicos são úteis tanto para projetar estruturas hidráulicas – pontes ou reservatórios –, como para fazer previsões em tempo real de cheias e enchentes, como para medir os impactos de ações do tipo desmatamento ou mudanças no uso do solo de áreas no entorno de bacias hidrográficas”, afirmou.
De acordo com o pesquisador, a primeira versão do Lash foi concluída em 2009 e aplicada em pesquisas sobre modelagem de chuva e vazão de água para avaliação do potencial de geração de energia elétrica em bacias hidrográficas de porte pequeno, como a do Ribeirão Jaguará, em Minas Gerais, que possui 32 quilômetros quadrados.
Em razão dos resultados animadores obtidos, o pesquisador começou a desenvolver, a partir de 2011, a segunda versão do modelo de simulação hidrológica, que pretende disponibilizar para os gestores de bacias hidrográficas de diferentes dimensões.
“O modelo conta agora com um banco de dados por meio do qual os usuários conseguem importar e armazenar dados de chuva, temperatura e umidade e uso do solo, entre outros parâmetros, gerados em diferentes estações da rede de monitoramento de uma determinada bacia geográfica e, que permitem realizar a gestão de recursos hídricos”, contou.
Uma das principais motivações para o desenvolvimento de modelos e de simulação hidrológica no Brasil, segundo o pesquisador, é a falta de dados fluviométricos (de medição de níveis de água, velocidade e vazão nos rios) das bacias hidrológicas existentes no país.
É baixo o número de estações fluviométricas cadastradas no Sistema de Informações Hidrológicas (HidroWeb), operado pela Agência Nacional de Águas (ANA), e muitas delas estão fora de operação, afirmou Beskow.
“Existem pouco mais de cem estações fluviométricas no Rio Grande do Sul cadastradas nesse sistema, que nos permitem obter dados de séries temporais de até dez anos”, disse o pesquisador. “Esse número de estações é muito baixo para fazer a gestão de recursos hídricos de um estado como o Rio Grande do Sul.”
Uso racional da água
Beskow e Klaus Reichardt – que também é professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) – destacaram a necessidade de desenvolver tecnologias para usar a água de maneira cada vez mais racional na agricultura, uma vez que o setor consome a maior parte da água doce prontamente disponível no mundo hoje.
Do total de 70% da água encontrada na Terra, 97,5% é salgada e 2,5% é doce. Desse percentual ínfimo de água doce, no entanto, 69% estão estocados em geleiras e neves eternas, 29,8% em aquíferos e 0,9% em reservatórios. Do 0,3% prontamente disponível, 65% são utilizados pela agricultura, 22% pelas indústrias, 7% para consumo humano e 6% são perdidos, ressaltou Reichardt.
“No Brasil, temos a Amazônia e o aquífero Guarani que poderão ser explorados”, afirmou o pesquisador que teve projetos apoiados pela FAPESP.
Reichardt ganhou o prêmio por sua contribuição em Física de Solos ao estudar e desenvolver formas de calcular o movimento de água em solos arenosos ou argilosos, entre outros, que apresentam variações. “Isso foi aplicado em vários tipos de solo com condutividade hidráulica saturada em função da umidade, por exemplo”, contou.
O pesquisador vem se dedicando nos últimos anos a realizar, em colaboração com colegas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), tomografia computadorizada para medida de água no solo. “Por meio dessa técnica conseguimos desvendar fenômenos muito interessantes que ocorrem no solo”, disse Reichardt.
Custo da inanição
O evento contou com a presença de Eduardo Moacyr Krieger e Carlos Henrique de Brito Cruz, respectivamente vice-presidente e diretor científico da FAPESP; Jacques Marcovitch, presidente da Fundação Bunge; Ardaillon Simões, presidente da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (Facepe), e José Antônio Frizzone, professor da Esalq, entre outras autoridades.
Em seu pronunciamento, Krieger apontou que a Fundação Bunge e a FAPESP têm muitas características em comum. “Ao premiar anualmente os melhores pesquisadores em determinadas áreas, a Fundação Bunge revela seu cuidado com o mérito científico e a qualidade das pesquisas”, disse Krieger.
“A FAPESP, de certa forma, também faz isso ao ‘premiar’ os pesquisadores por meio de Bolsas, Auxílios e outras modalidades de apoio, levando em conta a qualidade da pesquisa realizada.”
Brito Cruz ressaltou que o prêmio concedido pela Fundação Bunge ajuda a criar no Brasil a possibilidade de pesquisadores se destacarem na sociedade brasileira por sua capacidade e realizações intelectuais.
“Isso é essencial para se construir um país que seja dono de seu destino, capaz de criar seu futuro e enfrentar novos desafios de qualquer natureza”, disse Brito Cruz. “Um país só consegue avançar tendo pessoas com capacidade intelectual para entender os problemas e criar soluções para resolvê-los.”
