Pisos de madeira podem ser substituídos pelos de bambu. Este é da Neobambu
Bonito, durável e vindo de fonte renovável, o
bambu está em momento de glória no
design, na
decoração e na
arquitetura. Muitas vezes, a fama é atribuída ao caráter sustentável, mas de acordo com o arquiteto croata
Marko Brajovic, é preciso tomar cuidado ao tocar nesse assunto. “A sustentabilidade não pode se referir só ao material, mas deve ser entendida como um sistema integral. É preciso considerar o processo inteiro, como a plantação, o cultivo, o processamento e a produção industrial de larga escala”, explica o profissional, que é um dos fundadores do Bamboo Lab, um grupo de arquitetos e designers que cria desde móveis a pontes, usando bambu.
Segundo Brajovik, também é importante compreender que o material tem uma identidade própria. “O bambu não é madeira e acho que é um erro usá-lo como se fosse”, diz o especialista. Confira a entrevista:
Casa e Jardim – Como começou a trabalhar com essa matéria-prima?
Marko Brajovic – Em 2001, fui convidado, junto com o meu escritório – na época chamado Su-Studio – a fazer o projeto de uma casa, na
Costa Rica. Seguimos em uma viagem de estudo pelo
Japão e pelo
Brasil, até que, em
Maceió, no ano de 2004, construímos uma ponte para uma comunidade carente. Finalmente, em 2005, em
Palma de Maiorca, na Espanha, criamos o primeiro workshop internacional de design e construção experimental em bambu na Europa. Assim, criamos o Bamboo Lab, que constrói desde mobiliários a pontes de emergência, graças a arquitetos e engenheiros provenientes de doze diferentes países. Em 2006, publicamos o livro
Bamboo Lab, que inclui todas as experiências e projetos dos últimos anos, pela editora Actar, de Barcelona.
CJ – E por que esse material? MB – Comecei a usar o bambu porque fui seduzido pela elegância, pela inteligência e pela alta tecnologia que esse material tem, por natureza.
Molduras de bambu em volta dos quadros enfeitam a parede atrás da cabeceira da cama. Projeto do arquiteto Marco Antonio Medeiros
CJ – O bambu é um bem renovável e abundante. Acredita que a tendência é continuar apostando no uso desse material?
MB – O bambu virou “moda” nos últimos anos e isso pode até prejudicar uma pesquisa séria sobre o material e suas possibilidades reais de uso no design, na arquitetura e na decoração. Ele tem suas próprias limitações, sobretudo com raios UV ou contato direto com água. Por isso, é preciso aprender bastante sobre o material antes de usá-lo. Caso contrário, graves erros podem ser cometidos. O bambu é usado pela humanidade na construção há cerca de 5 mil anos. Esse
know-how está documentado. Além disso, temos novos conhecimentos graças a institutos e universidades competentes.
CJ – Na sua opinião, qual é o futuro do bambu nesse meio? MB – Pessoalmente, acho que o futuro está nos formatos industrialmente processados, em usar a matéria-prima do bambu para criar laminados e materiais compostos e híbridos, onde as fibras se misturam com polímeros e outros materiais sintéticos. As pesquisas mais avançadas caminham nesse sentido. No entanto, precisamos ter aplicações concretas para incentivar o interesse das indústrias sustentáveis.
O banco Peque, de Marco Brajovic
CJ – O mundo presta mais atenção na preservação e na sustentabilidade hoje em dia?
MB – Não gosto muito da palavra “sustentável”, porque ela é frequentemente mal utilizada para a publicidade de produtos. Acho que a sustentabilidade não pode referir-se somente ao material usado, mas precisa ser entendida como um sistema integral. No caso do meu último produto realizado em bambu, o banco
Peque, todo o processo de produção foi otimizado, em termos de material e de recursos humanos. O uso do bambu, que é uma planta com altíssimo índice de crescimento da própria biomassa, poderia criar uma indústria nacional. Isso daria trabalho a muitas comunidades e cooperativas no país, promovendo um desenvolvimento econômico e social inteligente. Assim, considerando o processo integral, como a plantação, o cultivo, o processamento e a produção industrial de larga escala, o bambu poderia ser, seguramente, o material mais “sustentável” do mercado nacional e mundial.
CJ – Existe algum produto de bambu que, em algum momento, pareceu ser impossível de ser realizado? Qual? MB – Sim. Ultimamente vejo várias propostas de projetos de arquitetura em bambu que acho pouco viáveis porque não contemplam as limitações e as características melhores do material. O bambu não é madeira e acho um erro usá-lo como se fosse. É um erro por causa das características do material e da linguagem estética. O bambu precisa ser entendido, conhecido e reconhecido como material único, com identidade específica.
CJ – Quais projetos utilizando o material foram mais desafiadores? MB – O banco
Peque, em bambu laminado, foi um deles. A peça é uma inovação do uso estrutural do bambu e foi produzida graças a uma pesquisa de dois anos junto à jovem fábrica paulistana TIVA Design, dos arquitetos Rafael Paolini, Bruno Bezerra e Alexandre Xandó. O banco é feito por meio de um processo de laminação do painel de bambu-mossô (
Phyllostachys pubescens). Assim, chega-se às lâminas de 1,5 mm de espessura com excelentes características mecânicas e estéticas. Essas lâminas aplicadas no molde são coladas entre si com resina natural. Com isso, chegamos a um banco de 7 mm de espessura e 1,8 kg. Isso porque o bambu é um material de alta tecnologia por natureza.
Parafusados diretamente na parede, os números de bambu foram criados pelo ateliê Kanela Bambu. Uma camada de verniz garante a durabilidade na área externa