Cientista político e professor da UFRJ, Jairo Nicolau recomenda cautela nas críticas aos programas sociais no debate da eleição de 2014
O cientista político Jairo Nicolau acredita que a próxima eleição presidencial será bem diferente daquela que elegeu a presidenta Dilma Rousseff em 2010. Há muitas incógnitas desta vez: desde a candidatura de Eduardo Campos (PSB), um político ainda muito pouco conhecido nacionalmente, até a indefinição sobre o financiamento privado das campanhas - que ele condena, embora seja contrário à proibição de forma abrupta, em pleno ano eleitoral. "Temo por uma onda de caixa 2. A mudança deve ser gradual. E deve ser discutida pelo Congresso, não pelo Supremo".
Nicolau diz que a macroeconomia não deverá ser um tema dominante na campanha de outubro ("como não foi nas anteriores") e recomenda cautela nas críticas aos programas sociais do governo. "Candidatos da oposição que tentarem entrar numa discussão sobre o Bolsa Família estarão mortos", sentencia.
A eleição de 2014 será uma repetição de 2010?
A eleição da presidenta Dilma Rousseff praticamente repetiu o resultado de Lula, em 2006, tanto no primeiro quanto no segundo turno. Ou seja, concentração dos votos do PT nos municípios mais pobres do Nordeste e do Norte e dos votos do PSDB nos municípios mais ricos. Mas 2014 não deverá ser assim. Há uma série de diferenças, variáveis que não são decisivas, mas que são importantes. A saber: a definição do lugar de Marina Silva na chapa de Eduardo Campos (PSB); a candidatura ou não do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa; o vice da chapa de Aécio Neves (PSDB); a decisão do STF sobre a proibição do financiamento de campanhas por pessoas jurídicas; e a chegada do candidato do Psol, Randolfe Rodrigues, que poderá ter um desempenho em torno de 5 pontos percentuais.
Por que Randolfe é importante?
Há uma insatisfação por parte da esquerda brasileira com o governo Dilma Rousseff. Isso ficou explícito na greve de vários segmentos, em 2013. O Randolfe pode aglutinar um pouco da insatisfação que o atual governo gerou. Ele foi do PT e é crítico de algumas posições adotadas no ano passado, como as concessões. Numa eleição muito disputada, ele pode fazer certo estrago e viabilizar o segundo turno.
Quais seriam as consequências da proibição do financiamento privado de campanhas?
Independentemente do efeito jurídico, é preciso dizer que as campanhas no Brasil são caríssimas, particularmente para presidente, que custam mais de R$ 100 milhões. Uma campanha para governador está na faixa de R$ 15 a 20 milhões, dependendo do estado. Na última eleição, praticamente todos os deputados federais eleitos gastaram R$ 1 milhão cada. Nas próximas eleições, isso deve chegar a R$ 2 milhões. As consequências, caso a medida seja aprovada, é que as campanhas ficarão bem mais baratas e artesanais, e os marqueteiros terão que renegociar preços. Infelizmente, temo por uma onda de uso do caixa 2. Os candidatos se acostumaram a um certo padrão e não saberiam como se deslocar sem um jatinho, sem pesquisa qualitativa de área, sem um marketing padronizado para o país inteiro. É muito difícil cortar tudo isso da noite para o dia.
É claro que nós sabemos da criatividade nesse campo, você não precisaria necessariamente utilizar um caixa 2 como se via nos anos 80, com dinheiro sendo deslocado em sacos e malas. Mas você pode usar artifícios, como o de uma empresa imprimir panfletos de candidatos e dizer que imprimiu para uso próprio, ou pagar pesquisas e colocar gasolina no carro da campanha. Não estou discutindo o mérito da decisão do STF, que é equivocada para este contexto, com efeitos imediatos e avassaladores. A campanha de 2010 teve um valor total de R$ 5 bilhões, a de outubro deve custar R$ 7 bilhões. 80% disso vêm de empresas privadas. Significa tirar uns R$ 5 bilhões do mercado de campanha.
E a capacidade do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para fiscalizar isso?
Não existe. O TSE não tem auditores suficientes, não tem capacidade técnica. A gente observa que as contas das campanhas demoram muito para serem aprovadas. Sabemos que o TSE tem muita dificuldade para fiscalizar a engenharia contábil dos milhares de candidatos.
