Brasil pode instituir pacotes de cigarro genéricos no combate ao fumo
Anvisa defende a adoção de embalagens em que as marcas não sejam diferenciadas por cores ou símbolos, como na Austrália
FREDERICO ROSAS São Paulo 3 JAN 2014 - 16:03 BRST
Maior exportador de tabaco do mundo, o Brasil vai apertar ainda mais o cerco aos seus fumantes. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) passou a defender a adoção de embalagens genéricas para os cigarros, como já acontece na Austrália. Isso levaria à comercialização de pacotes padronizados, em que as marcas não fossem diferenciadas umas das outras por cores ou símbolos.
Para ser oficializada, a proposta precisa ser submetida ao Congresso e, para isso, algum parlamentar deve apresentar um projeto de lei, o que ainda não aconteceu, explicou a Anvisa por e-mail ao EL PAÍS. “Também seria necessário realizar uma consulta pública sobre o tema, o que deve ocorrer”, acrescentou a agência.
Trata-se de mais um passo do governo na cruzada contra o fumo, após a promulgação em 2011 de uma lei federal que o proíbe em locais fechados de acesso público, como restaurantes e bares. A decisão foi tomada após iniciativas similares municipais e estaduais, acompanhando a suspensão da propaganda também em pontos de venda.
E tudo isso sem contar que na Copa do Mundo não se poderá acender um cigarro sequer nas arquibancadas dos 12 estádios que servirão de palco para o torneio, segundo a Fifa.
No último dia 27 de dezembro, a presidenta Dilma Rousseff sancionou sem vetos uma lei que proíbe a fabricação, comercialização, distribuição e a propaganda de produtos nacionais e importados que imitem a forma de cigarros ou similares destinados ao público infanto-juvenil.
O país também tem um debate aberto sobre as substâncias adicionadas ao tabaco para o seu consumo. Um grupo de oito pesquisadores (cinco procedentes de universidades brasileiras e três de centros acadêmicos estrangeiros) avaliará 121 aditivos atualmente permitidos, que o setor classifica como essenciais ao processo de produção.
Segundo a Anvisa, cerca de 600 aditivos podem ser utilizados no processo de fabricação de cigarros e outros produtos derivados do tabaco. O cigarro teria 10% de sua massa composta por aditivos. Tratam-se de "substâncias adicionadas intencionalmente nos produtos derivados do tabaco para mascarar o gosto ruim da nicotina, disfarçar o cheiro desagradável, reduzir a porção visível da fumaça e diminuir a irritabilidade da fumaça para os não fumantes", explica a agência em seu site.
O governo também aposta que o aumento dos impostos reduzirá o número de fumantes no país, que tem aproximadamente 20 milhões de fumantes, mais de 500 mil deles adolescentes. Um estudo divulgado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) em 2013 revelou que o número de fumantes caiu 20% nos últimos seis anos. Cerca de 200.000 brasileiros morrem todos os anos em decorrência do tabagismo.
Aproximadamente 30% dos cigarros comercializados no país são provenientes do mercado ilegal. O Brasil é o maior exportador mundial de tabaco desde 1993 e o segundo maior produtor, atrás apenas da China, segundo dados do Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (SindiTabaco). O produto tem prevalência sobretudo nos três estados da região Sul do país (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná), que respondem por mais de 90% da produção nacional.
A União Europeia foi o principal mercado da safra brasileira de 2011/2012, com 40% do total dos embarques em 2012. Nesse ano, o Brasil bateu seu recorde em exportações de tabaco, com 3,26 bilhões de dólares em divisas do produto, embarcado para 100 países, ainda de acordo com o SindiTabaco.
Menos atraente
- Objetivo. A luta contra o tabagismo liderada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) tem como um de seus objetivos tornar o produto menos atraente, sobretudo para os jovens. Nesse âmbito se encaixam as regulamentações sobre as embalagens, cada vez mais restritivas.
- Austrália. O país é o que mais longe chegou na regulamentação. Em 2011 aprovou una normativa para que todos os pacotes de cigarros tivessem a mesma cor (cáqui) e o desenho. À frente, com muito destaque, aparece a foto com os danos causados pelo tabaco, e na parte superior ficam as mensagens sanitárias. Mas a grande novidade é que se proíbe o uso de cores ou tipografias de marca: em uma faixa estreita abaixo é colocado o nome do fabricante e a variedade do produto, mas com um tipo único de letra que impede que cada empresa se diferencie do resto. A indústria de tabaco australiana batalharam legalmente contra a restrição, mas em agosto de 2012 o Supremo do país deu razão ao governo.
- UE. A União Europeia (pelo menos suas autoridades de saúde) vê com simpatia a política australiana, mas ainda não se decidiu pela sua implantação. No entanto, há países nos quais se pode fumar em lugares fechados (algumas regiões da Alemanha, por exemplo). O paso mais ambicioso foi a proibição de classificações como light, que poderiam fazer pensar que se tratasse de um produto menos perigoso. As desagradáveis fotografias tampouco são obrigatórias em todos os países.
- Reino Unido. Defendeu o modelo australiano, mas não chegou a implantá-lo.
- Estados Unidos. Na América do Norte a discussão está em outro nível: no entanto, a indústria discute se deve inserir mensagens sobre os danos causados pelo tabaco ou as imagens sobre seus estragos na saúde. Alegam que vai contra sua liberdade de expressão e de mercado.