segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Participe: Quais são suas ideias para a vida em 2012?

As decisões do STJ que marcaram 2011: Meio ambiente


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) superou a marca de 309 mil decisões em 2011. Muitas delas atingem diretamente o dia a dia do cidadão, ao estabelecer a correta interpretação de leis relativas a temas como saúde, consumo e família. O STJ também se posicionou em relação a casos de grande repercussão nacional. Reveja, a seguir, algumas das principais decisões proferidas pelo Tribunal da Cidadania neste ano que está terminando.

Família



As ações que discutem direito de família geralmente são polêmicas e geram muito debate. No ano de 2011 não foi diferente. Um dos julgados (REsp 1.183.378) de maior repercussão foi da Quarta Turma do STJ, que, em decisão inédita, proveu recurso de duas mulheres que pediam para ser habilitadas ao casamento civil. 

Seguindo o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, a Turma concluiu que a dignidade da pessoa humana, consagrada pela Constituição, não é aumentada nem diminuída em razão do uso da sexualidade, e que a orientação sexual não pode servir de pretexto para excluir famílias da proteção jurídica representada pelo casamento. 

Outra questão definida pelo STJ foi o REsp 1.186.086, que concedeu ao avô a guarda consensual de uma criança. A Terceira Turma entendeu que se trata de uma autorização excepcional, já que a filha e o neto moravam e dependiam dele desde o nascimento da criança. 

O relator do caso, ministro Massami Uyeda, afirmou que a melhor compreensão da matéria recomendava conceder a guarda do neto para o avô materno. Ele frisou que não se trata apenas de conferir ao menor melhores condições econômicas, mas também regularizar um forte vínculo de afeto e carinho entre avô e neto, tudo isso com o consentimento da mãe. 

Outro caso importante foi o julgamento do REsp 912.926, em que se entendeu não ser possível a existência de duas uniões estáveis paralelas. Para os ministros da Quarta Turma, a lei exige como um dos requisitos fundamentais para o reconhecimento da união estável o dever de fidelidade, e ainda incentiva a conversão da união em casamento. O relator foi o ministro Luis Felipe Salomão.

Saúde



Um tema que também gera polêmica frequente nos tribunais é a saúde. Ao longo do ano, muitos julgamentos importantes sobre esse assunto aconteceram. No REsp 1.145.728, o STJ manteve a indenização por danos materiais e morais concedida a um casal de Minas Gerais e sua filha, que sofreu graves sequelas em decorrência da falta de prestação de socorro após o parto. Os ministros da Quarta Turma entenderam que os valores não eram exagerados e que a realização de nova análise dos fatos, para eventualmente se negar a indenização, esbarraria na Súmula 7/STJ, que impede o reexame de provas em recurso especial. 

Operadoras de planos de saúde não precisam ingressar com ação judicial para cancelar contratos de consumidores que estejam com mensalidades em atraso há mais de dois meses. Ao julgar o REsp 957.900, os ministros da Quarta Turma entenderam que basta a notificação da empresa aos inadimplentes, com antecedência, para ela poder rescindir o contrato. 

O relator do caso, ministro Antonio Carlos Ferreira, afirmou que, ao considerar imprescindível a propositura de ação para rescindir o contrato, o Tribunal de Justiça de São Paulo havia criado exigência não prevista em lei. Ele ressaltou que "a lei é clara ao permitir a rescisão unilateral do contrato por parte da operadora do plano de saúde, desde que fique comprovado o atraso superior a 60 dias e que seja feita a notificação do consumidor". 

No REsp 1.230.233, a Terceira Turma restabeleceu sentença que determinou à Unimed o pagamento de cirurgia bariátrica a um segurado de Varginha (MG). A Turma, seguindo voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, concluiu que no ato da assinatura do contrato, a seguradora sabia da obesidade mórbida do segurado, sendo evidente que os respectivos riscos certamente foram levados em consideração e aceitos ao admiti-lo como segurado, não se podendo falar em vício na manifestação da vontade. 

Para a relatora, quando o segurado procurou a Unimed, ele buscava um seguro que oferecesse cobertura para os riscos à sua saúde, principalmente aqueles derivados do seu sobrepeso. A seguradora, por sua vez, mesmo ciente do quadro de obesidade mórbida do segurado, concordou em firmar o contrato. Por essa razão, a prevalecer a boa-fé contratual, não há como admitir a recusa da Unimed em oferecer cobertura para um sinistro derivado especificamente da obesidade mórbida do segurado, sob pena de estar negando vigência àquilo que as partes tinham em mente quando celebraram o contrato. 

Por fim, a ministra concluiu que antes de concluir o contrato de seguro de saúde, pode a seguradora exigir do segurado a realização de exames médicos para constatação de sua efetiva disposição física e psíquica, mas, não o fazendo e ocorrendo sinistro, não se eximirá do dever de indenizar, salvo se comprovar a má-fé do segurado ao informar seu estado de saúde. 

Já no REsp 1.256.703, a Quarta Turma reconheceu a um hospital particular de São Paulo o direito de cobrar por atendimento médico de emergência prestado sem apresentação prévia do orçamento e sem assinatura do termo de contrato. O caso julgado foi de uma menina socorrida por policiais militares, após convulsão, e levada na viatura ao hospital. 

Para o relator, ministro Luis Felipe Salomão, a necessidade de assinatura prévia do contrato e de apresentação do orçamento para o atendimento médico deixaria o hospital "em posição de indevida desvantagem", pois "não havia escolha que não fosse a imediata prestação de socorro". 

"O caso guarda peculiaridades importantes, suficientes ao afastamento, para o próprio interesse do consumidor, da necessidade de prévia elaboração de instrumento contratual e apresentação de orçamento pelo fornecedor de serviço", afirmou Salomão. O ministro acrescentou que a elaboração prévia de orçamento, nas condições em que se encontrava a paciente, "acarretaria inequívocos danos à imagem da empresa, visto que seus serviços seriam associados à mera e abominável mercantilização da saúde".

Meio ambiente



Com base no princípio da insignificância, a Quinta Turma cassou decisão que condenou um pescador à prestação de serviços à comunidade por pescar dentro da Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, localizada no norte da ilha de Santa Catarina, onde fica a capital do estado, Florianópolis. 

O pescador foi preso em flagrante em seu barco, próximo à Ilha Deserta, pertencente à Reserva do Arvoredo. Foram apreendidos com ele equipamento de pesca e 12 quilos de garoupa (REsp 905.864). 

A relatora, ministra Laurita Vaz, considerou inexpressiva a lesão ao meio ambiente, aplicando, então, o principio da insignificância. Para ela, a quantidade apreendida de peixe - 12 quilos - representaria três ou quatro garoupas. 