Qual seria o melhor modelo?
Precisamos reformar o modelo de financiamento da política de um modo geral. Significa reformular o fundo partidário e mais o sistema de financiamento de campanha, que atualmente é privado, embora os candidatos tenham um tempo de TV - um grande benefício - invejado por candidatos do mundo inteiro. Nos Estados Unidos, as campanhas são caríssimas e os candidatos têm que comprar as inserções. O Brasil tem o sistema mais generoso de concessão de tempo de TV e rádio para os candidatos. Precisaríamos de uma nova legislação, com punições mais severas para quem a desrespeitasse, um sistema de fiscalização mais engenhoso - talvez por amostragem e não com essa obsessão de fiscalizar todos os candidatos. Temos que caminhar para o fim da doação de empresas privadas. Nos EUA, já se proibiu que as empresas dessem recursos diretamente para os candidatos desde 1907. Eu tenho muito simpatia pela lei francesa, aprovada no final dos anos 90, que tinha um sistema parecido com o nosso e migrou para a proibição, que é a posição da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a que o STF quer fazer da noite para o dia. A premissa é muito boa, mas num sistema onde há essa forte dependência, é preciso pensar numa transição. E isso deve ser discutido pelo Congresso, não pelo Supremo.
Após governar o país por oito anos, o PSDB perdeu espaço?
O PSDB está há 11 anos na oposição parlamentar e o que evitou o esvaziamento mais severo do partido foi o fato de ele governar Minas Gerais e São Paulo com governos mais ou menos bem-sucedidos. Além disso, ele tem uma bancada grande na Câmara e no Senado. É um desenho de polarização que se repete há cinco eleições: duas de FHC, duas de Lula e a última, da Dilma. Novamente, o PSDB vai ser um ator decisivo com chances de polarizar com a presidenta Dilma.
Eduardo Campos é um risco para o PT no Nordeste?
Se Eduardo Campos conseguir entrar com força no Ceará e na Bahia, ele pode, sim, afetar a eleição de Dilma. Mas ele é uma grande incógnita. Fora da política, é pouco conhecido da população. Eu, que acompanho política, conheço muito pouco das opiniões dele. Há outra incógnita: São Paulo, que é território do PSDB, é um estado que, pela primeira vez, vai votar num candidato tucano para presidente que não é de lá. Se São Paulo acolher bem o Aécio, ele terá força para enfrentar Dilma.
Aécio quebrou uma linha sucessória paulistana no PSDB...
As bases eleitorais mais fortes, tanto do PT quanto do PSDB, estão em São Paulo. O mesmo desafio encontrava o PT, mas várias lideranças naturais foram queimadas por conta dos escândalos - nomes como Antonio Palocci e José Dirceu eram a aposta de todos os analistas no primeiro governo Lula. Já o PSDB de São Paulo não tem uma liderança jovem, emergente. Os nomes ventilados seriam, novamente, o dos veteranos Geraldo Alckmin e José Serra. No caso do Alckmin, ele tem muito mais chances de se reeleger como governador de São Paulo do que numa disputa presidencial. Em 2010, o Aécio abriu mão da candidatura, agora, vem se tornando uma liderança natural.
Ainda existe esquerda e direita no Brasil?
As pesquisas de opinião mostram que, de um modo geral, o eleitor brasileiro não é ideológico, embora haja um segmento pequeno que se orienta ideologicamente. Por isso, chutei em 5% essa insatisfação ideológica com o governo Dilma migrando para o candidato do Psol. Nas últimas eleições, Lula e Dilma não foram para o segundo turno por conta de uma média de 4% dos votos. Com um candidato desses, repito, é possível viabilizar um segundo turno.
Alguns analistas disseram que o PSDB gostaria de ver no cenário uma candidatura de esquerda, ou mesmo Marina Silva, para provocar o segundo turno.
