O nuclear "deve continuar afastado"
O Secretário de Estado do Ambiente e do Ordenamento do  Território, Pedro Afonso de Paulo, afirma que "o nuclear é uma  opção que deve continuar afastada". As suas apostas são outras, designadamente  rever planos e leis do Ambiente e do Ordenamento do  Território. Para a semana deverá anunciar o diploma que dá mais  poderes de intervenção aos nadadores salvadores e à polícia marítima em praias  com zonas de risco. 
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Carla Tomás (texto) e Tiago Miranda  (fotos) 
 9:00 Sábado,  4 de fevereiro de 2012                   | 
    O secretário de Estado  não considera o Ambiente como o parente pobre do Governo  
O Ambiente é o parente pobre deste Governo?
Não sinto  isso dentro do Governo. Não há nenhuma política estrutural do anterior Governo  que tenhamos abandonado. Nalguns casos podemos ter feito compassos de espera,  mas para calibrar, não para tirar prioridade. Temos muitos desafios. Talvez a  área agrícola tenha mais feiras e pequenas iniciativas, mas não é pelo número  que se contam as prioridades deste ministério. É pela substância.
O lóbi do nuclear está de novo ativo. O que pensa da  proposta de se construir uma central nuclear em Portugal?
Em relação ao  nuclear devemos ter princípios de prudência e de precaução. São risco que não  dominamos e não temos inteira noção das suas consequências. É uma opção que deve  continuar afastada da nossa planificação energética. Na nossa agenda temos como  prioridades a apresentação do Roteiro de Baixo Carbono e a revisão do Plano de  Combate às Alterações Climáticas, que vamos fazer em 2012. São questões  complementares com a política energética e a eficiência energética.
Ao fim de sete meses de Governo conseguiram finalmente  arrumar a casa?
Sim. Não  é um trabalho terminado quer na área do  Ambiente quer na do Ordenamento do Território. Mais do que uma operação de  cosmética ou de restruturação financeira queríamos ter uma Agência do Ambiente  (APA) igual às suas congéneres europeias e estamos contentes com o resultado.  Procurámos obter coerência, eficiência e eficácia.
| No Ministério (MAMAOT) só se bebe água da torneira em garrafas com rótulo da casa | 
Pode dar-me um exemplo dessa eficiência e eficácia?
A  curto prazo vai surgir um balcão único de licenciamento ambiental que permite  maior eficiência e eficácia. Vai funcionar na sede da APA e vamos implementar  uma plataforma tecnológica para que as pessoas possam submeter os seus problemas  em todos os lugares em que existem organismos do Ministério.
Com a fusão de várias direções-gerais e de outros organismos  na APA, esta entidade passou a ser dona de obra - cabendo-lhe, por exemplo,  várias tarefas do extinto Instituto da Água (INAG), entre as quais fazer  barragens - e é simultaneamente responsável pela avaliação de impacte ambiental  dessa obra. Não há aqui um conflito de interesses?
O exemplo que colocou  é paradigmático. O Estado não pode ser licenciador, construtor e fiscalizador,  porque deixa de saber qual é o seu lugar. Como autoridade de segurança de  barragens e como autoridade ambiental não deve competir à APA fazer barragens,  aliás como não deve gerir o sistema de fins múltiplos que tem. Nós pretendemos  concessionar aos utilizadores estes empreendimentos de fins múltiplos. Não  estamos preocupados em obter proveito, mas os utilizadores podem usufruir desde  que paguem a manutenção das infraestruturas. Liberta-se o Estado para o  licenciamento e a fiscalização. A futura Agência do Ambiente não vai fazer  barragens.
Porque não voltaram atrás com o plano nacional de  barragens?Praticamente todas as decisões relativas a essa matéria já estavam  tomadas antes do início deste Governo. Não é uma questão do Ministério do  Ambiente. A ser repensada, só o seria no seio do Governo. 
Carlos Pimenta, Luisa Schmidt e Viriato Soromenho Marques a ajudar
| Revisão da Reserva Ecológica Nacional continua em estudo | 
Quais são as  suas prioridades?