Por sua vez, Marcovitch avaliou que o problema da gestão do uso da água no país pode ser enfrentado de duas formas. A primeira parte da premissa de que o país está deitado em berço esplêndido, tem recursos naturais abundantes e, portanto, não precisaria se preocupar com o problema. A segunda alerta para as consequências da inação em relação à necessidade de se fazer gestão adequada dos recursos hídricos do país, como Tundisi vem fazendo, para estimular pesquisadores como Beskow e Reichardt a encontrar respostas.
“[Nós, pesquisadores,] temos a responsabilidade de elevar a consciência da sociedade sobre os riscos e o custo da inação em relação à gestão dos recursos hídricos do país”, disse. 

Apesar de proibição, cigarro eletrônico se dissemina em São Paulo

Apesar de proibição, cigarro eletrônico se dissemina em São Paulo

13/10/2013 | 15h04min














Há uma nuvem sobre São Paulo. Ela sai do cigarro eletrônico, engenhoca criada para substituir a queima de tabaco e cuja venda e importação são proibidas no país em razão das incertezas de seus efeitos na saúde. Mesmo assim, já pode ser visto sendo utilizado em restaurantes, bares e baladas da cidade.
"Fumo em todo lugar desde que trouxe de Los Angeles, há um ano", diz a empresária Cristina Nabil, 53, com um modelo da marca americana Blu em punho. "Aprendi lá que não faz mal para quem está perto, então é OK fumar num restaurante."
Não é bem assim. Há poucos estudos realizados. Em um deles, efetuado há seis meses nos Estados Unidos, mostra que o vapor emitido contém substâncias cancerígenas, ainda que em quantidades menores em relação ao cigarro comum (veja quadro na pág. 31).
Seja como for, Nabil diz ter convencido as duas melhores amigas a aderirem à novidade, com a qual nunca passou por problemas. A não ser uma vez, quando funcionários de uma loja de bolsas na rua Oscar Freire, zona oeste, pediram que apagasse a geringonça ou saísse para fumar.
"Respondi que não era apagar, e sim desligar, e que em Paris sempre compro fumando. Não adiantou. Ê, Brasil!" Saiu da loja na promessa de "nunca mais voltar".
O DJ Flavio Romão, 33, ficou quatro meses em lua de mel com o seu modelo, comprado em Nova York. "Optei por causa da saúde. E melhorou: não tive pigarro nem fiquei passando mal por fumar muito."
Retornou ao cigarro de papel faz pouco por não achar no país o líquido com nicotina necessário para a recarga de sua máquina. Romão diz que, no período, fumou em baladas em Pinheiros e no centro. "Usei tranquilo, ninguém me encheu."
Para o empresário Anderson Ribeiro, 35, o "e-fumo" foi um degrau entre o vício e a abstinência. "Comecei a usar e acabei largando o normal." Ele diz que, sem a obrigação de "matar" um cigarro inteiro a cada vez que fumava, diminuiu a quantidade aos poucos.
A coordenadora da área de cardiologia do Programa de Tratamento do Tabagismo do InCor, Jaqueline Scholz Issa, é entusiasta do uso do cigarro eletrônico como uma terapia de redução de danos.
"É um produto para o indivíduo que não consegue parar de fumar ter um cigarro menos tóxico. Mas, por conter nicotina, não é uma forma de tratar a dependência." A médica, no entanto, pondera: "Mesmo com concentrações menores, não é possível avaliar o impacto disso na saúde".
Com a capacidade de levar nicotina ao cérebro de maneira rápida, os eletrônicos funcionam como um cigarro comum. Porém, sem a combustão do tabaco e substâncias químicas, como o alcatrão.
A falta de certezas produz situações delicadas. Quando ainda fumava o eletrônico, Anderson Ribeiro foi repreendido em alguns lugares. "Tem gente que fica ofendidíssima. É como se eu estivesse violando o espaço que os não-fumantes conquistaram", diz ele.
"Agora, entro no shopping fumando Blu e ninguém pode falar nada. Parece uma caneta e [os seguranças] não sacaram", conta a artista plástica Patricia Mariani, 56. Ela ganhou o eletrônico da filha neste mês. E o objetivo, ressalta, é reduzir o consumo do cigarro tradicional.
ILEGAL
"Para consumo em ambiente fechado, [o eletrônico] tem de ser entendido como cigarro [comum]", ressalta André Luiz Oliveira, da Gerência Geral de Produtos Derivados de Tabaco da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
Ou seja, o eletrônico se insere na lei federal que não permite fumar em aeronaves e veículos de transporte coletivo desde 1996. O mesmo aplica-se à lei antifumo paulista, que barrou a partir de 2009 o consumo em ambientes coletivos no Estado.
No mesmo ano, a Anvisa proibiu a venda e importação no país, por falta de comprovação científica da sua qualidade e dos possíveis efeitos na saúde. "Ninguém sabe do que se trata", diz Oliveira. "Há casos nos EUA de explosão de cigarro eletrônico."
Dois anos atrás, a Anvisa identificou que o Paraguai é um dos pontos de origem dos produtos. Aqui, não é difícil encontrá-los. Para esta reportagem, a sãopaulo comprou um, de modelo simples, em uma lojinha na 25 de março por R$ 12,50, e outro, muito mais avançado, de R$ 400, por meio de um site.
