quinta-feira, 16 de maio de 2019

Será mesmo possível construir uma civilização sustentável?

SITE INOVAÇÃO TECNOLÓGICA. Será mesmo possível construir uma civilização sustentável?. 22/06/2018. Online. Disponível em www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=apocalipse-alienigena-civilizacao-superar-limites-seu-proprio-planeta. Capturado em 10/02/2019. 


Apocalipse alienígena: Uma civilização pode superar os limites do seu próprio planeta?
Da Ilha de Páscoa para o Universo: modelos encaram possibilidade de vida sustentável no cosmos. [Imagem: Michael Osadciw/University of Rochester]
Perspectiva astrobiológica
Diante das mudanças climáticas, do desmatamento e da perda da biodiversidade, criar uma versão sustentável da nossa civilização é uma das tarefas mais urgentes da humanidade.
Mas, quando decidimos encarar esse desafio imenso, raramente nos fazemos aquela que pode ser a questão mais crucial de todas: Como saber se a sustentabilidade é mesmo possível?
Os astrônomos já fizeram um inventário considerável de planetas fora do Sistema Solar e tem havido muita discussão em torno dos exoplanetas habitáveis e das possíveis civilizações extraterrestres.
A pergunta a seguir é: Existem planetas com civilizações sustentáveis? Ou todas as civilizações que surgiram no cosmos duraram apenas alguns poucos milênios antes de sucumbir nas próprias mudanças climáticas que desencadearam?
Estas foram as perguntas levantadas por uma equipe formada por Adam Frank e Jonathan Nellenback (Universidade de Rochester - EUA), Marina Alberti (Universidade de Washington - EUA) e Axel Kleidon (Instituto Max Planck de Biogeoquímica - Alemanha).
E eles se propuseram a dar os primeiros passos para respondê-las adotando o que chamam de uma "perspectiva astrobiológica".
Apocalipse alienígena: Uma civilização pode superar os limites do seu próprio planeta?
A chave parece estar em encontrar um equilíbrio entre ambiente e população - qualquer que seja seu número, contudo, essa população deverá fazer uso racional dos recursos. [Imagem: Adam Frank et al. - 10.1089/ast.2017.1671]
Contexto cósmico
A equipe justifica sua abordagem argumentando que as discussões sobre as mudanças climáticas raramente ocorrem nesse contexto mais amplo, que leva em conta a probabilidade de que esta pode não ser a primeira vez na história cósmica que um planeta e sua biosfera evoluíram para algo parecido com o que criamos na Terra.
"O ponto é reconhecer que a mudança climática pode ser algo genérico," explica Frank. "As leis da física exigem que qualquer população jovem, construindo uma civilização intensiva em energia como a nossa, vai receber feedback do seu planeta. Ver a mudança climática nesse contexto cósmico pode nos dar uma melhor visão do que está acontecendo conosco agora e como lidar com isso."
À medida que a população de uma civilização cresce, ela usa mais e mais recursos. Ao consumir os recursos, a civilização muda as condições do planeta. Em suma, civilizações e planetas não evoluem separadamente um do outro, eles evoluem interdependentemente. E o destino da civilização depende de como os recursos do planeta são usados.
Pensando em civilizações e planetas - incluindo exoplanetas e civilizações alienígenas - como um todo, os pesquisadores acreditam ser possível prever melhor o que pode ser necessário para o projeto humano de fazer com que sua civilização sobreviva. "Se não somos a primeira civilização do universo, isso significa que provavelmente haverá regras sobre como o destino de uma civilização jovem como a nossa progride," disse Frank.