No esforço de simplificação e para não termos  demasiados instrumentos legislativos, entendemos que o ideal seria juntar na  mesma Lei de Bases o ordenamento do território e os solos. Os solos são um pilar  fundamental da política de ordenamento, no sentido de conter perímetros urbanos,  de desincentivar a construção nova e de combater a especulação. Também iniciámos  o processo de revisão da Lei de Bases do Ambiente e nomeámos uma comissão  científica, que nos dá muito prazer anunciar, já que dela fazem parte Viriato  Soromenho Marques, Luísa Schmidt e Carlos Pimenta. Teremos a primeira reunião de  trabalho a 9 de fevereiro. Também vamos anunciar a equipa que vai trabalhar na  comissão para a revisão dos instrumentos territoriais e que vai ser presidida  por Biencard Cruz. Queremos um modelo de ordenamento que tenha coerência e sem  contradições.
Vivemos uma conjuntura económica que é favorável a apostar  mais na reabilitação que na construção nova. Isso facilita o trabalho?
Justamente. Temos a oportunidade gerada pelo momento económico. Precisamos  de melhor investimento e de maior eficiência. A gestão dos solos pode ser um  pilar para um desenvolvimento mais sustentável, para nos tornarmos um país mais  europeu. Nós temos 10% de reabilitação e 90% de construção nova e noutros países  é o contrário.
Então e qual a percentagem que propõem para a reabilitação?  Inverter a situação atual?
Não podemos ser demagógicos. Com os corretos  instrumentos no lugar certo e o regime da reabilitação revisto, podemos começar  a caminhar para isso. Há outras políticas de sustentabilidade que também derivam  de termos mais reabilitação que construção. Por exemplo, a reabilitação não  consome tantos recursos como a construção; contribui para eficiência energética  e permite que o país deixe de importar outras fontes de energia. Se contivermos  os perímetros urbanos temos menos emissões, pois temos menos movimentos  pendulares e é bom para combater as alterações climáticas.
Uma das questões levantadas na revisão da lei de solos é a  das mais-valias que vão parar aos bolsos privados quando o Estado converte um  solo rural em urbano. A ideia é passar essas mais-valias parar os cofres do  Estado?
É claro para este Governo que a tributação da transformação do  solo é algo fundamental para a correta gestão dos solos. Também podemos  diferenciar a tributação em função da qualidade dos solos.
Espanha tem os seus planos de bacia hidrográfica concluídos.  Os nossos estão agora a entrar em discussão pública. O acordo entre Lisboa e  Madrid visa uma maior concertação na elaboração destes planos que gerem os rios  internacionais, mas isso não tem acontecido. O que têm feito para corrigir esta  situação?
Tem existido troca de informações. Vamos tentar fazer o  máximo esforço diplomático, de modo a não sairmos a perder. Os planos estão em  discussão pública. Já os devíamos ter entregue em 2009.  O próximo ciclo  será o de um único plano de bacias para os dois países.
Plano do litoral tem taxa de execução de 17%
| "É um desafio estar à frente desta Secretaria de Estado" | 
Como estamos  em termos de execução dos planos de ação para o litoral?
O plano de ação  para o litoral, que termina em 2013, tem uma taxa de execução financeira de 17%.  De €480 milhões estão executados €84 milhões. Seria impossível cumprir aquele  plano.
A que se deve uma tão baixa taxa de execução?
A  várias razões: ao facto de haver competências dispersas por várias entidades e à  dificuldades de financiamento. Não pretendemos aprovar mais nenhum plano sem ter  um capítulo a avaliá-lo e métricas da eficácia da sua implementação.
Os quase €500 milhões destinavam-se a obras de  requalificação da costa, obras de emergência devido a erosão de arribas e aos  Polis do Litoral (que abarcavam grande fatia). O que acontece a esse dinheiro  que conta com verbas do QREN?
O dinheiro não se perde. Se não se  concretiza naquilo, concretiza-se noutra questão qualquer.
Então esse dinheiro vai ser desviado para outras áreas?
