terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Texto das Cidades Sustentáveis será agenda das eleições


29 de janeiro de 2012 • 23h22 • atualizado em 30 de janeiro de 2012 às 11h37



Ricardo Young

Direto de Porto Alegre
Após 11 anos da realização do 1º Fórum Social Mundial no Rio Grande do Sul realizou-se o primeiro temático, feito inédito na história do evento. Desde o seu início, em contraposição ao Fórum Econômico Mundial de Davos, o Fórum Social caracterizou-se pela diversidade, pluralidade e autogestão. Como protesto a Davos, evento até então fechado e reservado à restrita elite do capitalismo mundial, Porto Alegre logrou trazer para o centro do debate temas excluídos pelos luminares da estratégia neoliberal da globalização.

Anos se passaram e ambos os eventos modificaram-se mutuamente. Gradativamente e de crise em crise, Davos teve de se abrir e criar canais de diálogo com os movimentos sociais e ambientais do planeta. E o Fórum Social percebeu que teria de ir além dos protestos e confraternizações para avançar como espaço de formulação estratégica. Até que as crises climática e financeira a partir de 2006 e 2008, respectivamente, obrigassem a um alinhamento de agendas. Não que os fóruns tivessem se aproximado, isto seria quase impensável, mas ambos tiveram de se debruçar seriamente sobre a crise civilizatória que passamos a viver.

Para a nossa sorte ou azar, a Rio+20 acontecerá no Brasil. Quando a Rio 92 aconteceu, o Brasil era um país recém-saído da ditadura e procurava desesperadamente romper o círculo vicioso de uma economia inflacionária e não competitiva. Ter hospedado a conferência não só foi uma honra mas também uma oportunidade de projetar o País internacionalmente, uma vez que tínhamos muito pouco a exibir. O saldo foi positivíssimo e a Agenda 21, protocolo saído do encontro, balizou as discussões sobre meio ambiente por duas décadas. No entanto, o Brasil só hospedou a conferência e não tinha muitos compromissos em implementar o que ela produziu.

Hoje, a situação mudou radicalmente. Não só o Brasil é um dos principais patrocinadores da conferência como não é mais um país em desenvolvimento. É a sexta economia e detentora das maiores reservas de água e florestas do mundo, para não falar de sua biodiversidade.

É neste contexto que se realizou o Fórum Social Temático. A presidente Dilma, a ministra Isabela Teixeira e a quase totalidade dos secretários estaduais de Meio Ambiente perfilaram-se junto aos mais importantes movimentos socioambientais e personalidades do mundo acadêmico e político para pensar as estratégias que o Brasil deve adotar para tentar, a um tempo, salvar o encontro da apatia e do desânimo generalizado da comunidade internacional e protagonizar a liderança que ensaiou em Copenhague, mas jamais performou de fato.

De positivo temos a adoção da plataforma das Cidades Sustentáveis como a agenda central das eleições deste ano. No sábado todos os secretários estaduais se comprometeram com a plataforma por meio da Carta de Porto Alegre. A ministra Isabela Teixeira afirmou diante da Articulação Política pela Sustentabilidade, com todos os secretários presentes, que a plataforma era a maior contribuição que a sociedade poderia dar para uma agenda de desenvolvimento limpo. A conferir.

Tivemos também um endosso de acadêmicos, pensadores, teólogos e lideranças sociais em torno da mesma plataforma. Leonardo Boff, Frei Beto, Tasso Azevedo, Ladislaw Dowbor, Marina Silva, Nabil Bonduki e Oded Grajew protagonizaram um dos momentos mais emocionantes do fórum diante de quase mil pessoas em um auditório lotado mostrando que a sustentabilidade está saindo do discurso para ações propositivas e para um salto de consciência necessário.

Outros projetos foram bastante discutidos, como o pré-sal, os Jogos Olímpicos e a Copa. O Greenpeace iniciou uma agenda de revisão de um projeto cuja realização não será tão tranqüila quanto o governo havia imaginado - o pré-sal. O Instituto Ethos lidera um grupo de entidades que exige que todas as licitações em torno da Copa e das Olimpíadas sejam transparentes e com controle social, o que vem arrepiando muitos políticos e empreiteiras.

Outro debate que arrebatou os participantes do fórum em Porto Alegre foi o projeto de lei do Código Florestal. O Comitê Brasileiro de Defesa das Florestas promoveu um grande encontro para mostrar que o código como se encontra é um retrocesso nas conquistas ambientais dos últimos 40 anos e instou a presidente a induzir o Congresso a votar a lei apenas nas vésperas da Rio+20, além de usar o seu poder de veto para evitar os desmandos contidos no texto ora em discussão. Por sua vez, Dilma afirmou a um pequeno grupo de líderes de ONGs e entidades que, apesar da negociação, o código não será um código "dos ruralistas".

Marina Silva por sua vez propôs a "desadaptação criativa e a descontinuidade produtiva" como elementos chaves para se romper com os impasses que impedem com que olhemos para uma alternativa sustentável pela ótica de uma nova política. Enfim, a crise capitalista, a justiça social e ambiental sopraram por todos os cantos de uma Porto Alegre quente e ensolarada.

Para quem esperava da fala da Dilma no gigantinho um discurso maiúsculo, se frustrou. Foi uma fala protocolar, apequenada diante do enorme desafio de se fazer da Rio+20 um marco histórico para o Brasil e para a sustentabilidade no mundo.

Todas as sessões do fórum foram precedidas de protestos contra a truculência da desocupação da região conhecida como Pinheirinho, em São Paulo, e o aparente interesse do governo paulista em privilegiar a especulação imobiliária e os credores da massa falida de Naji Nahas. A questão pautou diversos eventos.