Para ilustrar como os sistemas planeta-civilização coevoluem, Frank e seus colegas desenvolveram um modelo matemático para mostrar caminhos pelos quais uma população tecnologicamente avançada e seu planeta poderiam se desenvolver juntos.
Usando seu modelo matemático, a equipe chegou a quatro cenários que podem ocorrer em um sistema planeta-civilização:
Apocalipse alienígena: Uma civilização pode superar os limites do seu próprio planeta?
Gráficos do quatro cenários construídos pela equipe (veja o texto). [Imagem: Michael Osadciw/University of Rochester]
Sucumbir
A população e o estado do planeta (indicado por algo como sua temperatura média) aumentam muito rapidamente. Eventualmente a população atinge seu pico e declina rapidamente à medida que a temperatura planetária crescente torna as condições de sobrevivência mais difíceis. Finalmente alcança-se um nível populacional estável, que é apenas uma fração da população no seu pico. "Imagine se 7 em cada 10 pessoas que você conhece morressem rapidamente," detalha Frank. "Não está claro se uma civilização tecnológica complexa poderia sobreviver a esse tipo de mudança."
Sustentabilidade
A população e a temperatura aumentam, mas acabam chegando a valores estáveis sem nenhum efeito catastrófico. Este cenário ocorre nos modelos em que a população reconhece que está tendo um efeito negativo no planeta e migra de recursos de alto impacto - o petróleo é um bom exemplo - para recursos de baixo impacto - como a energia solar.
Colapso sem mudança de recursos
A população e a temperatura aumentam rapidamente, até que a população atinge um pico e cai de forma drástica. Nesses modelos, a civilização entra em colapso, embora não esteja claro se a espécie é completamente extinta.
Colapso com mudança de recursos
A população e a temperatura aumentam, mas a população reconhece que está causando um problema e muda de recursos de alto impacto para recursos de baixo impacto. As coisas parecem se estabilizar por um tempo, mas a resposta acaba chegando tarde demais, e a população entra em colapso de qualquer maneira.
Apocalipse alienígena: Uma civilização pode superar os limites do seu próprio planeta?
Para encontrar civilizações alienígenas, os aglomerados estelares parecem ser um bom ponto de partida. [Imagem: ESO/J. Emerson/VISTA]
Exemplo da Ilha de Páscoa
Os pesquisadores construíram seus modelos baseando-se, em parte, em estudos de casos de civilizações extintas, como os habitantes da Ilha de Páscoa. Os dados disponíveis indicam que o ser humano começou a colonizar a ilha entre 400 e 700 da nossa era, e atingiram uma população de pico de 10.000 habitantes em algum momento entre 1.200 e 1.500. No século XVIII, no entanto, os habitantes haviam esgotado seus recursos e a população caiu drasticamente para cerca de 2.000 pessoas.
A extinção da civilização da Ilha de Páscoa está relacionada a um conceito chamado capacidade de carga, ou o número máximo de espécies que um ambiente pode suportar. "Se você passar por uma mudança climática realmente forte, sua capacidade de carga pode diminuir, porque, por exemplo, a agricultura em grande escala pode ser fortemente prejudicada. Nós não poderíamos cultivar alimentos e nossa população diminuiria," detalha Frank.
Será que o mesmo irá acontecer conosco em escala planetária? A resposta a essa questão dependerá dos caminhos escolhidos - tudo o que os modelos construídos pela equipe fazem é mostrar possibilidades. "Esses modelos mostram que não podemos simplesmente pensar em uma população evoluindo por conta própria. Temos que pensar em nossos planetas e civilizações coevoluindo," conclui Frank.
A equipe pretende agora desenvolver modelos mais detalhados dos modos pelas quais os planetas podem se comportar quando uma civilização consome energia de qualquer forma para crescer.