No julgamento do REsp 1.264.302, a Segunda Turma entendeu que o Ministério Público Federal (MPF) deve manifestar-se em causa na qual se discute nulidade de auto de infração ambiental porque, na maior parte das vezes, o interesse envolvido transcende o interesse meramente patrimonial no crédito gerado, abarcando discussões de cunho substancial que dizem respeito ao meio ambiente em si. O recurso era de uma cidadã autuada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

DPVAT



Ao julgar o REsp 1.120.676, a Terceira Turma determinou o pagamento de indenização pelo Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre (DPVAT) aos pais de um nascituro morto em um acidente de trânsito. A mãe, grávida de uma menina, conduzia uma bicicleta em via pública quando se envolveu em acidente com um veículo automotor. A filha faleceu quatro dias depois, ainda no ventre materno. 

Com 35 semanas de vida intrauterina, nono mês de gestação, o colegiado concluiu, com base em conceitos científicos, que a menina era plenamente hábil à vida pós-uterina, autônoma e intrinsecamente dotada de individualidade genética e emocional. 

Já no REsp 1.185.100, os ministros da Quarta Turma decidiram que é indevida a indenização decorrente do DPVAT, se o acidente ocorreu sem o envolvimento direto do veículo. O recurso era de um trabalhador de Mato Grosso do Sul que reclamava indenização por uma queda ocorrida quando descia de uma carreta estacionada. 

Segundo o relator do caso, a improcedência do pedido decorreu do fundamento de que o veículo há de ser o causador do dano, e não mera "concausa passiva do acidente". O ministro examinou a adequação da ação em razão da possibilidade e da probabilidade de determinado resultado ocorrer, o que vale dizer que a ação supostamente indicada como causa deve ser idônea à produção do resultado.

Imóvel



Ao julgar o REsp 1.269.474, a Terceira Turma anulou leilão de imóvel penhorado ocorrido sete anos depois da avaliação judicial para fixação de seu valor. Para a Turma, a expansão imobiliária e a valorização de imóveis no Brasil na última década são fatos notórios, o que torna temerária a simples atualização monetária do valor estimado na perícia inicial. 

O bem foi avaliado no ano de 2000 em R$ 4,9 milhões. Atualizado pelos índices oficiais na data do leilão, em 2007, o valor alcançou R$ 8 milhões, resultando em arrematação por R$ 6,5 milhões. A executada, porém, apresentou laudos estimando o imóvel em R$ 13,6 milhões em 2007 e R$ 37 milhões em 2008. 

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, apesar do provável exagero na última avaliação, correspondente à valorização de R$ 24 milhões em apenas um ano, não se pode supor que ao longo dos sete anos a valorização imobiliária tenha correspondido apenas ao índice de correção monetária oficial. 

Já no REsp 830.572, a Quarta Turma restabeleceu indenização por danos morais a um homem que aguardava havia 12 anos pela entrega de um imóvel cuja construção sequer foi iniciada. Os ministros entenderam que, apesar de a jurisprudência do STJ afirmar que o descumprimento de contrato acarreta mero dissabor, a depender da peculiaridade do caso concreto é possível constatar abalo moral. 

Segundo o relator, ministro Luis Felipe Salomão, em uma realidade carente de soluções para o problema habitacional, em que a moradia constitui elemento basilar para o exercício da cidadania, há que se atentar para o fato de que o comprador, ao investir suas economias na aquisição do sonho da casa própria, viu-se alvo de uma situação que exacerba a naturalidade dos fatos da vida, causando séria e fundada aflição ou angústia em seu espírito. 

Para o ministro, aquele não era um caso de mero dissabor advindo de corriqueiro inadimplemento de cláusula contratual de menor importância. 

Outro julgado importante foi o REsp 1.139.030, que definiu que a cobrança de cotas condominiais prescreve em cinco anos, a partir do vencimento de cada parcela. Para a Turma, os débitos condominiais são dívida líquida constante de instrumento particular e o prazo prescricional aplicável é o estabelecido pelo artigo 206, parágrafo 5º, inciso I, do Código Civil de 2002. No caso em questão, um condomínio carioca ajuizou ação de cobrança contra um morador, requerendo o pagamento das cotas condominiais devidas desde junho de 2001.

Bancos



No julgamento do REsp 1.197.929, a Segunda Seção determinou que instituições financeiras devem responder de forma objetiva - ou seja, independentemente de culpa - no caso de fraudes cometidas por terceiros, indenizando as vítimas prejudicadas por fatos como abertura de contas ou obtenção de empréstimos mediante o uso de identificação falsa. 

Já no REsp 884.346, os ministros da Quarta Turma concluíram que terceiro de boa-fé que recebe e apresenta cheque pós-datado (popularmente conhecido como pré-datado) não está sujeito a indenizar seu emitente por eventuais danos morais decorrentes da apresentação antes da data combinada. 

O entendimento foi dado em recurso de um posto de gasolina contra decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. O relator do processo, ministro Luis Felipe Salomão, considerou que a empresa não é obrigada a indenizar o emitente do cheque, que teve seu nome negativado na Serasa.

Penal



Num dos julgamentos mais noticiados e comentados pela imprensa em 2011 (HC 149.250), a Quinta Turma considerou ilegais as investigações da Operação Satiagraha e anulou a ação penal em que o banqueiro Daniel Dantas, do grupo Opportunity, havia sido condenado por corrupção ativa. 

Para o colegiado, a operação da Polícia Federal foi ilegal em razão da participação de funcionários da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Por isso, as provas reunidas na investigação não poderiam ser usadas em processos judiciais. 

Já no HC 219.610, a Quinta Turma negou pedido de liberdade feito por José Rainha Junior e Claudemir da Silva Novais, presos por serem suspeitos de integrar organização criminosa voltada para a prática de crimes contra o meio ambiente, de peculato, apropriação indébita e extorsão. O relator do caso foi o ministro Gilson Dipp. 

No HC 228.097, a Sexta Turma decidiu que o empresário e publicitário Marcos Valério (figura central do escândalo do "mensalão") pode aguardar em liberdade o julgamento do habeas corpus apresentado por sua defesa no STJ. O relator, ministro Sebastião Reis Júnior, concedeu liminar ao empresário. 

Ele foi preso preventivamente com outros três empresários, seus sócios, devido a ordem expedida pelo juiz de direito da cidade baiana de São Desidério em decorrência da Operação Terra do Nunca 2. Deflagrada em três estados - Bahia, São Paulo e Minas Gerais, onde o publicitário foi preso -, a operação investiga um provável esquema de aquisição de papéis públicos e grilagem de terras em São Desidério, cidade localizada na região oeste da Bahia. 

Outro destaque da Quinta Turma foi o julgado que concluiu que a pensão por morte a ser paga ao menor sob guarda deve observar a lei em vigor na data do óbito do segurado, pois esse é o fato gerador para a concessão do benefício previdenciário: se o falecimento ocorreu antes da edição da Medida Provisória 1.523, de 11 de outubro de 1996, o recebimento está assegurado; se a morte ocorreu depois, o menor não tem direito ao benefício.

