Decisões para o amianto e para os transgênicos
06 de janeiro de 2012 | 3h 06
Washington Novaes, jornalista. E-mail: 
wlrnovaes@uol.com.br - O Estado de S.Paulo
Dois temas importantes para a economia e a saúde no Brasil - banimento (ou 
não) do amianto e do plantio de alimentos transgênicos no Brasil - parecem 
aproximar-se de decisões neste começo de ano.
No caso do amianto, a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou ao 
Supremo Tribunal Federal parecer em que pede a declaração de 
inconstitucionalidade da Lei n.º 9.055/95, que permite a exploração, utilização 
industrial e comercialização do produto. Com base nela, muitos Estados permitem 
esse uso. Cinco outros - São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, 
Pernambuco e Mato Grosso - têm legislações que o restringem. A União Europeia 
proibiu a utilização desde 2005. Chile, Argentina e Uruguai já o baniram.
Diz a PGR que "uma infinidade" de documentos nacionais e internacionais "já 
avaliaram que todas as formas desse mineral provocam câncer e outras doenças", 
todas progressivas, que levam à morte. Segundo o documento, "não há índice de 
exposição segura ao amianto". Tanto assim que a Organização Internacional do 
Trabalho (OIT), em convenção, prevê eliminá-lo, total ou parcialmente, pois o 
responsabiliza por 100 mil mortes a cada ano - 65 países já o baniram. No 
Brasil, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) reconhece a sua 
periculosidade.
Também a Organização Mundial de Saúde (OMS) afirmou, no ano passado, que 
todas as formas de asbesto (inclusive a crisotila, produzida no Brasil) são 
"cancerígenas para o ser humano". E a exposição a elas também pode provocar 
asbestose (forma de fibroma pulmonar), placas e derrames pleurais. O Instituto 
Nacional do Câncer relaciona ao amianto (aí incluída a crisotila) maior 
incidência de câncer pulmonar, mesoteliomas pleurais e peritoniais, câncer da 
laringe e outras doenças.
Na Câmara dos Deputados brasileira, a Comissão de Meio Ambiente e 
Desenvolvimento sustentável recomenda a eliminação, citando o número anual de 
mortes na Grã-Bretanha (3.500), nos Estados Unidos (10 mil) e na Austrália (23 
mil). Essa recomendação é avalizada por documentos da nossa Previdência Social e 
do Ministério da Saúde - além de uma lei do Estado de São Paulo.
Já existem substitutos para o amianto nos vários mercados nacionais, 
utilizados principalmente na construção. Resta um problema econômico-social, que 
o autor destas linhas já enfatizou em várias oportunidades neste espaço -, que é 
o de uma região de Goiás (Minaçu), onde se encontra a unidade industrial de 
extração e venda do amianto crisotila. Quase toda a cidade e a região dependem - 
na ocupação da mão de obra, no transporte, na alimentação, no processamento, 
etc. - dessa atividade. E é preciso formular e executar planos alternativos para 
o momento em que se efetive (se ocorrer) a decisão de banir qualquer uso no 
País. Os argumentos em defesa do amianto crisotila - que não seria prejudicial à 
saúde, ao contrário do outro - já foram derrubados por numerosos pareceres da 
ciência em todo o mundo e por decisões judiciais em dezenas de países.
No caso dos alimentos transgênicos, o panorama é o inverso. Em muitos países 
estão sendo feitos questionamentos ao plantio desse tipo de alimento. Mas no 
Brasil se caminha na direção oposta.
Desde que se iniciou o plantio de variedades transgênicas no País - soja, 
milho -, os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente reivindicaram, na Comissão 
Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), que autoriza ou não o uso de 
processos biotecnológicos, que as autorizações fossem precedidas de estudos de 
impacto ambiental - para verificar a possibilidade de contaminação e prejuízos à 
biodiversidade em áreas vizinhas, de um lado, e de estudos epidemiológicos sobre 
problemas para a saúde do consumidor, de outro. Foram invariavelmente vencidos, 
com o argumento de que se trata de "postura ideológica", que "se contrapõe à 
visão científica". Ou seja, atribuindo à primeira, que pede estudos científicos, 
uma visão ideológica e à segunda, que dispensa estudos científicos, uma "visão 
científica". Embora isso desrespeite também convenção internacional, de que o 
Brasil é signatário, que consagra a necessidade de se ater ao princípio da 
precaução sempre que houver qualquer possibilidade de ameaça à 
biodiversidade.
Apesar de todos esses argumentos, com o avanço dos transgênicos no País, uma 
resolução normativa da CTNBio autoriza as empresas produtoras de sementes 
transgênicas a pedir isenção de monitoramento no plantio, depois de liberado 
comercialmente. Segundo o agrônomo Gabriel Fernandes, "está em curso um processo 
de desmanche das regras de biossegurança no País" - embora uma resolução da 
própria Casa Civil da Presidência da República, em 2008, tenha recomendado que 
se instalasse um grupo de trabalho (nunca efetivado) para estudar o controle dos 
transgênicos.
Estamos, nesse terreno, na contramão de boa parte do mundo. A Hungria há 
poucos meses decidiu impedir o plantio de sementes transgênicas. A União 
Europeia prepara resolução para proibir a importação de carne de animais 
clonados. A própria Agência Ambiental dos EUA (onde 94% da soja é transgênica, 
assim como 70% do milho e do algodão) pediu (The Wall Street Journal, 22/11) às 
empresas produtoras de sementes de milho transgênico resistentes à lagarta de 
raiz que revejam suas técnicas de monitoramento, porque as sementes parecem 
estar perdendo eficácia diante de certas lagartas, nos Estados de Iowa, 
Illinois, Minnesota e Nebraska. Na França, uma Corte de Justiça derrubou decisão 
que proibia o plantio de milho transgênico. Mas o presidente Sarkozy já disse 
que o governo está preparando uma nova "cláusula de segurança" para proibir o 
plantio desse tipo de milho (AS-PTA, 2/12). De qualquer forma, seis outros 
países mantêm a mesma restrição: Alemanha, Áustria, Bulgária, Grécia, Hungria e 
Luxemburgo.
Não se trata de ser contra ou a favor de transgênicos. Trata-se de respeitar 
o princípio da precaução, em respeito à biodiversidade. E de promover estudos 
epidemiológicos que digam se há ou não riscos para o consumidor.
 
