Defensora de uma política consistente para garantir a formação de mais engenheiros no País, o que considera medida estratégica ao desenvolvimento, a FNE incluiu a proposta no projeto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”, ainda em 2006. A entidade vem também alertando para o equívoco de se importarem esses profissionais como saída a suposta escassez que já existiria hoje. Em correspondência à presidente Dilma Rousseff, em 12 de agosto último, o presidente da federação, Murilo Pinheiro, ressaltou: “É preciso aproveitar a mão de obra qualificada disponível no País.” A posição da entidade é corroborada por levantamento a partir de estudos sobre o tema e dados de empresas contratantes.
Dos 663.583 profissionais da categoria ativos no País, 1.029 registrados são diplomados no exterior, com a devida revalidação. A informação, relativa a 2013, é do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), segundo o qual houve um aumento de mão de obra importada nos últimos cinco anos. O dado acompanha o quadro geral em relação a autorizações concedidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego a trabalhadores temporários e permanentes. Entre janeiro e outubro de 2012, teria havido incremento de 5%. Até 30 de junho último, foram 29.486 estrangeiros que receberam o aval para atuar no Brasil, não apenas em setores tecnológicos, mas nas diversas áreas. O pano de fundo a explicar a vinda de profissionais seria a crise financeira global inaugurada em 2008 e as boas perspectivas com a expansão econômica nacional, que, contudo, agora se estabilizou.
Para José Roberto Bernasconi, presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco), “estamos ajudando a resolver os problemas especialmente em Portugal e Espanha”. Ele critica: “Tem havido a participação de engenheiros que captam serviços aqui e os levam para serem feitos fora. Não somos contra a vinda dessa mão de obra, não é xenofobia, fechar fronteiras, mas é preciso haver transferência de conhecimento e tecnologia.” Na sua opinião, seria melhor que empresas brasileiras contratassem via consórcios essa mão de obra ou recrutassem profissionais experientes, mas não é o que está acontecendo. Hoje, estrangeiros concorrem com recém-formados e não há nenhuma contrapartida ao País, lamenta.
Cenário estável
Além disso, ao contrário do que comumente é veiculado na mídia convencional, não há necessidade de trazer engenheiros do exterior para suprir a demanda no mercado de trabalho nacional. A avaliação é compartilhada por entidades patronais e pelo Confea. Segundo esse órgão, a análise fundamenta-se nos seguintes fatores: crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) menor do que o sinalizado há dois anos, o que teria estabilizado a demanda por essa mão de obra. Por outro lado, houve maior número de matriculados nas engenharias nas universidades e reintegração à área de profissionais que passaram a atuar, sobretudo nas “décadas perdidas” de 1980 e 1990, em segmentos como o financeiro.
Relativo a 2012, o estudo “Tendências e perspectivas da engenharia no Brasil”, publicado pelo Observatório da Inovação e Competitividade (OIC) do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), confirma: de 2001 a 2011, houve elevação da oferta de cursos de engenharia em todas as regiões do País, na média, de 12% ao ano. “As matrículas passaram de 180.497 no ano 2000 para 596.416 em 2011. Isso representa um crescimento de 230% no período, ou 10,5% ao ano, um aumento muito expressivo frente ao crescimento populacional (13% no período)”, indica. O documento aponta ainda tendência de queda na evasão em engenharia: de 21% em 2001 para 17% dez anos depois. Embora o mercado de trabalho continue demandante, segundo o estudo, a evolução na formação de profissionais da categoria teve comportamento similar, “com uma tendência de crescimento sustentado”. Censo do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) aponta que entre 2011 e 2012 houve aumento de 16,6% nas matrículas em engenharia no País.
Análise do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de fevereiro de 2011 também não teria vislumbrado escassez generalizada dessa mão de obra.
“Em 2010 se cogitou bastante a vinda de engenheiros de fora, havia um volume grande de empreendimentos e falta de pessoal qualificado. Na construção civil, pelo menos nesse instante, não se percebe isso”, corrobora Haruo Ishikawa, vice-presidente de relações capital-trabalho do Sindicato da Indústria da Construção Civil de São Paulo (Sinduscon-SP). Ele complementa: “Não existe restrição em termos de formação técnica a estrangeiros, os países desenvolvidos estão alinhados com nossas tecnologias. Mas o número de engenheiros formados nos últimos anos, a mão de obra que foi qualificada e a economia propiciaram estabilização.”
Sem impedimentos
Os estrangeiros, independentemente da nacionalidade, não encontram objeção por parte do Confea à entrega do registro, atesta o órgão. Basta seguir os critérios legais vigentes no País. Segundo Marcelo Cerri, gerente de projetos da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República, o trâmite abrange ser admitido por empresa brasileira, apresentar documentação no Consulado do Brasil no país de origem para legalização e enviá-la à contratante, a qual a apresentará com tradução juramentada à Coordenação-Geral de Imigração (CGIg) do Ministério do Trabalho e Emprego, que tem 30 dias para analisar o processo. “Em caso de aprovação, a CGIg concede a autorização de trabalho e informa o Ministério das Relações Exteriores. Por sua vez, o Itamaraty envia ao Consulado a autorização para emissão de visto de trabalho.” Conforme ele, caso a profissão a ser exercida seja engenharia, é preciso entrar com reconhecimento de diploma e, posteriormente, filiar-se ao Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea) do respectivo estado em que atuará.
A SAE está formulando uma proposta de mudança na legislação de imigração, como informa Cerri, para “agilizar, desburocratizar e simplificar o processo de emissão de vistos de trabalho, além de estender os direitos do imigrante no Brasil”. Atualmente, explica, “como 96% dos estrangeiros que vêm trabalhar o fazem por meio de visto temporário (dois anos), é praticamente inviável que venham para atuar como engenheiros, já que o prazo para reconhecimento de diploma muitas vezes supera um ano de espera”. (Por Soraya Misleh)
Fonte: Jornal Engenheiro da FNE, Edição 137