A Quinta Turma definiu também que o menor sob guarda não pode mais ser equiparado ao filho de segurado, para fins de dependência. De acordo com o voto do relator, ministro Gilson Dipp, o reconhecimento do direito à pensão por morte não é mais possível após as alterações promovidas pela MP 1.523, reeditada até sua conversão na Lei 9.528, em 10 de dezembro de 1997 (REsp 720.706).



(Fonte: Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ)

Brasil supera Reino Unido e se torna 6ª maior economia, diz entidade


26/12/2011 - 07h48

http://www1.folha.uol.com.br/bbc/1026219-brasil-supera-reino-unido-e-se-torna-6-maior-economia-diz-entidade.shtml

DA BBC BRASIL



O Brasil deve superar o Reino Unido e se tornar a sexta maior economia do mundo ao fim de 2011, segundo projeções do CEBR (sigla em inglês para Centro de Pesquisa Econômica e de Negócios) publicadas na imprensa britânica nesta segunda-feira.
Segundo a consultoria britânica especializada em análises econômicas, a queda do Reino Unido no ranking das maiores economias continuará nos próximos anos com Rússia e Índia empurrando o país para a oitava posição.
O jornal local "The Guardian" atribui a perda de posição à crise bancária de 2008 e à crise econômica que persiste em contraste com o boom vivido no Brasil na rabeira das exportações para a China.
O "Daily Mail", outro jornal que destaca o assunto nesta segunda-feira, diz que o Reino Unido foi "deposto" pelo Brasil de seu lugar de sexta maior economia do mundo, atrás dos Estados Unidos, da China, do Japão, da Alemanha e da França.

Segundo o tabloide britânico, o Brasil, cuja imagem está mais frequentemente associada ao "futebol e às favelas sujas e pobres, está se tornando rapidamente uma das locomotivas da economia global" com seus vastos estoques de recursos naturais e classe média em ascensão.

Um artigo que acompanha a reportagem do "Daily Mail", ilustrado com a foto de uma mulher fantasiada sambando no Carnaval, lembra que o Império Britânico esteve por trás da construção de boa parte da infraestrutura da América Latina e que, em vez de ver o declínio em relação ao Brasil como um baque ao prestígio britânico, a mudança deve ser vista como uma oportunidade de restabelecer laços históricos.
"O Brasil não deve ser considerado um competidor por hegemonia global, mas um vasto mercado para ser explorado", conclui o artigo intitulado "Esqueça a União Europeia... aqui é onde o futuro realmente está".
A perda da posição para o Brasil é relativizada pelo "Guardian", que menciona uma outra mudança no sobe-e-desce do ranking que pode servir de consolo aos britânicos.
"A única compensação (...) é que a França vai cair em velocidade maior". De acordo com o jornal, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, ainda se gaba da quinta posição da economia francesa, mas, até 2020, ela deve cair para a nona posição, atrás do tradicional rival Reino Unido.
O enfoque na rivalidade com a França, por exemplo, foi a escolha da reportagem do site "This is Money" com o título: "Economia britânica deve superar francesa em cinco anos".



26/12/2011 - 08h45

Conversa para inglês ver


GilbeGilberto Dimenstein ganhou os principais prêmios destinados a jornalistas e escritores. Integra uma incubadora de projetos de Harvard (Advanced Leadership Initiative). Em colaboração com o Media Lab, do MIT, desenvolve em São Paulo um laboratório de comunicação comunitária. É morador da Vila Madalena.

Não deixa de atiçar um orgulho patriótico a informação da imprensa inglesa de que estamos próximos a desbancar o Reino Unido na lista das maiores economias do mundo.
Isso não aconteceria se, nos últimos anos, nossa economia não tivesse um mínimo de estabilidade para gerar mais investimentos.
Mas é bom tomar cuidar com euforia que, certamente, será manipulada pelo governo. Só podemos comemorar nosso crescimento quando os indicadores sociais brasileiros estiverem num patamar de nação desenvolvida --o que estamos longe, muito longe de ter. Refiro-me aos números da educação ou saúde. Ou a qualidade de vida nas cidades, a começar pela segurança.
Londres é igual a São Paulo?
Seria uma idiotice não ficar feliz com a informação sobre nosso crescimento --e que se deve em boa parte aos anos de PT e PSDB no poder. Mas, pelo mesmos critérios, comemoração civilizada deve ser medida pela qualidade da escola pública, onde se constrói a democracia de um país.
O resto é para inglês ver.

Por uma corte latinoamericana de Direito Ambiental


25/12/2011 às 08:18:33 - Atualizado em 25/12/2011 às 08:20:21

http://www.parana-online.com.br/canal/direito-e-justica/news/582923/?noticia=POR+UMA+CORTE+LATINOAMERICANA+DE+DIREITO+AMBIENTAL