Se tivesse que apostar hoje, eu diria que vai haver segundo turno. E não digo isso pelas pesquisas, porque, em nenhuma eleição tivemos candidatos tão pouco conhecidos. Em segundo lugar, como o presidente do Ibope, Carlos Augusto Montenegro, disse em entrevista ao Brasil Econômico, o calendário eleitoral está apertado por conta da Copa do Mundo aqui no Brasil. Com o desconhecimento dos nomes, as pesquisas servem agora para quase nada. Estou apostando no segundo turno pelo que aconteceu de 2002 para cá. As eleições presidenciais no Brasil têm tido resultados muito apertados. Dilma ganhou em 16 estados e perdeu em 11. Nunca um candidato à Presidência tinha perdido em tantos estados. E tudo isso logo depois de Lula sair da Presidência com altíssima aprovação. Agora, Dilma não terá a economia tão boa quanto em 2010, não terá Lula tão próximo dela como naquela campanha. Então, mesmo desconhecendo o potencial eleitoral de Eduardo Campos e Aécio Neves, eu aposto no segundo turno.
Faz sentido antecipar campanhas para compensar o calendário apertado?
Quem inaugurou isso foi o ex-presidente Lula, quando anunciou, no ano passado, a importância da reeleição da Dilma. Aquilo gerou na oposição a necessidade de correr um pouco. Percebo uma ansiedade em militantes do PSDB para uma definição mais forte do Aécio, porque ele não está muito convincente, não se porta muito como candidato. Mas, no atual cenário, não é tão grave. O momento, agora, é para viajar, tentar conquistar novos eleitores, conversar com o meio empresarial, criar redes com a imprensa, fazer costuras com os governos estaduais e alianças políticas.
A Dilma tem um favoritismo amplo nas pesquisas...
Mas acho que é um favoritismo artificial, como era artificial aquele favoritismo da Marina em 2010. Parte do voto em Marina deveu-se a uma mudança de última hora, um voto útil para viabilizar o segundo turno. Algo que aconteceu em menor escala, na eleição de 2006, com o Cristovam Buarque (PDT).
As manifestações de rua e o mensalão terão impacto na eleição?
O estrago maior do mensalão foi em 2006. Ali, o PT perdeu parte da classe média simpatizante do partido e isso se traduziu numa mudança do perfil da bancada. Naquele ano, lideranças de opinião do partido e vários outros tiveram votações menores. A bancada encolheu, perdeu muitos votos de legenda. Em relação às manifestações, quanto mais ficamos distantes delas, mais elas parecem que tiveram um efeito circunscrito no tempo. Naquele momento, a dúvida era se elas afetavam estruturalmente a política brasileira - um movimento de voto nulo, a criação de um partido que capitalizasse isso, algum nome que aparecesse etc. Só que esses fatores mais estruturais, apesar da rejeição aos partidos e ao Legislativo, não aconteceram. Os protestos tiveram conquistas pontuais, como a aceleração de algumas leis que tramitavam no Congresso e o impedimento do aumento das passagens de ônibus. Eles foram superestimados, na época, mas vimos que não deu certo no 7 de Setembro e em outras tentativas. Acho que, dificilmente, teremos manifestações naquela escala, embora meus alunos, que militam no movimento estudantil, digam que haverá novo ciclo. Havia um contraste inevitável na Copa das Confederações. Tínhamos temas variados nas reivindicações de junho e, ao mesmo tempo, estavam sendo inaugurados estádios que eram templos de conforto. Daí, surgiu a deliciosa expressão "Padrão Fifa". E todo mundo começou a exigir hospital, educação e transporte com o "Padrão Fifa". Esse contraste foi acachapante. Mas o simbolismo morreu, porque a Copa foi jogada, todo mundo foi aos estádios reformados e a piada ficou repetitiva.
Acho difícil que as manifestações aconteçam novamente com aquele mesmo magnetismo. Apoio popular, massivo, haverá apenas se algum tema capturar a população. Já o efeito desses protestos sobre a imagem de alguns governantes, esse parece ser definitivo. Sérgio Cabral e Eduardo Paes são exemplo. A Dilma sofreu muito, mas não havia um alvo claro em relação ao governo federal. Estive em algumas dessas manifestações e não lembro de ter lido nenhum cartaz contra a presidenta, pessoalmente. Mesmo assim, as pesquisas mostravam que todos os governantes, seja do Legislativo, do Executivo, das esferas municipal, estadual e federal, todos tiveram queda de popularidade. E os alvos foram muito mais as instituições públicas do que os símbolos econômicos - era mais contra a elite política. Nos Estados Unidos, houve o Occupy Wall Street. Aqui, o anticapitalismo das manifestações era, no máximo, quebrar agências bancárias.
