Para ambientalistas, novo Código Florestal mantém anistia a desmatador
29 de maio de 2012 | 3h 02
EDUARDO BRESCIANI / BRASÍLIA, GIOVANA GIRARDI - O
Estado de S.Paulo
O Comitê Brasil em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável, que
reúne 163 entidades, classificou como "retrocesso ambiental" a sanção do novo
Código Florestal, com 12 vetos e a edição de uma medida provisória. Para as
entidades, a nova legislação assinada pela presidente Dilma Rousseff continua
promovendo anistia a desmatadores - ao contrário do que diz o governo - e reduz
a proteção ambiental.
Na visão dos ambientalistas, o texto não atende aos compromissos de campanha
da presidente. Eles refutam o discurso de que foi buscado um meio-termo entre as
posições de ambientalistas e ruralistas. "O caminho do meio entre não tomar
veneno e tomar muito é veneno do mesmo jeito. Essa proposta é venenosa", afirmou
Pedro Gontijo, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Para o grupo, um dos principais problemas - que já existia desde o texto do
Senado - é a possibilidade de fazer uma recomposição menor de Áreas de
Preservação Permanente (APPs) para trechos desmatados até julho de 2008.
Dilma vetou o polêmico artigo 61, que no texto da Câmara estabelecia a
recuperação de somente 15 metros de mata ciliar em rios de até 10 metros,
excluindo rios maiores. A MP coloca que todo mundo agora é obrigado a recuperar
e criou várias faixas de recomposição, de acordo com o tamanho da propriedade
(mais informações neste página).
Mas essa obrigação agora vai de no mínimo 5 metros a no máximo 100 metros de
margens de rios, contra uma faixa que variava de 30 a 500 metros no Código
antigo. "Anistia não é só de multa, mas também fazer uma compensação menor",
afirma André Lima, consultor jurídico da SOS Mata Atlântica e do Instituto de
Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).
Para Márcio Astrini, do Greenpeace, a mudança "facilitou a vida dos pequenos
produtores e de agricultura familiar por uma via torta, que é a métrica do
módulo fiscal, e não por uma precedência social". Ele defende que melhor seria
se tivessem sido previstos subsídios para a recuperação. "Se eles não têm
dinheiro para recompor 15 metros, não vão ter também para 5 metros."
Ele questionou também que continua valendo, de acordo com o artigo 12, a
possibilidade de diminuir o tamanho da Reserva Legal no Amapá de 80% para 50%, o
que abriria a possibilidade de novos desmatamentos
Houve queixas, ainda, sobre a possibilidade de fazer recomposição de APPs com
espécies exóticas. "É um desvirtuamento do conceito de APP. Basta plantar
eucaliptos, parreiras, macieiras em todas as APPs", disse Lima. "Nem a bancada
ruralista teve coragem de colocar isso no texto. Esse trecho é da lavra de
Dilma", complementou Raul Valle, do Instituto Socioambiental.
O Estado apurou, porém, que deve ser publicada hoje uma errata definindo que
a recomposição com exóticas deve ficar restrita a propriedades de até 4 módulos
fiscais e a nascentes perenes.
Valle destacou que foram sancionados vários pontos de interesse da bancada
ruralista e no Congresso esses parlamentares poderão ainda fazer alterações na
medida provisória. Na visão das entidades, o fato de essa discussão só ocorrer
depois da Rio+20, e em meio a eleições municipais, torna mais difícil obter
avanços. Mas eles esperam que o evento sirva para pressionar o governo a
promover uma mudança mais profunda.
Visão da ciência. Para cientistas que engrossaram as críticas às mudanças do
Congresso e colaboraram com pesquisas para mostrar a importância da manutenção
da vegetação, a proposta de Dilma, apesar de ficar aquém do defendido, traz
avanços. "Ao menos se conseguir implementar, já será um grande ganho", diz
Ricardo Rodrigues, da Esalq, em menção ao fato de que o Código antigo, apesar de
proteger mais o ambiente, não era seguido.
Para Gerd Sparovek, também da Esalq, houve progressos no aumento da área de
APPs ripárias que deve ser recuperada nas propriedades maiores, que representam
76% da área agrícola. "Mas algumas faixas de restauração ficaram muito pequenas
(5m e 8m), o que torna questionável sua relevância ecológica. E ainda fica o
custo, pelo menos parcial. Os topos de morro ficaram fora de critérios objetivos
de necessidade de restauração, ficando possível a consolidação dos usos
agrícolas existentes."