Vladimir Passos de Freitas


A questão ambiental se agrava e assume maior relevância. Assustados, vemos os problemas aumentarem, as discussões tornarem-se acaloradas (v.g., PL do novo Código Florestal). Não raramente, jovens casais decidem não ter filhos e os que os têm não escondem sua preocupação com o estado do mundo e o futuro de seus descendentes.
O problema é multifacetado, como uma hidra, um monstro com centenas de tentáculos. Enquanto se dá cabo de um, outros surgem para atacar. Alguns chamam a atenção (v.g., destino dos resíduos sólidos ou destruição da selva amazônica). Outros, por não serem visualizados, passam despercebidos (v.g., a contaminação das águas subterrâneas).
Os países latinoamericanos, uns mais, outros menos, vão se conscientizando a respeito. É possível afirmar que todos possuem legislação moderna e compatível. Já o mesmo não se pode dizer da efetividade. Há, ainda, países em que, apesar da existência de excelentes estudiosos da matéria, raramente se encontram julgamentos dos Tribunais favoráveis à proteção ambiental. O México é um deles.
O "Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma)", cuja oficina para a América Latina tem sede no Panamá, promove regularmente cursos de capacitação para os funcionários de órgãos ambientais latinoamericanos. Além disto, juízes, agentes do Ministério Público, professores, reúnem-se em eventos internacionais, criam redes de discussão, aproximam-se na busca de soluções comuns.
Mas tudo isto tem se revelado insuficiente. São, na maior parte, iniciativas isoladas. Boas, mas não resolvem. É preciso que a ação e a efetividade ultrapassem fronteiras.
O juiz Amedeo Postiglione, da Suprema Corte de Cassação da Itália, desde os anos 1990 luta pela criação de uma Corte Internacional de Justiça Ambiental. Mais recentemente, a advogada escocesa Polly Higins encaminhou à ONU uma proposta para incluir o ecocídio na competência do poderoso Tribunal Penal Internacional, proposta esta que necessita do apoio de 86 dos 116 países que compõem a comunidade internacional (Revista IstoÉ, 5.10.2011, p. 112).
Na ONU, a Corte Internacional de Justiça (CIJ), com sede em Haia, Holanda, tem competência para julgar conflitos internacionais e, entre eles, os ambientais. É por isso que nela se processou a ação movida pela Argentina contra o Uruguai, envolvendo a polêmica construção de uma indústria de celulose na fronteira dos dois países. Na CIJ também o Equador aciona a Colômbia, porque este país, ao destruir as plantações de coca na área de fronteira, utilizando lançamento de veneno por seus aviões (fumigación), causava danos ambientais no país vizinho.
Mas estas ações apresentaram resultados práticos pouco significativos. Além de serem poucas, as decisões da CIJ, para serem executadas, dependem da boa vontade do país aderente ao Tratado. Não há um CPC internacional para executar as sentenças da CIJ.
Bem mais eficiente tem sido a Organização Mundial de Comércio (OMC), com sede em Genebra, Suíça. Se um dos países apresenta uma reclamação à OMC, ela é decidida por um juiz e, em segunda instância, pelo Órgão de Apelação, que se assemelha a um Tribunal de Recursos. Este órgão conta com sete juízes, que julgam em duas Câmaras de três membros e que cumprem mandato de quatro anos. Suas decisões são muito bem fundamentadas, em alguns casos chegam a ter 1.000 folhas. O mais importante é que o vencido sofre retaliação econômica. Cumpre ou sofre economicamente.
Na área ambiental há casos clássicos decididos na OMC, como o do "camarão-tartaruga", em que a Índia, Paquistão, Malásia e Tailândia reclamaram contra os Estados Unidos, e o do atum-golfinho, envolvendo México e Estados Unidos, saindo-se o primeiro vencedor.
Preocupado com a inexistência de uma autoridade internacional, o presidente da França, Nicolas Sarkozy, tentou em 2010 sensibilizar vários países para a criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente, assemelhada à OMC. Apesar do esforço do chefe de Estado francês, que inclusive esteve em visita ao Brasil, a iniciativa não deu resultados. No houve o apoio dos países desenvolvidos.
Pensando de forma menos ambiciosa, limitando os sonhos à América Latina, qual seria o caminho mais eficiente para termos uma política ambiental integrada? O que fazer para que Tratados, como o de Cooperação Amazônica, celebrado pelo Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela em 1978, sejam algo mais do que um protocolo de intenções?
De pronto é possível responder que uma espécie de OMC ambiental de nível regional, seria de criação quase impossível. Com efeito, se não temos sequer um bloco econômico forte (o MERCOSUL e o Pacto Andino não avançam), isto bem demonstra como seria difícil um bloco ambiental.
Não solucionaria também termos um Tribunal à semelhança da Corte Internacional de Haia, com a obrigatoriedade dos países cumprirem os Tratados celebrados. É que, além do problema da execução do julgado, os Acordos internacionais na área ambiental são vagos, genéricos, verdadeiras cartas de intenções.
A única solução seria a criação de um Tribunal Ambiental Latinoamericano (Tala), no qual os aderentes se comprometessem a executar, além dos Tratados Internacionais, as suas leis domésticas, podendo ser sancionados em caso de descumprimento.
Mas será que os países latino-americanos concordariam em abdicar de sua jurisdição a favor da proteção ambiental? A resposta é difícil. Os governos iriam ponderar as vantagens e desvantagens, principalmente econômicas. Por exemplo, uma vez aderindo ao Tratado que cria o Tala o país poderia ser acionado caso construísse um grande porto sem todos os estudos e cautelas de proteção ambiental.
Partindo-se da premissa de que, pelo menos em tese, há interesse, a iniciativa teria que partir do Ministério das Relações Exteriores de algum dos países da região. Evidentemente, esse Ministério analisaria a matéria junto com outros de importância e interesse no assunto, como o do Meio Ambiente, Indústria e Comércio, Desenvolvimento e Agricultura.
Se fosse tomada tal iniciativa por um país, seriam necessárias várias rodadas com os outros países para, quem sabe, chegar-se ao fim almejado. O Brasil, pela liderança que indiscutivelmente tem na região, seria o protagonista ideal. E o fato de termos em junho de 2012 a Rio + 20, na cidade do Rio de Janeiro, sugere um momento ideal.
Então, daremos o primeiro passo? Ou continuaremos em uma inércia secular, aguardando uma catástrofe de grandes proporções, para então pensarmos a respeito.


Vladimir Passos de Freitas é desembargador federal aposentado do TRF 4ª Região, onde foi presidente, e professor doutor de Direito Ambiental da PUC-PR.

Destruição ambiental prejudicará as exportações brasileiras

26/12/11 - 00:00 

Para José Eli da Veiga, destruição ambiental prejudicará as exportações brasileiras


As mudanças na legislação sobre as florestas, aprovadas no Congresso e avalizadas por uma parte do governo de Dilma, estão na direção contrária à de algumas políticas governamentais - como o Plano Brasil Maior - que tentam colocar o País na trilha da economia do conhecimento - São Paulo

As mudanças no Código Florestal pelo Congresso Nacional são um "tapa na cara" do Plano Brasil Maior, um dos dois pilares da estratégia que está sendo elaborada no Ministério da Ciência e Tecnologia para tentar recuperar o tempo perdido e colocar o Brasil na trilha da economia do conhecimento. A avaliação é do professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Núcleo de Economia Socioambiental (Nesa), José Eli da Veiga (fotos abaixo). "O País precisa urgentemente produzir mais inovação, investir mais em pesquisa. Esse esforço começa a ser feito com mais ênfase por uma parte do governo, mas outra parcela do governo está do lado de um caminho bem diverso daquele: o que privilegia a exportação de grãos, carne bovina e minérios e, em consequência, vende barato ao exterior nossos recursos naturais, entre eles a água", afirma o especialista, que também é autor de vários livros sobre a questão do desenvolvimento sustentável.



Veiga cita a expressão cunhada pelo presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Márcio Pochmann, para ilustrar seu pensamento: "O Brasil da 'Fama' briga com o Brasil do 'Vaco'". "Fama" é a sigla de "fazenda, mineração e maquiadoras" (indústrias meramente montadoras, pois importam componentes para finalizar o processo de produção no País). E o Brasil do "Vaco" é o do "valor agregado e do conhecimento". "É como se estivéssemos em uma encruzilhada, um grande confronto entre dois projetos para o Brasil", completa, lembrando que o Plano Brasil Maior prevê uma série de ações para tornar a indústria mais competitiva. De acordo com ele, a bancada ruralista, que se mobilizou para aprovar no Senado o "perdão" a desmatadores e outras flexibilizações na legislação atual, "quer o Brasil da 'Fama', direcionando a economia para agronegócio, mineração e maquiadoras.