Acha que Dilma se saiu bem ao responder aos protestos?
Ela foi bem avaliada ao se pronunciar em cadeia nacional. A taxa de preferência dela pelos eleitores em relação à de aprovação enquanto presidenta, hoje, está inflada porque ela é a candidata mais conhecida. Por isso, eu digo: parem tudo e esqueçam um pouco as pesquisas. Sei que é difícil, porque ficamos curiosos, mas nada aconteceu na opinião pública, está tudo mais ou menos parado.
Como fica o quadro dos estados?
Em Minas, sem o Aécio, e no Rio, sem o Cabral, elas ficam mais abertas, ainda que no estado mineiro o quadro seja mais previsível, porque lá existe a polarização partidária. O Rio não tem PSDB nem PT fortes. O PT já teve bons candidatos a governador, mas só passou para o segundo turno em 2002, na eleição da Benedita da Silva contra a Rosinha Garotinho. O PSDB chegou a governar o Rio. Curiosamente, tanto Eduardo Paes quanto Sérgio Cabral são egressos do partido. Mas, no Rio, o PSDB sempre foi muito frágil. Em Pernambuco, onde Eduardo Campos sai do governo com aprovação espetacular, ainda assim seu partido terá trabalho para enfrentar a candidatura do senador Armando Monteiro (PTB). Na Bahia, onde o PT está no governo e não foi muito bem avaliado, a eleição também será disputada. São Paulo também tem agora um candidato forte do PT, o Alexandre Padilha (ministro da Saúde). Há tempos, o PT não era tão competitivo naquele estado - justo agora que o governador Alckmin enfrenta seu pior momento. Quanto ao Rio, nunca vi uma eleição tão aberta. Lembra muito o pleito de 1992 para prefeito, quando Cesar Maia (DEM) passou ao segundo turno com 12%. Eram dezenas de candidatos, cada um com 5%. A eleição do Rio é completamente imprevisível.
Caso o Eduardo Campos faça um discurso mais à esquerda, como fica a Dilma? Aécio fará um discurso claro de direita?
O último debate de direita e esquerda que fez algum sentido para a população foi o de 2006, no segundo turno, com o discurso sobre as privatizações, que fez um estrago na candidatura do Alckmin. Ele demorou a responder e aquilo foi um diferencial. Lembro que o Francisco de Oliveira, um dos economistas mais críticos ao governo Lula, disse: "Olha, já que polarizou esquerda e direita, com todas as críticas que eu faço ao governo Lula, eu o apoio". Mas não acho que o eixo do debate político do Brasil seja uma agenda de esquerda contra direita. Até porque essas coisas ficaram muito confusas, ainda mais depois das concessões do último ano no governo Dilma, além das alianças do Planalto com setores da centro-direita. Certamente, a oposição tem que apostar no discurso de que está chegando ao fim um ciclo petista, que diminuiu a desigualdade, mas que o Brasil tem outros desafios, e vamos olhar para a frente. É um discurso da modernização, em áreas que, consensualmente, ficaram em segundo plano tanto no ciclo do PSDB quanto no ciclo petista. O PAC não teve o impacto que se imaginava, o sistema de saneamento das cidades brasileiras é caótico. Ou seja, se avançou muito pouco nesse pacote que se convencionou chamar de infraestrutura. A oposição precisa de uma nova agenda.
Já o governo deve ir em defesa de um discurso retrospectivo. Se pudéssemos resumir a agenda da eleição presidencial, ela seria um aprofundamento de uma agenda social. A macroeconomia não tem sido um grande tema das últimas eleições, por conta de um certo consenso a respeito das grandes diretrizes. Mantido o atual quadro econômico, que é o que todos estão desenhando, não vai haver uma piora na economia. Acredito que o debate será sobre o aprofundamento da melhoria da renda, da capacidade de compra e da redução das desigualdades. Os candidatos da oposição que tentarem entrar numa discussão sobre o Bolsa Família estarão mortos.
