Estacionamento-parque: qualificação paisagística
fonte: http://www.revistatechne.com.br/Edicoes/116/artigo35396-1.asp
Autores: Ricardo de Sousa Moretti PUC Campinas ricardo.moretti@ajato.com.br e Nelia Miyuki Nishihata PUC Campinas nelianishihata@gmail.com
Figuras 1 e 2 - Estacionamento com piso permeável e uso intensivo
de vegetação, em pousada na cidade de Pirenópolis (GO)
Identificam-se boas perspectivas de aperfeiçoamento do projeto  dos estacionamentos de veículos, em especial quanto à implantação dos  "estacionamentos- parque", com uso intensivo de arborização e parte  significativa de área permeável. Esse tipo de estacionamento associa a  possibilidade de redução de custos, pois a pavimentação e o sistema de  captação e condução das águas pluviais constituem usualmente os itens de  maior impacto na composição dos custos totais das obras de urbanização e  infra-estrutura, em especial nos empreendimentos destinados ao uso  residencial. Por outro lado, são possíveis soluções de forte potencial  paisagístico, que tornam mais agradáveis os estacionamentos e agregam  valor aos imóveis. Finalmente, os estacionamentos com pisos permeáveis e  uso intensivo de vegetação podem trazer uma contribuição em  sustentabilidade, com ênfase na prevenção das enchentes, redução das  ilhas de calor, recarga dos aqüíferos subterrâneos e manutenção das  vazões dos cursos d'água nas épocas de seca.
       
As áreas impermeabilizadas para execução de estacionamentos  representam parcela expressiva do total de áreas impermeabilizadas de um  empreendimento. Em projetos de prédios sem elevador, com estacionamento  descoberto, a impermeabilização do solo para esse fim resulta em áreas  que chegam a ser 40% superiores àquelas necessárias para a produção da  edificação. Alguns municípios já incorporaram exigências relativas à  utilização de pisos permeáveis em estacionamentos, como no caso de São  Paulo e restrições de vazões decorrentes da implantação de novos  empreendimentos, como nos casos de Porto Alegre e Curitiba.
Figura 3 - Infiltração das águas pluviais captadas nos locais
impermeáveis do estacionamento através de camadas
drenantes situadas entre as vagas
A utilização intensiva de vegetação e arborização associada aos pisos permeáveis nos estacionamentos vem ao encontro do atendimento das exigências legais que, gradativamente, deverão ser regulamentadas por um número crescente de municípios. Pretendese apresentar, neste artigo, os potenciais de incorporação desses conceitos na melhoria das condições paisagísticas do empreendimento.
Estacionamentos nos grandes empreendimentos
Figura 4 - Estacionamento de automóveis em campus universitário,
no município de Campinas, com predomínio das superfícies
pavimentadas
Pode-se reduzir significativamente o total de áreas  impermeabilizadas nos estacionamentos de grande porte sem  comprometimento significativo do conforto do usuário. A utilização de  pisos que permitem a infiltração de água de chuva é especialmente  promissora nas áreas em que ficam estacionados os veículos. Mesmo que se  pavimentem as áreas em que circulam os veículos, a mescla de áreas  impermeáveis com permeáveis possibilita que, em alguns casos, seja  possível inclusive suprimir as canalizações de água pluvial. Nos casos  em que se prevê dificuldade para infiltrar toda a água de chuva nas  áreas permeáveis, pode-se recorrer às estruturas de infiltração  subterrânea, como exemplo, às trincheiras drenantes ou às camadas  drenantes na forma de colchões (vide figura 3).
Ao reduzir as áreas impermeáveis melhora-se a condição de  desenvolvimento da vegetação, que por sua vez contribui para a retenção  da água de chuva antes que a mesma atinja o solo. Tem-se a possibilidade  de fugir do círculo vicioso de impermeabilização,drenagem, ilhas de  calor e de pequeno desenvolvimento da vegetação, para uma outra condição  que favorece o desenvolvimento da vegetação, que por seu turno,  contribui para a retenção e infiltração da água de chuva precipitada.
Figura 5 - Projeto geométrico de um setor do estacionamento do
shopping - situação atual
Figura 6 - Estacionamento do shopping - alternativa de projeto 1.
Mantém-se a disposição geométrica original e apenas substitui-se
o pavimento impermeável existente nas vagas de parada, por um
pavimento permeável
Estudo de caso - Estacionamento de shopping
 
 
Figura 7 - Estacionamento do shopping - alternativa de projeto 2.
 