Já quem tenta comprá-lo pela internet de vendedores no exterior costuma perder o produto: as máquinas de raio-X existentes nos Correios o identificam. Registram-se em média dois flagrantes por dia. A Receita Federal retém a encomenda e a devolve ao país de origem.
A chance de punição para o consumidor, por sua vez, é remota. "Se analisarmos friamente a lei, é contrabando", diz Humberto Fabretti, professor de direito do Mackenzie. "Mas não acredito que se faça algo por conta de um cigarro. É mais ou menos a lógica aplicada ao CD pirata."
VITRINE
Nessa batalha, a novidade tecnológica tem conquistado adeptos entre os famosos. Neste ano, a modelo inglesa Kate Moss fumou um no Baretto, bar do hotel Fasano, no Jardim Paulista, zona oeste. Ronaldo e sua ex-mulher Bia Anthony também foram fotografados usando.
O colunista social Amaury Jr, 62, engrossa os adeptos. Enquanto conversa com a reportagem em sua produtora, no Jardim Europa, saca um modelo descartável da Blu.
Ainda que tenha no estojo variedades de aroma como champanhe e baunilha, opta no dia a dia pelo sabor que imita Marlboro Light (em Los Angeles, é possível utilizar até óleo de haxixe).
A descoberta do cigarro eletrônico, anos atrás, o animou. Muito. "Eu até pensei em entrar nesse mercado." Mas depois veio a descobrir que o produto estava vetado. E usou seu ofício para descobrir o porquê do interdito.
"Trouxe um cara da Anvisa para me dar entrevista [no programa de TV]. Queria saber por que está proibido. É porque tem nicotina? Chicletes [com nicotina] e 'patches' [adesivos] estão por todo lugar."
Para ele, é só questão de tempo para que a proibição caia, e brasileiros se acostumem ao "e-fumo" em lugares públicos. "Até em avião eu fumo!" Questionadas, as companhias aéreas Gol e TAM não responderam se já flagraram passageiros e que procedimento adotam nesse caso.
UMA NOITE NA CIDADE
A pedido da sãopaulo, a redatora publicitária Carla Regina Cortegoso, 27, levou seu cigarro virtual para uma noitada composta por: abertura de mostra de arte, jantar em shopping, um bar, um café, um restaurante e uma balada.
Após dar cabo de um fast-food na praça de alimentação de um shopping na Bela Vista, região central, ela tirou a geringonça da bolsa e a levou à boca.
Em três minutos, uma segurança se chegou à mesa. "Senhora, aqui não se pode fumar." Carla explicou, batendo a maquininha na mesa de pedra, que não era um cigarro de verdade. A funcionária partiu.
Um pai de família na mesa atrás dela, para onde ia o vapor, começou a chamar mais seguranças. Imitava um cigarro com uma mão e pedia atenção estalando os dedos da outra. Em vão. Depois de minutos pedindo atenção, pegou o celular e começou a filmar a cena, que chamou de "inacreditável".
"Eu ia mandar para a Polícia Federal se vocês não avisassem que era reportagem", disse ele.
Na abertura de uma exposição fotográfica, no Itaim Bibi, zona oeste, um casal comentava: "Aquela menina está fumando?". Sim, ela estava. Garçons pareceram notar a cena. A fumante ouviu cinco vezes frases como "a senhora quer vinho?", como se dissessem que repararam o uso do cigarro. Nenhuma interpelação direta, contudo, foi feita.
"Parece ser uma relação meio de mãe de drogado, que vê o que está acontecendo mas prefere não lidar com o problema", compara a publicitária.
Os frequentadores da mesa ao lado do café, perto da Paulista, pediram a conta assim que as baforadas começaram. O garçom do bar na Vila Madalena, zona oeste, ficou em dúvida se ela poderia, consultou o gerente e voltou oferecendo uma mesa na calçada. No restaurante, atraiu olhares espantados da freguesia. Já na balada da rua Augusta, passou completamente batido.
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PERGUNTAS E RESPOSTAS
1. Onde comprar?
É proibida a venda no Brasil desde 2009. Porém, diferentes modelos são oferecidos em sites e em lojas da rua 25 de Março
2. É proibido fumar?
Não. O produto contém nicotina, extrato da planta tabaco, cujo consumo é permitido
3. Posso fumar em restaurantes?
Não. A lei paulista, de 2009, veta o consumo de "produto fumígeno" em ambientes de uso coletivo
4. Posso trazer do exterior?
Não. E quem tentar, pode ser acusado de contrabando. Entretanto, até hoje não há registro de apreensões no aeroporto de Guarulhos
5. Faz mal?
Sim. Esses cigarros têm nicotina, droga que causa dependência, além de substâncias cancerígenas
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Fontes: Anvisa, Receita, PF, Secretaria da Saúde e Humberto Fabretti, prof. de direito do Mackenzie
Folha de São Paulo