Nas suas palestras para empresários e economistas, o que tem ouvido sobre a política brasileira?
No primeiro semestre do ano passado, havia muito mais otimismo e uma avaliação positiva do governo Dilma. Do segundo semestre para cá, alguns segmentos da elite empresarial querem apostar em alternativas a esse governo.
Isso coincide com as manifestações de rua?
Acho que não. Tem mais relação com a política econômica, alguma política errática e demorada na área de privatizações. Sinto que houve uma degradação da avaliação do governo, focada nas políticas macroeconômicas e na equipe econômica. Eles têm uma visão muito pessimista da elite política brasileira e do sistema político brasileiro. Por outro lado, sabem que as coisas funcionam, que talvez não seja o partido que eles querem, mas o sistema funciona. Eles querem saber se a oposição pode ganhar, quais suas chances, não querem saber da política em si, querem saber da corrida presidencial. Há uma insatisfação difusa, mas não a ponto de criar um partido liberal clássico, ou de direita. Dificilmente, você terá um candidato de oposição dizendo que a questão central do Brasil é o tamanho da carga tributária, que é ter menos Estado na economia, fazendo as reformas liberalizantes, diminuindo os benefícios do seguro-desemprego, aumentando a idade da aposentadoria. Nós não temos uma direita liberal. Dos dois candidatos da oposição, um, Eduardo Campos, é egresso da base governista, sempre foi mais identificado com a esquerda moderada. E o Aécio a gente tem mais ou menos alguma ideia, porque conhecemos os economistas do PSDB, com políticas econômicas de direita que, na Europa, seriam consideradas de centro. Mas não temos uma explicitação de posições à direita.
Como os partidos brasileiros estão lidando com o envelhecimento dos quadros? Para onde a militância está migrando?
Infelizmente, não temos, no Brasil, pesquisas sólidas sobre o perfil dos partidos. Mas, minha observação - que é uma impressão e não uma pesquisa - é que os jovens que estão entrando hoje no "mercado político" aos 20 anos de idade são muito diferentes por razões de toda ordem. São mais escolarizados que as gerações anteriores, mais informados e totalmente socializados digitalmente. Eles falam da política como se fosse um mundo totalmente alheio, remoto. E, para o bem ou para o mal, programas de TV como "Pânico" e "CQC", ao retratarem os políticos como verdadeiros imbecis, acabaram agravando esse sentimento e essa imagem da política tradicional. A política partidária e parlamentar não é um atrativo para essa juventude. Os jovens que conheço e querem fazer alguma coisa vão para atividades religiosas ou filantrópicas, porque os resultados são rápidos. Ser professor de um pré-vestibular comunitário, por exemplo, permite a eles ver um resultado imediato. Os partidos são uma invenção do século XIX, não podemos esquecer disso, e terão muitas dificuldades nos próximos anos. Eles conseguiram se atualizar para a era da TV e do rádio, mas ainda não conseguiram se modernizar para serem organizações da era digital.
O sr. vê a Rede Sustentabilidade como uma tentativa de adaptação a essa era?
Estamos no final de uma transição da TV para outra forma de comunicação entre Estado, sociedade e partidos. No passado, partido tinha que ter uma sede. Mas, agora, o partido vai ter que ter uma sede ou um site? Ou uma página no Facebook? A gente não sabe mais. O fato é que, para esses jovens, o partido é muito pouco atraente. O PSDB e o PT têm esse desafio. Dilma deverá ser a última presidente do Brasil que se socializou na agenda da ditadura. Depois dela, todos terão sido socializados na agenda da transição e, daqui a pouco, na agenda da democracia. Quando olhamos para o PSDB de São Paulo, que governou o estado por 20 anos, qual é o quadro expressivo na faixa de 40 anos que eles criaram para a política nacional? Nenhum. Isso é grave. O Lula percebeu isso numa entrevista: "Não dá para sair novamente com a Marta (Suplicy) para a prefeitura de São Paulo, nós precisamos renovar esse partido". E o PT do Rio, com o Lindbergh (Farias), pode ser bem sucedido nessa renovação também. É um enorme desafio e, por enquanto, não vejo nenhum partido à altura para responder a esse novo cenário.