Caminho do futuro

Do outro lado estão o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o Ministério da Ciência e Tecnologia e os setores produtivos, conscientes do valor da proteção dos recursos naturais no comércio mundial. "Esta turma está tentando construir um planejamento que insira o Brasil de modo diferente na economia internacional, cada vez mais intensiva em conhecimento. É o que determinará o futuro das nações e o grau de desenvolvimento que poderão alcançar, diz Veiga. "Infelizmente, para atender à parcela da produção brasileira refugiada no Ministério da Agricultura, as alterações no atual Código Florestal vão no sentido contrário à perspectiva do futuro." 



Os ruralistas estão gostando muito dos privilégios incluídos na legislação sobre o uso das florestas nas propriedades privadas, mas as futuras gerações terão de apresentar certificação ambiental da produção, especialmente nos mercados dos países desenvolvidos. "E ter Áreas de Proteção Permanente, elas são básicas nisso. Os ruralistas podem argumentar que hoje isso não é problema, mas estão prejudicando o futuro dos próprios filhos", assinala o professor.



Por isso, na opinião de Veiga, não recompor integralmente os 55 milhões de hectares desmatados e facilitar a destruição de novas áreas florestais é literalmente um tiro no pé. "Não dá nem para dizer que só o curtíssimo prazo foi considerado, mas o passado", sublinha. Não se trata mais daquela concepção de defender a preservação das florestas apenas pensando que as gerações atuais precisam deixar um legado ambiental para as próximas, acrescenta. Tanto que, ainda de acordo com Veiga, a indústria não deverá requerer "isonomia" de tratamento com o agronegócio, buscando retroceder a legislação ambiental vigente que culminou com o recente Plano Nacional de Resíduos Sólidos. 



Este plano, que levou vários anos para ser aprovado no Congresso e ainda está em fase de regulamentação, obriga indústria, comércio e consumidores a destinar corretamente os materiais descartados. "Os setores produtivos mais avançados, até do agronegócio, já entenderam que sustentabilidade é uma oportunidade de novos produtos, novos mercados, e que não adianta ir contra essa tendência mundial. Houve um momento em que até resistiram, mas depois os empresários mais modernos entenderam e passaram a adotar em seus processos de produção técnicas que consomem menos recursos naturais", comenta. 



Sem veto

Assim como o Palácio do Planalto terá argumentos para justificar a provável concordância de Dilma à anistia aos desmatadores, o governo dará um jeito de se desculpar perante o mundo na Rio +20, a conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, agendada para junho próximo no Rio, e considerada um dos maiores eventos políticos deste início de século. "A Dilma não vai vetar nada no texto, apesar da promessa de campanha de não aceitar a anistia. Se um cara como o senador Jorge Viana [do PT do Acre, relator das mudanças no Código no Senado], um dos mais atuantes parlamentares da bancada dos ambientalistas, diz que não é anistia, então por que a presidente vetaria? Do mesmo jeito vai ser possível explicar aos demais países as mudanças. Afinal, temos 65% de florestas - o que nenhum outro país tem", ressalta. 



"Se for para criticar o Brasil, é muito mais pelas emissões do que pelo Código Florestal. Excluído o desmatamento, o Brasil ocuparia o nono lugar no ranking dos países que mais emitem gases de efeito estufa. Mas considerando o desmatamento, somos o terceiro maior emissor, atrás apenas da China e dos Estados Unidos. Até temos uma matriz energética limpa perto dos demais países, mas a destruição das florestas tem efeitos terríveis", lembra Veiga. 



O relevante, entretanto, é que as alterações no Código feitas até agora - e que provavelmente serão avalizadas na Câmara dos Deputados e depois seguirão para sanção presidencial - vão na direção contrária à do documento do Brasil apresentado à Rio+20 e ao Plano Nacional de Mudanças Climáticas, observa Veiga. "O compromisso do Brasil é reduzir o desmatamento para diminuir a principal causa da emissão de carbono, o desmatamento. Ninguém duvida que a legislação vai dificultar o cumprimento das metas que o próprio País estipulou para os próximos anos", diz.



Enterro do Código

O Código Florestal, criado em 1965, está sendo enterrado, na avaliação de Veiga. "O que está sendo feito não é mais um código florestal. O atual é um código porque trata do assunto em geral - inclui todos os aspectos das florestas, inclusive terras indígenas e unidades de conservação. Agora já existe uma lei específica para unidades de conservação, outra para terras indígenas, e assim por diante. O que estava faltando era uma lei que regulasse melhor a gestão das florestas dentro das propriedades particulares, apenas essa parte. Na nova lei não aparece a palavra 'código'", explica. "O Código será enterrado de qualquer jeito."



A discussão é se o enterro pelo menos resolverá algumas questões pendentes. "Infelizmente, os problemas são inúmeros, a começar pelo tamanho do texto, que aumentou umas quatro vezes", observa Veiga. De 18 páginas, passou para 60 - e para tratar apenas do uso das florestas nas propriedades particulares. O primeiro "absurdo" é a definição da data para separar o que a bancada ruralista chamou de passivo ambiental (o passado) das regras que vão valer no futuro. O texto fixou 22 julho de 2008, não de 1998, como defendem os ambientalistas. Em julho de 2008, decreto do então presidente Lula previu multas a proprietários rurais que descumpriram a lei por desmatamento. O decreto, que venceu no dia 11 de dezembro, foi prorrogado por Dilma até 11 de abril de 2012 para dar tempo à Câmara de finalizar a tramitação das mudanças no Código. 



"O Código foi promulgado em 1965, no governo de Castelo Branco, mas depois os governos - inclusive a ditadura militar - mudaram de atitude em relação à proteção das florestas e não só ignoraram a lei como incentivaram a migração para a Amazônia, onde se desmatava no menor tempo possível e sem o menor constrangimento", comenta. Na época, muitos agricultores descumpriram o Código, "mas de boa fé, porque foram induzidos a isso, pois o próprio governo ignorou a lei". 



Mas, na avaliação de Veiga, isso começou a mudar com a Constituição de 1988, que tem um capítulo avançado sobre meio ambiente. "O Congresso se mobilizou e votou uma a Lei dos Crimes Ambientais, amplamente debatida e divulgada. A partir de 1999, quem derrubou, sobretudo em Áreas de Preservação Permanente (APP), que abrangem beiras de rio, encostas, nascentes, ou em reservas legais, praticou um crime conscientemente", observa Veiga. 



Nas APPs o desmatamento é muito mais grave do que nas reservas legais, onde o Código determina a preservação de determinado percentual de cada bioma - varia de 20%, no sudeste, a 80%, na Amazônia -, sem levar em conta se a terra é inteira de solos de altíssima aptidão agrícola, o que torna irracional a manutenção da mata, como argumentam os ruralistas. "Os agricultores até têm certa razão ao reclamar das reservas legais, mas destruir florestas em APP é algo que prejudica toda a sociedade, inclusive os agricultores. No entanto, foram desmatados 55 milhões de hectares de APPs no Brasil. 