Não pode pôr as coisas dessa forma. O plano do litoral era uma intenção de  programação e o que pretendemos fazer agora é uma nova intenção de programação.  Todas as candidaturas que estavam aprovadas foram executadas. Algumas já nesta  vigência. Nós não deixamos de fazer as obras de emergência  e continuamos a  monitorizar muitos locais. Agora, o que queremos é fazer de forma estrutural.  Nunca tivemos um verdadeiro estudo sobre os impactos das alterações climáticas  no litoral e sobre as dinâmicas costeiras e temos de o fazer, eventualmente com  recurso ao fundo EFTA, para identificarmos onde há riscos e transpor esses  riscos para o planeamento do território. Podemos aproveitar estudos já antigos e  transmitir o resultado deles para os planos da orla costeira e do ordenamento do  território, olhando para a costa como um todo. Queremos concentrar as obras  marítimas onde existe risco para pessoas e bens.
Que outras medidas têm preparadas para o litoral?
Para a semana vamos anunciar um novo diploma que visa dar autoridade à  policia marítima e aos nadadores salvadores para poderem evitar a permanência de  pessoas nas zonas de perigo. Até aqui era só para as zona interditas. E não  estou só a falar de arribas em risco, mas também de águas estagnadas, ou de  ribeiras na praia. Queremos incentivar o uso da praia o ano inteiro. Mas temos  de ter um uso adequado. Não podemos intervir em todas as arribas e não é só por  uma questão financeira. Não queremos que as nossas praias sejam iguais a taludes  das nossas autoestradas com ancoragens em betão e redes metálicas.
Quais são as suas ideias para a revisão do regime de Reserva  Ecológica Nacional (REN)?
Mais do que alterar o regime da REN, queremos  dar coerência entre vários regimes sem termos de fazer a mesma coisa duas ou  três vezes. A REN define zonas de cheia e os planos de bacia também.
Vão acabar com a REN?
Não necessariamente. Vamos é  criar um diploma coerente que possa endereçar vários riscos como o de cheia, o  de sismos ou o de incêndios florestais e vá buscar informação aos planos que  fazem a gestão desse risco, nomeadamente aos planos de bacia no que respeita ao  conceito de leito de cheia. Temos de articular conceitos e não extinguir  conceitos. Não gostava que saísse a ideia que queremos extinguir a REN. Os  valores protegidos pela REN vão continuar a ser protegidos noutro instrumento de  igual valor e igual eficácia.
Em relação ao cadastro da propriedade, também colocaram de  lado o modelo que tinha sido proposto pelo Governo anterior por o considerarem  caro e moroso. Qual é o vosso modelo para o cadastro?
Recebemos um  projeto piloto para fazer o cadastro em sete concelhos, mas sem dotação  orçamental e com uma candidatura ao QREN mal instruída, porque não assegurava a  comparticipação nacional. Resolvemos esses problemas e esse projeto, que envolve  quase €24 milhões, vai continuar. Mas, com 308 municípios é fácil extrapolar que  fazer o mesmo para todo o país custaria mil milhões de euros e levaria uns 30  anos. Seria difícil levar a bom porto. Em fevereiro deve ser aprovada uma  resolução em Conselho de Ministros que pretende concentrar a informação  cadastral dispersa em vários ministérios e criar um grupo de trabalho que junta  o Ambiente, a Justiça e as Finanças. Não temos que iniciar o projeto de registo  cadastral do zero, de Sagres a Vila Real. Temos de atuar em puzzle, como fizeram  em Espanha, completando a informação de diferentes fontes e usando as mesmas  nomenclaturas.
Quanto tempo poderá demorar?
Um ano serve para  iniciar o registo cadastral obrigatório de algumas operações, como a dos planos  urbanísticos. Depois é seguir a lógica de encher o puzzle com a ajuda das zonas  de intervenção florestal (ZIF) e dos bancos de terra. Espanha fez a espinha  dorsal do cadastro em sete ou oito anos.
O Plano Estratégico de Transportes (PET) vai em contraciclo  com as políticas de diminuição de emissões de GEE, já que os aumentos de tarifas  ou o corte de carreiras não fomentam o uso de transportes coletivos. O que pensa  do PET?
Não vou comentar a política de transportes. Seria uma descortesia  para com o meu colega. Em termos do leilão de emissões, por exemplo, já  sinalizei aos meus colegas da energia e dos transportes que via como uma  política estruturante e boa do ponto de vista ambiental que uma parte dessas  verbas fosse para a mobilidade pública, seja para autocarros elétricos ou  ligeiros elétricos.
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