Segundo eles, o melhor a fazer é criar mecanismos de mediação e conciliação entre acusados e MP
17 de março de 2012 | 15h 10
Bruno Lupion - estadão.com.br
SÃO PAULO - Se houvesse a 'Copa do Mundo' da ética
pública, que premiasse a nação menos corrupta, o Brasil estaria em maus
lençóis. Em 2011, o País perdeu quatro posições no Índice de Percepção
de Corrupção, desenvolvido pela ONG Transparência Internacional: caiu do
69° para o 73° lugar, entre 182 países pesquisados. Na escala de 0 a
10, levamos nota 3,8, bem abaixo de outros países do continente. O Chile
recebeu nota 7,2 e está no 22° lugar, e o Uruguai, com nota 7, tem a
25° posição.
Para juristas e cientistas políticos reunidos no II Congresso contra a
Corrupção, que ocorre neste sábado, 17, na Câmara Municipal de São
Paulo, é ilusão acreditar que esse cenário será revertido enviando mais
corruptos para a cadeia - pois a chance de isso ocorrer, no Brasil, é
mínima. O caminho para reduzir a impunidade, segundo eles, é criar
mecanismos de mediação e conciliação entre acusados e Ministério Público
(MP), aplicando penas alternativas, como devolução do dinheiro
desviado, perda dos direitos políticos e proibição de sair do País.
"A Justiça brasileira não manda o rico preso. Se o juiz de baixo
manda prender, o do tribunal manda soltar. Não nos iludamos com o
discurso do cadeião", alertou o jurista Luiz Flávio Gomes, membro da
Comissão de Reforma do Código de Processo Penal. Ele se diz "descrente"
com a Justiça brasileira e afirma que só com soluções mais dinâmicas,
como o acordo entre acusação e acusado, será possível punir corruptos
com rapidez e reduzir a sensação de impunidade.
Esse modelo já é utilizado em países como os Estados Unidos, Itália e
Alemanha. Neles, a Promotoria, munida de provas da corrupção, pode
chamar o acusado para uma negociação com o objetivo de ressarcir os
danos ao erário público e aplicar uma pena alternativa. Se o corrupto
concorda, os efeitos são imediatos e o processo é extinto. O Brasil tem
um mecanismo semelhante, chamado "transação penal", mas só para crimes
de menor potencial ofensivo, com pena máxima inferior a dois anos. Para
os juristas reunidos no Congresso, esse caminho precisa ser ampliado.
Gomes cita como exemplo o julgamento do Mensalão, que tramita desde
2007 no Supremo Tribunal Federal e ainda não tem data para terminar. Dos
quarenta réus denunciados pelo Procurador Geral da República, Roberto
Gurgel, apenas um já cumpriu sua pena, beneficiado pela transação penal:
o ex-secretário-geral do PT Sílvio Pereira. Ele fechou um acordo com o
MP pelo qual se comprometeu a prestar 750 horas de serviço comunitário,
se apresentar mensalmente perante um juiz e informar a Justiça sobre
viagens longas ou para fora do País. "Se todos tivessem tido a
possibilidade de acordo, pode ser que há seis anos todos já estivessem
punidos. E hoje estaríamos falando de outros mensalões", disse Gomes.
A jurista Ada Pellegrini Grinover, em vídeo transmitido no Congresso,
reforçou a defesa dos acordos entre o Ministério Público e corruptos.
"É muito melhor que haja uma punição menor, que vai afetar de alguma
forma a vida e a personalidade daquele que aceita a pena, do que a
impunidade que temos hoje", disse.
A reforma do Código de Processo Penal, atualmente em trâmite no
Congresso Nacional, é uma "oportunidade de ouro" para incluir na lei
mecanismos mais céleres de combate à corrupção, segundo o promotor de
Justiça Roberto Tardelli. "Hoje não há vantagem para alguém confessar
seu crime. Só vamos conseguir agilizar os processos se dermos ao
Ministério Público a possibilidade de negociação", disse.
Movimento. O II Congresso contra a Corrupção é
realizado pelo movimento NASRUAS, deflagrado há um ano com o objetivo de
organizar passeatas no dia 7 de setembro de 2011 em diversas cidades do
País. Desde então, o movimento tem articulado entidades e ONGs que
trabalham com o tema da corrupção e organizado congressos com
especialistas para debater e definir propostas de atuação.
Para 2012, o NASRUAS definiu como prioridades a defesa da Lei da
Ficha Limpa, a pressão por maior celeridade no julgamento de casos de
corrupção, a defesa do voto aberto obrigatório no Congresso, o
acompanhamento da evolução patrimonial de gestores públicos e a inclusão
da disciplina "Cidadania, Ética e Ensino Político" na grade curricular
do Ensino Médio.