Deste total, 11 milhões de hectares por lavouras e é preciso reconhecer que parte dessas lavouras cumpre as funções da mata, ou seja, não causam erosão, assoreamento. Não faria sentido eliminar arrozais no Rio Grande do Sul nem plantações de maçã em Santa Catarina ou cafezais em Minas, nas encostas. Nesse sentido, as mudanças viriam consolidar, atualizar o Código", defende. 



Indulto ao desmatamento

Mas não. Quem desmatou APPs entre 1998 e 2008 não será anistiado, mas beneficiado por um indulto. "Anistia é quando existe dúvida sobre a situação em que a ilegalidade aconteceu. No entanto, quando o crime foi constatado, julgado e com sentença, mas existe o perdão, isso é indulto. Quem desmatou entre 1998 e 2008 vai receber um indulto, muito pior que anistia", alfineta Veiga. 

Inaceitável, portanto, é o "indulto" concedido pelos congressistas aos responsáveis pelo desmatamento de 44 milhões de hectares de APPs para a formação de pastagens, condena Veiga. "É crime de lesa-humanidade. E se uma lei faz isso, pode ser até constitucional, mas é criminosa. Qualquer pessoa que tem o 'beabá' da agronomia sabe disso", sublinha o especialista. Ele considera "ilógico" que os ruralistas tenham aceitado recompor parte das reservas legais destruídas, mas se recusaram a essa reparação no caso das APPs.



Veiga admite alguma flexibilização - como a trazida em relação às reservas legais, que permite o proprietário compensar fora do imóvel a mata derrubada, e até mesmo em condomínio. "Em terras de maior aptidão agrícola, é mais vantagem utilizar toda a terra para produção e pagar outro proprietário, em terras mais fracas, para fazer reserva. Mil vezes melhor deixar a floresta lá", explica. "A lei que disciplina a floresta deveria justamente orientar para essa racionalidade. Os congressistas aceitaram manter altos percentuais de reservas legais e liberaram geral nas APPs."



O segundo "absurdo", segundo Veiga: dos 44 milhões hectares de floresta roubados pela pecuária, só cerca de 10% serão reconstituídos, segundo levantamento de cientistas, nos 15 metros de cada lado dos rios. O terceiro problema é a nova lei ter estendido a todos os imóveis rurais de até quatro módulos fiscais a liberação dada à agricultura familiar. "Desobrigar todos os imóveis desse tamanho de ter reservas e proteger APPs só seria justo se todos fossem de pequenos agricultores, mas muitos deles são chácaras de lazer e não se enquadram nos critérios que caracterizam a propriedade familiar", diz Veiga. Além do tamanho, a propriedade deve ser a principal fonte de renda da família. 

A madeira em tempos de sustentabilidade


A madeira em tempos de sustentabilidade-IV

A madeira em tempos de sustentabilidade-IV
Silvio Colin

Quando o tema da sustentabilidade entrou na pauta dos arquitetos mais conscientes, a utilização da madeira na arquitetura passou a ser encarada com certa desconfiança. Afinal de contas, poderíamos estar indiretamente contribuindo para o desmatamento de nossas reservas, indo enfim de encontro às agendas progressistas relacionadas com o nosso ecossistema.
File:Tjibaou cultural center.jpg
Centro Cultural Jean-Marie Tjibaou. Nova caledônia. 1991-98. Arquiteto Renzo Piano.
Uma das mais inspiradas utilizações da madeira na grande arquitetura.
Esta desconfiança, entretanto, é absolutamente injustificável. A madeira possui excelentes qualidades ambientais. Tem baixa energia incorporada[1], se comparada com o aço, alumínio e concreto. È, ainda, dentre os materiais utilizados na construção, o único renovável. Isto quer dizer, com a utilização do manejo florestal sustentável, a floresta de origem continuará oferecendo suas riquezas para as gerações futuras. O mesmo não se poderá dizer do concreto, pois seus componentes agregados, a areia e a pedra britada, são retirados da natureza e transformados de tal maneira que a ela não poderão voltar. Isto sem falar do cimento, grande consumidor de combustíveis fósseis, responsável por grande parcela das emissões de gás carbônico. Isto quer dizer, altíssima energia incorporada.
Casa Helio Olga
Casa Helio Olga, São Paulo, 1990. Arquiteto Marcos Acayaba.
Entretanto, talvez seja o fantasma do desmatamento de nossas reservas florestais, da exploração irracional, predatória e ilegal que assusta aqueles que desejam especificar a madeira em seus projetos. Afinal, o desmatamento é um dos grandes inimigos da sustentabilidade. Tem graves conseqüências além da perda direta dos recursos naturais, como a alteração climática, a extinção da biodiversidade, degradação do solo, influência nas águas, alterando o regime das enchentes, secas e erosões, provocando o deslocamento das culturais locais.
Afinal de contas, historicamente, o Brasil tem o próprio nome ligado à extração predatória da madeira. Lembremos que ainda no primeiro século de vida, o país viu serem extintas as suas reservas de pau brasil, na Mata Atlântica, para fornecer corante para tecidos na Europa.
Casa ConverseyCasa Conversey. Grachaux, França. Arquitetos B. Quirot e O. Vichard.
Um primeiro controle nos vem dos tempos do Império. A conhecida expressão “madeira de lei”, que em sentido amplo designa madeiras que, por sua qualidade e resistência, principalmente ao ataque de insetos e umidade, são empregadas em construção civil, naval, confecção de móveis de luxo, instrumentos musicais e artigos de decoração[2], tem origem remota, em uma lei imperial que, apesar de muito conhecida, não tem definição técnica. A Carta de Lei de 15 de outubro de 1827, incumbia aos juizes de paz das províncias a fiscalização das matas e zelar pela interdição do corte das madeiras de construção em geral, por isso chamadas madeiras de lei. A circular de 5 de fevereiro de 1858 designa as madeiras cujo corte era reservado, mesmo em terras particulares. Portanto, o corte de madeiras de construção, comumente denominadas madeiras de lei, estava interditado quer em terras particulares, quer em terras devolutas.[3] A expressão madeira de lei chegou até nossos dias ainda como sinônimo de madeira de construção, civil e naval, ou seja, conforme o dicionário Aurélio: “madeira dura ou rija, própria para construções e trabalhos expostos às intempéries”. Madeira de lei pode, ainda, se referir àquelas madeiras de alto valor no mercado.
Casa Bandeira de Mello, Itu SP, 2003. Arquiteto Mauro Munhoz.
Casa Bandeira de Mello, Itu SP, 2003. Arquiteto Mauro Munhoz.
Há que considerar, porém, que a madeira utilizada para construção, seu uso mais nobre, é apenas uma parte das árvores abatidas nas nossas florestas, aproximadamente 30% do total de toras. 37% são consumidas como carvão vegetal e 17 % como lenha industrial, o uso mais servil. Lâminas e compensados são responsáveis por 7%.[4]
Pode entretanto o arquiteto se precaver contra a utilização de madeira ilegal especificando, recomendando, exigindo, dependendo da etapa do empreendimento, madeira certificada, isto é, oriunda de processos sustentáveis de extração.
madeira 20004
Casa Loblolly. Ilha Taylors, Maryland. Arquiteto Kieran Timberlake.
Mas o que é madeira certificada? É a madeira que possui um atestado de um órgão reconhecido que garante ser oriunda de um processo produtivo manejado de forma correta. A certificação serve também para orientar o consumidor ou empresário a escolher um produto diferenciado e com grande valor agregado, que contribui para o desenvolvimento social e econômico das comunidades florestais.
Dentre os vários sistemas de certificação, o FSC (Forest Stewardship Council- Conselho de Manejo Florestal) é hoje o selo verde mais conhecido e aceito em mais de 75 países de todos os continentes. Este conselho foi criado como resultado de uma iniciativa para a conservação ambiental e desenvolvimento sustentável das florestas do mundo inteiro. Seu objetivo é difundir o uso racional da floresta, garantindo sua existência no longo prazo e certificar que o produto foi resultado de um manejo florestal sustentável.
Casa na Praia Brava, Ubatuba SP, 2007. Dal Pian Arquitetos.
Casa na Praia Brava, Ubatuba SP, 2007. Dal Pian Arquitetos.
Por sia vez, “manejo florestal sustentável” consiste em um controle rigoroso do processo extrativo da madeira. Começa com a seleção árvores a explorar: somente as árvores sadias, de diâmetro igual ou superior a 45 cm podem ser abatidas. As árvores remanescentes são reservadas para o ciclo de corte seguinte. Durante o corte, a queda da árvore é ajustada de maneira a evitar que ela venha a danificar outras. Estabelece-se também os ramais de arraste para levar as árvores extraídas até o pátio.
madeira 20001 - Cópia - Cópiamadeira 20001 - Cópia
Casa Península Vitória. Austrália. Arquiteto Sean Godsell.
O tratamento pós-exploratório consiste nos cuidados com a área de onde foi retirada a árvore. São chamados tratamentos silviculturais. Consistem em limpeza, desbaste de árvores não comerciais, plantio de enriquecimento com espécies comerciais. Estes tratamentos podem aumentar significativamente o crescimento e valor das árvores, podendo mesmo até ser o crescimento duplicado. È avaliado também o impacto sobre a floresta remanescente e sobre o solo, o desperdício, e aplicadas medidas de proteção florestal, proibindo a caça, pesca e qualquer atividade extrativa. Incluem também o controle de incêndios e invasões. A infra estrutura estabelecida para o manejo, pátios, estradas primárias e secundárias, bueiros, pontes etc. fica como um acervo da região.
Parafraseando a anedota pecuária, que diz que do boi somente se perde o berro, da madeira não se perde nada. É um excelente material estrutural, que durante séculos foi o único que admitia o serviço de flexão, versatil e resistente material para acabamentos externo, utilizável em toras, tábuas, “shingles” e réguas; pode ser utilizado como material de cobertura, e é ainda é o mais belo e utilizado material de revestimento interno, em lambris de réguas e folheados. Com os devidos cuidados, pode o arquiteto desfrutar deste material, de sua beleza, de suas propriedades estáticas e de sua versatilidade, sem nenhuma culpa.