Bibliografia:

The Anthropocene Generalized: Evolution of Exo-Civilizations and Their Planetary Feedback
Adam Frank, Jonathan Carroll-Nellenback, Marina Alberti, Axel Kleidon
Astrobiology
Vol.: 18 (5): 503
DOI: 10.1089/ast.2017.1671

sábado, 4 de maio de 2019

A engenharia precisa estar onde o povo está

A engenharia precisa estar onde o povo está

Fonte: http://www.seesp.org.br/site/index.php/comunicacao/noticias/item/18220-a-engenharia-precisa-estar-aonde-o-povo-esta

Rosângela Ribeiro Gil


Ele tem 62 anos de idade e há 34 é engenheiro na Prefeitura do Município de São Paulo, e está prestes a se aposentar. Frederico Jun Okabayashi formou-se em Engenheira Civil pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em 1979. Antes do serviço público, trabalhou, logo que se formou, na iniciativa privada. “Fui para Recife trabalhar na construção de Suape (complexo portuário e industrial de Pernambuco) empregado numa multinacional japonesa.” Esse contato, avalia, lhe trouxe uma experiência forte na área, porque “a engenharia japonesa já era muito avançada na questão da organização, disciplina e resiliência”.

Frederico, todavia, se “encontrou” no fazer a profissão no setor público. “Consegui unir a técnica ao meu dever humano de oferecer o meu trabalho de forma correta e responsável para a sociedade”, observa com muita retidão e certeza. Para ele, esse conhecimento técnico precisa estar “onde o povo está”. “Nas ´cidades invisíveis´, aquela onde os moradores da periferia sofrem e não aparecem como deveriam”, indica.

É esse, inclusive, o legado que ele quer deixar às novas gerações de profissionais que venham a ocupar o cargo de engenheiros nas administrações públicas, em todos os níveis de governo (federal, estadual e municipal). “O povo precisa da engenharia humanizada”, enfatiza.

Diplomado na área, qual foi o seu primeiro emprego?
Quando me formei o País também estava em crise econômica. Consegui uma oportunidade de trabalhar na área somente numa multinacional japonesa lá no porto de Suape, no Recife (PE), que estava ainda na fase de projeto e licitação. Trabalhei com dragagem de portos. Fiquei um ano e meio por lá. Tive facilidade para a vaga por conta do idioma japonês. Aprendi muito com eles (os japoneses).


400 Editada Fred 2
Depois de Suape, como você ficou?
Fiquei desempregado e voltei para São Paulo, trabalhei como autônomo na área. Depois prestei o concurso público para engenheiro da Prefeitura do Município de São Paulo. Fui aprovado em 1984 e tomei posse em julho de 1985.


Como foi ser engenheiro no poder público da grande metrópole brasileira?
Comecei com manutenção de prédios escolares. À época, eram 675 escolas, hoje tem mais de 3 mil. Fazia vistorias. Éramos dez engenheiros, e acabamos nos especializando em manutenção predial.


Como você se reinventou durante esses 34 anos de prefeitura?
Foram em dois momentos especificamente. O primeiro foi com a necessidade de fazer um curso de Direito na FDSBC (Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo), em 1994, para me defender porque acabei sendo perseguido após enfrentar a corrupção no cumprimento do meu dever de ofício. E, depois, quando me tornei delegado sindical do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP), em 2013, para lutar pela valorização da nossa carreira.


Quais projetos inovadores desenvolvidos na sua atividade junto à Prefeitura de São Paulo?
Tivemos diversos momentos nessa questão. Na Secretaria de Educação, por exemplo, elaboramos um manual de manutenção de prédios escolares. Na Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, conseguimos implementar a operação defesa das águas; na da Habitação, o antigo Contru (Departamento de Controle do Uso de Imóveis), foi o RIA online, que é o Relatório de Inspeção Anual de Elevadores. Os engenheiros da casa desenvolveram com a Prodam (Empresa de Tecnologia da Informação e Comunicação do Município de São Paulo) um sistema de cadastramento e controle de segurança de elevadores pela internet. Os responsáveis técnicos das empresas cadastravam os elevadores e conseguimos acabar com as empresas clandestinas de manutenção desse equipamento. Eram quase 80 mil elevadores na cidade. O número de acidentes reduziu muito.


Outra atuação importante foi no Serviço Funerário do Município de São Paulo com a humanização do trabalho devido à aquisição de quatro miniescavadeiras. Isso melhorou a produtividade e as condições de trabalho dos funcionários do setor. Manter a saúde e segurança dos trabalhadores foi fundamental. Também modernizamos e pintamos as salas de velório com diversas cores como o Araçá, e isso agradou muito as famílias dos homenageados, antes era tudo “apagado”.

Por que a engenharia pública é importante para o desenvolvimento das cidades?
Na Secretaria do Verde e do Meio Ambiente conseguimos trazer aos poucos a discussão da construção sustentável, desde 2012, que visa o baixo custo de manutenção, como a eficiência energética e o uso racional da água. Tudo isso é muito trabalhado e adotado nos órgãos públicos, mas existe um tempo diferente com relação à iniciativa privada por conta da lei das licitações. Tivemos inovações que partiram do setor público, como a iluminação LED que começou a ter uma aceitação maior por conta da iniciativa do poder público nas vias da cidade. Isso trouxe também uma economia considerável no consumo de energia elétrica e fez com que a população acreditasse mais nessa tecnologia.


