São Paulo, quinta-feira, 14 de julho de 2011
Ela telefonou para representante da empresa para relatar reunião da OMS no Uruguai vetada à indústria do tabaco
A própria funcionária admitiu ligações em documento no qual pede ressarcimento pelos gastos telefônicos
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1407201111.htm
autoria: MARIO CESAR CARVALHO
DE SÃO PAULO
Uma funcionária do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior desrespeitou uma das normas da OMS (Organização Mundial da Saúde) ao participar de uma reunião internacional em que se discutia formas de reduzir o consumo de tabaco, segundo uma entidade antitabagista.Ela ligou para a Souza Cruz para relatar o conteúdo do encontro da OMS, de acordo com a própria funcionária.A reunião era sobre a Convenção Quadro para o Controle do Tabaco, o primeiro tratado internacional sobre saúde, assinado por 194 países. O objetivo do encontro era evitar que interesses comerciais minassem o acordo.A convenção proíbe a participação da indústria nos encontros. Também obriga os participantes a se comprometerem a não revelar o teor das reuniões para os fabricantes.O veto à indústria tem uma razão histórica. As fábricas de cigarro fraudaram e manipularam as informações sobre o fumo durante mais de 50 anos, segundo a OMS.No ano passado, num encontro em Genebra, representantes da indústria foram expulsos de um encontro.
A funcionária, chamada Rita de Cássia Milagres, é coordenadora-geral de agronegócios do ministério -a pasta participa dos encontros porque tem interesse na exportação de fumo."Ela contou para a indústria informações que não poderiam passar. E sabia que isso é proibido por uma convenção internacional. É espionagem", diz Paula Johns, coordenadora da ACT (Aliança do Controle do Tabagismo).O deputado federal Luiz Carlos Heinze (PP-RS), considerado um dos mais ativos parlamentares da bancada do fumo, também recebeu chamadas de Rita.A própria funcionária mencionou as conversas com a indústria do tabaco ao pedir que o governo pagasse o custo das ligações, feitas de Montevidéu, no Uruguai, onde ocorreu uma das reuniões da Convenção Quadro, em novembro de 2010. As ligações para Heinze e para a Souza Cruz custaram R$ 161,11.Num documento em que explica por que tem de ser ressarcida, Rita diz: "Vale ressaltar que o pedido de roaming flex foi solicitado visando atender a indústria do tabaco, impossibilitada de participar da referida reunião".A funcionária estava na reunião porque representa o ministério na Comissão Nacional de Implementação da Convenção Quadro no Brasil.A interlocutora dela na Souza Cruz, também citada no documento, é Ana Maria Carneiro, gerente de relações governamentais em Brasília.Em conversa relâmpago com a Folha, ela disse: "Nós temos interlocutores com o Ministério da Indústria. Isso não é espionagem". Ao ser questionada sobre as ligações do Uruguai, mudou de tom: "Não tenho autorização para falar". E desligou.