A madeira em tempos de sustentabilidade – III


Madeira transformada

A indústria de transformação da madeira produz diversos tipos de produto, dos quais citamos a seguir os principais.
Madeira compensada – Pode ser laminada ou sarrafeada. No primeiro caso, as lâminas são retiradas do lenho das árvores em um torno desenrolador depois de amolecido com água ou vapor. Estas folhas são coladas cm resinas sintéticas, alternando o sentido das fibras. No segundo caso, o miolo da chapa é composto de sarrafos, e não de folhas. A madeira compensada é utilizada para, mobiliário, revestimento de tetos e paredes, esquadrias e divisórias, formas de concreto.
Compensado sarrafeado e compensado laminado. Imagens e
Madeira reconstituída - O tecido lenhoso é primeiramente reduzido a fitas, lascas ou flocos depois reconstituído por pressão usando como ligante a uréia, a caseína ou resinas sintéticas ou mesmo sem ligante, contando apenas com a lignina, própria das fibras. Estes produtos têm suas propriedades químicas e físicas controladas, podendo ser mais ou menos densas, mais ou menos resistentes a ataque de agentes químicos ou biológicos, e tendo em vista a aplicação a que se destina. Atualmente é grande a diversidade de produtos de madeira transformada, sobretudo na forma de painéis para uso na construção civil e indústria moveleira, resultado sobretudo da necessidade de preservação das reservas florestais nativas e imposição legal da obrigatoriedade de reflorestamento para a comercialização da madeira.
Diversas são as classificações adotadas para as madeiras transformadas, que variam quanto ao processo de fabricação, propriedades físicas e químicas e destinação. Damos a seguir uma descrição dos produtos mais importantes.
1 – Madeira compensada
Durante muitos anos o compensado foi o painel de madeira mais importante produzido e consumido no Brasil. Com instalação inicial no Sul do país por volta dos anos 40, a indústria deste setor baseava-se nas florestas naturais de Araucária, embora tenha atingido níveis significativos de produção apenas na década de 70. Os compensados surgiram em escala industrial após o desenvolvimento de um sistema capaz de laminar, ou folhear, a madeira.

Moveis de compensado
O painel compensado tradicional é composto por três ou mais lâminas torneadas, unidas uma perpendicularmente à outra com adesivo ou cola, sempre em número ímpar, de tal forma que algumas propriedades físicas e mecânicas se tornem superiores às de madeira original (a contração, por exemplo, é quase totalmente eliminada).
Quanto à matéria-prima utilizada, estima-se que 60% do compensado nacional seja produzido com madeira tropical, enquanto que os outros 40% seja produzido com madeira de florestas plantadas nas regiões Sul e Sudeste (particularmente o Pinus), incluindo o tipo “combi” (face em madeira tropical e miolo em madeira de Pinus).
Criação original utilizando compensado. Imagem
Os maiores consumidores de compensados são os fabricantes de móveis e os construtores civis. O valor desse produto varia de acordo com as espécies e a cola utilizada, com a qualidade das faces e com o número de lâminas que o compõe. Há compensados tanto para uso interno, com colagem a base de resina uréia-formol, utilizados pela indústria moveleira, quanto externo, com colagem à base de fenol-formol, utilizados normalmente na construção civil. Chapas finas de compensado apresentam algumas vantagens sobre as demais madeiras industrializadas, pois são maleáveis e podem se curvar. Na indústria moveleira são empregados principalmente na produção de armários, roupeiros, tampos de mesa, laterais de móveis, braços de sofá, fundos de armários e de gavetas, prateleiras, pisos e portas residenciais internas.
Os painéis compensados apresentaram um acentuado declínio em seu consumo, no ano 2000, provocado pela perda de mercado para o MDF e para o aglomerado. O crescimento da produção foi absorvido pelas exportações, uma vez que o produto brasileiro tem expressiva participação no mercado mundial.
No Brasil, os compensados são tradicionalmente divididos conforme sua fabricação em dois tipos[1]: multilaminados (plywood), formado por lâminas de madeira). e sarrafeados (blockboard), formado por duas lâminas de madeira externas e miolo sarrafeado.
Segundo as normas brasileiras, conforme o local de utilização, as chapas de compensado podem ser classificadas em: IR (interior), IM (intermediário) e EX (exterior). Além desta classificação, há uma outra que atende às normas e que também é utilizada pelo mercado em geral. Nessa classificação, os compensados são subdivididos quanto ao seu uso, conforme apresentado a seguir:
Compensados de uso geral – São chapas de madeira compensada, multilaminada ou sarrafeada, e cujo adesivo empregado na sua fabricação a restringe ao uso interno, utilizando o adesivo uréia-formaldeído. Este tipo de chapa tem grande aplicação na indústria moveleira. Os painéis tem espessura mais comuns variando entre 3mm e 25mm, podendo chegar até 35mm. As dimensões usuais são: 2,20m x 1,60m.