Tudo está atrelado à questão do custo e benefício. Mas a engenharia é muito importante porque o mundo está globalizado, e a tendência é termos cidades sustentáveis e inteligentes. A engenharia pública está sempre presente nas ações da administração pública.

A engenharia no setor público é devidamente valorizada?
Não. Isso se deve a diversos fatores: as chefias muitas vezes não são do ramo, não são profissionais concursados, então, todo acervo técnico é limitado a uma determinada gestão. Não existe memória do trabalho realizado durante os quatro anos de um mandato. Não se avança como deveria por conta dessa interrupção. Mas temos uma Secretaria Municipal de Inovação e Tecnologia que traz um processo voltado à informática e às mídias sociais que podem tornar os avanços irreversíveis. Precisamos ter a consolidação desse trabalho.


Nesse sentido, vemos o quanto é importante a proposta de criação da carreira de Estado para a engenharia. Projeto que tramita há anos no Congresso Nacional.
Sim. Manteríamos, assim, os técnicos à frente dessas ações, com autonomia para decidir o chamado Ato Discricionário Técnico, e não ficar um projeto ou obra nas mãos de alguém fora da área. Teríamos a independência para atuar em diversos órgãos públicos, em todos os níveis de governo (federal, estadual e municipal). Hoje, quem discute sobre isso quando ocorre um acidente são os Promotores de Justiça, mas quem deveria decidir é o profissional da Engenharia. Tudo em prol da sociedade e da engenharia nacional também.

Qual o legado que você quer deixar às gerações futuras?
Que os engenheiros entendam que a nossa profissão é muito importante para os moradores da periferia. É para eles que trabalhamos, para quem mora em área de risco, de enchentes, de desmoronamento, onde não tem infraestrutura. São eles que mais precisam da nossa engenharia. Deixo essa mensagem: que eles continuem trabalhando para proporcionar melhor qualidade de vida para esses moradores carentes.


A engenharia precisa ser o viés socioambiental: voltado ao meio ambiente e às pessoas que não têm moradia, emprego, saúde, educação e habitação. Que estão marginalizadas. É importante trabalhar com essa perspectiva de que a cidade, o Estado e o País cresçam para melhorar a qualidade de vida de toda a população. A engenharia é pragmática acima de tudo.

Foto: Beatriz Arruda/SEESP
600 Itaim Paulista OportunidadesRegião do Itaim Paulista sofre com falta de infraestrutura e é atingida por enchentes regulares.

O que é a cidade invisível?
É aquela em que os moradores da periferia sofrem e não aparecem como deveriam para o poder público. Isso não é contabilizado em nenhuma estatística formalmente, só querem mostrar as pontes, os viadutos, a Avenida Paulista e outras edificações. A parte que ninguém quer ver é que chamo de cidade invisível. Uma população que só tem “valor” em época de eleição.


Você pode nos contar a história de um prefeito lhe chamar de “barão vermelho”?
Foi quando fazia a interdição de escolas por riscos iminentes de ruptura, principalmente escolas infantis e também muros de arrimo. À época, o prefeito era Jânio Quadros (1986-1989). Ele chegou a montar uma junta técnica para avaliar as minhas decisões. A junta confirmou que elas estavam corretas. Meu chefe perguntou qual o critério que utilizava para esses encaminhamentos de interdição. Respondi que usava dois: o técnico, claro, porque eu tinha trabalhado com cálculo de estruturas, identificava a gravidade do problema na estrutura; e o outro é o humanístico, eu sempre pensava se tinha coragem de deixar minhas filhas estudando naquela escola. Eu não pensava duas vezes: preenchia o termo de interdição e pedia para a diretora esvaziar a escola. Hoje não temos mais essa autonomia.


Uma vez, interditei um muro de arrimo junto à quadra de esportes de uma escola municipal, numa sexta-feira; na segunda-feira fiquei sabendo que o muro ruiu devido a chuvas no domingo. O engenheiro público tem a responsabilidade de tomar uma atitude efetiva, é o ato discricionário técnico, o que não temos mais. Hoje temos de fazer o encaminhamento via chefia, por meio de memorando e ofício para os órgãos competentes para providências.

Nunca tive dúvida qual decisão tomar entre colocar em risco a população e ser questionado depois; prefiro a segunda opção. Durante a minha carreira sempre agi dessa forma, e tudo dentro da boa técnica, legalidade e interesse público.