 
Figura 11 - Estacionamento do campus universitário - alternativa de
 
 
Figura 12 - Estacionamento do campus universitário - alternativa de
 
 
Figura 14 - Estacionamento do campus universitário - alternativa de
 
 
Figura 20 - Pavimento permeável, em que a água infiltrada
Figura 6 - Estacionamento do shopping - alternativa de projeto 1.
Mantém-se a disposição geométrica original e apenas substitui-se
o pavimento impermeável existente nas vagas de parada, por um
pavimento permeável
Para dois estacionamentos de grande porte  já implantados no município de Campinas (SP), apresentamse e comparam-se  alternativas de projeto que buscam incorporar os conceitos de piso  permeável e de utilização intensiva de vegetação. O primeiro deles é um  setor do estacionamento de um shopping situado junto à Rodovia Dom  Pedro, que abriga 1.550 vagas.O segundo,para 384 veículos,está em um  campus universitário, situado junto à mesma rodovia (vide figura 4).
Estudo de caso - Estacionamento de shopping
Figura 7 - Estacionamento do shopping - alternativa de projeto 2.
São criadas circulações exclusivas para pedestres 
 
     
 
 
Figura 8 - Estacionamento do shopping - situação atual

Figura 9 - Estacionamento do shopping - alternativa de projeto 2
Estudo de caso - estacionamento de campus universitário
 
 
Figura 10 - Projeto geométrico de estacionamento; campus
No projeto geométrico mostrado na figura 5 as vagas foram  dispostas ortogonalmente às vias de circulação de veículos. Tanto a via  de circulação, que tem largura de 6 m, quanto o local para  estacionamento (cada vaga tem 2,4 x 5,0 m) são pavimentados. Não são  previstas calçadas para circulação de pedestres, que se deslocam na  própria via de veículos. O arranjo geométrico tem como proposta central  maximizar o número de vagas.As águas pluviais são captadas em  bocas-de-leão e conduzidas por tubulações subterrâneas para o ribeirão,  situado imediatamente junto ao terreno do shopping.Para esse  estacionamento é apresentada a proposta geométrica alternativa 1, que é  apresentada na figura 6, em que se mantém a mesma disposição geométrica,  porém altera-se o piso no local de parada dos veículos. O mesmo número  de vagas é mantido nessa proposta,porém não se equaciona o problema  anteriormente apontado de circulação de pedestres na mesma área  destinada para circulação de veículos.
Na alternativa de projeto 2, apresentada na figura 7, são criadas  áreas para circulação exclusiva de pedestres, que melhoram as condições  de conforto e de segurança. Essas vias de pedestres, em alguns pontos,  circulam entre bosques. Na concepção proposta, alguns desses bosques  receberiam a denominação da espécie arbórea predominante. Na proposta  geométrica buscou- se assegurar que seja mínima a distância percorrida  pelo pedestre até uma superfície calçada com material contínuo,  impermeável, de forma a evitar os incômodos associados à circulação  sobre piso permeável.
Verifica-se que é possível reduzir a menos da metade a área  impermeabilizada, praticamente sem redução do número de vagas de  estacionamento.Com relação ao conforto, deve ser levado em conta, por um  lado, o aspecto positivo de estacionar na sombra e de caminhar em uma  área arborizada. Por outro lado, existe o desconforto do pedestre  transitar sobre piso permeável, que foi minimizado pela pequena extensão  dos percursos, sempre inferior a 3 m.
Figura 8 - Estacionamento do shopping - situação atual
Figura 9 - Estacionamento do shopping - alternativa de projeto 2
Estudo de caso - estacionamento de campus universitário
No projeto geométrico, mostrado na figura 10, tem-se um canteiro  central que é destinado ao estacionamento. Também são previstas vagas  para parada de veículos, dispostas a 45º, ao longo das duas avenidas que  circundam o canteiro central. Para esse estacionamento é apresentada a  alternativa de projeto 1,mostrada na figura 11,em que se mantém a  posição das duas avenidas, porém substitui-se a pavimentação asfáltica  por piso drenante, nas áreas de parada dos veículos.
Figura 10 - Projeto geométrico de estacionamento; campus
 universitário - situação atual 
Figura 11 - Estacionamento do campus universitário - alternativa de
 projeto 1 
Figura 12 - Estacionamento do campus universitário - alternativa de
 projeto 2 
     
 
     
Estacionamento na habitação
Figura 13 - Estacionamento do campus universitário - situação atual