Compensado para formas de concreto. Imagem
Forma de concreto – São chapas de madeira compensada, multilaminada, e cuja colagem é à prova d’água, à base de adesivo fenol-formaldeído admitindo-se portanto o uso exterior. Este produto é largamente empregado na construção civil. São fabricados com acabamentos distintos relacionados com sua destinação e uso. São fabricados nas seguintes dimensões: 1,10 x 2,20 m, espessuras 6, 10, 12, 14, 17 e 20 mm. 1,22 x 2,44 m, espessuras – 6, 10, 12, 15, 18, 21 mm. Podem ser: Plastificados, permitindo uma maior reutilização (cerca de sete vezes); Resinados, permitindo cerca de duas reutilizações.
Formas para concreto de compensado. Imagem
Decorativo (compensado laminado) – Estas chapas recebem na sua superfície uma lâmina de madeira considerada como decorativa, e a colagem deve ser do tipo intermediária, ou seja, podem ser utilizadas em locais de alta umidade relativa, e eventualmente entrar em contato com a água. O uso final deste produto é principalmente na fabricação de móveis.

Compensado decorativo. Imagem < woodenconcepts.net>
Industrial – A chapa do tipo industrial é aquela que possui a menor restrição em termos de aparência da superfície, mas é exigida boa resistência mecânica e o adesivo utilizado deve ser do tipo à prova d’água. A utilização do produto é muito ampla, destacando-se a embalagem.
Naval – São chapas classificadas genericamente como de uso exterior, colagem é à base de adesivo fenol-formaldeído (cola à prova d’água), com alta resistência mecânica e montagem perfeita. Destinam-se normalmente ao uso em aplicações que exigem o contato direto com a água.
Painel estrutural – Utilizado em construção civil, na chamada “construção seca”, para paredes divisórias externas e internas e mesmo lajes de mezaninos. É composto de miolo de madeira maciça, laminada ou sarrafeada, contraplacado em ambas as faces por lâminas de madeira e externamente por placas cimentícias em CRFS (Cimento Reforçado com Fio Sintético) prensadas. O processo de industrialização dos painéis constitui-se da prensagem especial dos componentes a alta temperatura, resultando em um produto de características técnicas de comprovada qualidade. A principal vantagem do painel estrutural é a maior resistência do painel à flexão estática no sentido paralelo ao seu comprimento. Dimensões 2,50 x 1,20 m, cm espessura de 40 mm.
Painel estrutural
Piso de mezanino feito com compensado estrutural. Imagem
2 – Madeira reconstituída

Aglomerado. Imagem
Aglomerado (Particleboard – Painel de partículas) – São painéis compostos de partículas de madeira ligadas entre si por resinas sintéticas (geralmente uréia-formaldeído). Sob ação de pressão e temperatura, a resina polimeriza, garantindo a coesão do conjunto. As partículas mais finas são depositadas na superfície, enquanto que aquelas de maiores dimensões são depositadas nas camadas internas. No Brasil, é utilizada principalmente a madeira de Pinus na fabricação do aglomerado, embora em princípio não haja restrições quanto ao uso de outras espécies. Dimensões mais comuns 1,83 x 2,75 m e 2,10 x 2,75 m, com espessuras variando de 9 a 25 mm.
MDF. Imagem Wikipedia
MDF (Medium Density Fiberboard) – painel de fibras de média densidade) – São painéis reconstituídos formados a partir da redução de madeira a dimensões básicas (fibras). Essa redução ocorre através de processo termo-mecânico, procedendo-se, posteriormente, ao reagrupamento dessas fibras através da adição de adesivo (resinas sintéticas), para então, através da prensagem, serem formados os painéis. Semelhante ao aglomerado, o MDF produzido no Brasil utiliza-se basicamente de madeira de florestas de Pinus. Dimensões mais comuns 1,83 x 2,75 e 2,10 x 2,75 com espessuras variando de 3 a 35 mm.
OSB
OSB (Oriented Strand Board – painel de flocos orientados) – São painéis produzidos a partir de flocos (ou lascas) de madeira relativamente finos,aproximadamente 1 mm, com larguras e comprimentos variando entre 10 e 50 mm. As chapas são formadas geralmente de várias camadas, sendo que nas camadas externas, os flocos apresentam o mesmo sentido, enquanto que na camada interna a orientação dos flocos é perpendicular às camadas da superfície ou aleatória. No Brasil, o OSB é produzido também em madeira de Pinus. Dimensões 2,40 x 1,20 m e 2,50 x 1,25, com espessuras de 9,12, 15, 18 e 25 mm.

Chapa de Fibra (Hardboard) – As chapas duras ou chapas de fibra são painéis de alta densidade produzidos por processo úmido utilizando-se calor e pressão sem a adição de resina. Dentre os painéis de madeira reconstituída é o menos consumido mundialmente e sua tecnologia de fabricação é considerada poluente e obsoleta. São utilizados pelas indústrias moveleiras, de construção civil e automobilística. No Brasil a madeira utilizada para a fabricação desse painel é o eucalipto, proveniente de florestas plantadas. O processo produtivo das chapas de fibra envolve um elevado volume de água que é adicionado à fibra de madeira de eucalipto e, depois, retirado com a ação de calor e pressão, fazendo com que as fibras do eucalipto fiquem consolidadas em chapas de madeira. É um processo termomecânico, sem a adição de resinas que não a lignina, resina natural do eucalipto. As chapas de fibra fabricadas têm espessura que varia de 2,0 a 6,0 mm, e as dimensões das placas são 1,85 x 2,44 m, 1,85 x 2,75 m ou 1,85 x 3,05. Podem ser apresentadas lisas, perfuradas, com pintura a base de água em uma das faces ou com pintura melamínica.