29 de janeiro de 2012 • 23h22 • atualizado em 30 de janeiro de 2012 às 11h37
Após 11 anos da realização do 1º Fórum Social Mundial no Rio Grande do Sul realizou-se o primeiro temático, feito inédito na história do evento. Desde o seu início, em contraposição ao Fórum Econômico Mundial de Davos, o Fórum Social caracterizou-se pela diversidade, pluralidade e autogestão. Como protesto a Davos, evento até então fechado e reservado à restrita elite do capitalismo mundial, Porto Alegre logrou trazer para o centro do debate temas excluídos pelos luminares da estratégia neoliberal da globalização.
Anos se passaram e ambos os eventos modificaram-se mutuamente. Gradativamente e de crise em crise, Davos teve de se abrir e criar canais de diálogo com os movimentos sociais e ambientais do planeta. E o Fórum Social percebeu que teria de ir além dos protestos e confraternizações para avançar como espaço de formulação estratégica. Até que as crises climática e financeira a partir de 2006 e 2008, respectivamente, obrigassem a um alinhamento de agendas. Não que os fóruns tivessem se aproximado, isto seria quase impensável, mas ambos tiveram de se debruçar seriamente sobre a crise civilizatória que passamos a viver.
Para a nossa sorte ou azar, a Rio+20 acontecerá no Brasil. Quando a Rio 92 aconteceu, o Brasil era um país recém-saído da ditadura e procurava desesperadamente romper o círculo vicioso de uma economia inflacionária e não competitiva. Ter hospedado a conferência não só foi uma honra mas também uma oportunidade de projetar o País internacionalmente, uma vez que tínhamos muito pouco a exibir. O saldo foi positivíssimo e a Agenda 21, protocolo saído do encontro, balizou as discussões sobre meio ambiente por duas décadas. No entanto, o Brasil só hospedou a conferência e não tinha muitos compromissos em implementar o que ela produziu.
Hoje, a situação mudou radicalmente. Não só o Brasil é um dos principais patrocinadores da conferência como não é mais um país em desenvolvimento. É a sexta economia e detentora das maiores reservas de água e florestas do mundo, para não falar de sua biodiversidade.
É neste contexto que se realizou o Fórum Social Temático. A presidente Dilma, a ministra Isabela Teixeira e a quase totalidade dos secretários estaduais de Meio Ambiente perfilaram-se junto aos mais importantes movimentos socioambientais e personalidades do mundo acadêmico e político para pensar as estratégias que o Brasil deve adotar para tentar, a um tempo, salvar o encontro da apatia e do desânimo generalizado da comunidade internacional e protagonizar a liderança que ensaiou em Copenhague, mas jamais performou de fato.
De positivo temos a adoção da plataforma das Cidades Sustentáveis como a agenda central das eleições deste ano. No sábado todos os secretários estaduais se comprometeram com a plataforma por meio da Carta de Porto Alegre. A ministra Isabela Teixeira afirmou diante da Articulação Política pela Sustentabilidade, com todos os secretários presentes, que a plataforma era a maior contribuição que a sociedade poderia dar para uma agenda de desenvolvimento limpo. A conferir.
Tivemos também um endosso de acadêmicos, pensadores, teólogos e lideranças sociais em torno da mesma plataforma. Leonardo Boff, Frei Beto, Tasso Azevedo, Ladislaw Dowbor, Marina Silva, Nabil Bonduki e Oded Grajew protagonizaram um dos momentos mais emocionantes do fórum diante de quase mil pessoas em um auditório lotado mostrando que a sustentabilidade está saindo do discurso para ações propositivas e para um salto de consciência necessário.
Outros projetos foram bastante discutidos, como o pré-sal, os Jogos Olímpicos e a Copa. O Greenpeace iniciou uma agenda de revisão de um projeto cuja realização não será tão tranqüila quanto o governo havia imaginado - o pré-sal. O Instituto Ethos lidera um grupo de entidades que exige que todas as licitações em torno da Copa e das Olimpíadas sejam transparentes e com controle social, o que vem arrepiando muitos políticos e empreiteiras.
Outro debate que arrebatou os participantes do fórum em Porto Alegre foi o projeto de lei do Código Florestal. O Comitê Brasileiro de Defesa das Florestas promoveu um grande encontro para mostrar que o código como se encontra é um retrocesso nas conquistas ambientais dos últimos 40 anos e instou a presidente a induzir o Congresso a votar a lei apenas nas vésperas da Rio+20, além de usar o seu poder de veto para evitar os desmandos contidos no texto ora em discussão. Por sua vez, Dilma afirmou a um pequeno grupo de líderes de ONGs e entidades que, apesar da negociação, o código não será um código "dos ruralistas".
Marina Silva por sua vez propôs a "desadaptação criativa e a descontinuidade produtiva" como elementos chaves para se romper com os impasses que impedem com que olhemos para uma alternativa sustentável pela ótica de uma nova política. Enfim, a crise capitalista, a justiça social e ambiental sopraram por todos os cantos de uma Porto Alegre quente e ensolarada.
Para quem esperava da fala da Dilma no gigantinho um discurso maiúsculo, se frustrou. Foi uma fala protocolar, apequenada diante do enorme desafio de se fazer da Rio+20 um marco histórico para o Brasil e para a sustentabilidade no mundo.
Todas as sessões do fórum foram precedidas de protestos contra a truculência da desocupação da região conhecida como Pinheirinho, em São Paulo, e o aparente interesse do governo paulista em privilegiar a especulação imobiliária e os credores da massa falida de Naji Nahas. A questão pautou diversos eventos.