Na alternativa de projeto 2, a circulação de veículos fica toda  concentrada em um dos lados do terreno,melhorando as condições de  segurança e conforto dos pedestres.Nos bolsões de estacionamento, tanto o  local de estacionamento quanto o de parada dos veículos é executado com  piso drenante. Cria-se um passeio de circulação de pedestres entre as  vagas, de forma a reduzir o percurso do pedestre em piso drenante.
Verifica-se, nas alternativas de projeto para o estacionamento do  campus universitário, a ampliação da área permeável e, simultaneamente,  a ampliação do número de vagas de estacionamento e de árvores  plantadas. A redução da área impermeabilizada implica a redução dos  gastos com pavimentação e com o sistema de drenagem das águas pluviais.  Se for adotada uma solução de piso permeável que tenha custo inferior ao  da pavimentação, pode-se chegar a uma economia significativa, à qual se  somam os ganhos ambientais.
Figura 13 - Estacionamento do campus universitário - situação atual
Nas residências unifamiliares ou nos pequenos grupos de  habitações identifica-se a possibilidade de utilização de estruturas ou  pérgulas, sobre as quais se plantam trepadeiras.
Para dar suporte à planta e também para a proteção dos carros  enquanto as plantas estão em desenvolvimento pode-se fazer a cobertura  da estrutura com tela, tipo sombrite. Esse tipo de tela, que tem preço  da ordem de R$ /m2 evita a queda de galhos, flores, frutos e sujeira  de pássaros. Sua utilização contribui para o sombreamento e reduz os  riscos de impacto associados às chuvas fortes de granizo.
Na direção do paisagismo produtivo, podem ser plantadas espécies frutíferas, como maracujá, tamarindo e lichia americana.
Figura 14 - Estacionamento do campus universitário - alternativa de
 projeto 1 Figura 15 - Estacionamento executado com trepadeiras 
sobre estrutura de madeira 
Pisos que permitem a infiltração da água de chuva no solo

Figuras 16 e 17 - Estacionamentos residenciais em que é feita a
Justificam-se os esforços na direção da mescla entre áreas  permeáveis e impermeáveis, nas áreas de estacionamento, também na  habitação. Pequenas faixas gramadas têm uma eficiência elevada para a  infiltração da água de chuva resultante de chuvas moderadas. Mesmo se  forem limitados os resultados na prevenção das grandes enchentes, existe  um papel importante quanto à recarga dos aqüíferos subterrâneos.
Apresentam-se adiante algumas alternativas de pisos permeáveis, que permitem a infiltração da água de chuva no solo: grama; blocos de concreto vazados com intercalação de pedra ou grama; asfalto ou concreto poroso sobre camada de pedra britada (pavimento permeável); grama sobre colméia plástica;   camada de pedra britada sobre solo.
Figuras 16 e 17 - Estacionamentos residenciais em que é feita a
mescla de superfícies permeáveis e não permeáveis

Figura 18 - Piso de bloco de concreto vazado,
O tratamento de piso chamado "pavimento permeável" é constituído por asfalto ou concreto poroso, executado sobre camada de pedra britada.Na parte superior e inferior da camada de pedra é colocado geotêxtil, para prevenir a sua colmatação. Nesse tipo de piso a água se infiltra pela superfície, fica retida na camada de pedra e gradativamente se infiltra no solo. Estudos realizados pelo IPH (Instituto de Pesquisas Hidráulicas), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, demonstram resultados especialmente promissores para essa solução (Acioli, 2005). Nas análises até então realizadas tem se viabilizado a infiltração no solo de praticamente toda a água de chuva precipitada. A eficácia dessa solução, porém, depende de uma boa manutenção da superfície do pavimento, para garantir que se mantenha sua permeabilidade. Essa manutenção pode ser feita com a utilização de equipamento que aspira a sujeira existente na superfície porosa.
Figura 18 - Piso de bloco de concreto vazado,
A utilização de grama plantada sobre solo, como revestimento da área de parada de veículos, se viabiliza quando é baixa a utilização do estacionamento e a vaga permanece desocupada durante longos períodos.A grama é afetada pelo calor excessivo oriundo do motor do veículo e pelo peso das rodas, que provocam a compressão e abafamento das raízes.Porém,para uso esporádico e ocasional, a solução é possível. Existe a possibilidade de fazer o calçamento do local destinado à roda do veículo, como foi mostrado na figura 17. Esse tipo de solução pode inclusive superar a dificuldade associada à circulação de pedestres que se utilizam de calçado com salto fino,que é uma das limitações relacionadas ao uso de grama nos pisos dos estacionamentos. Identificase a conveniência de realizar um estudo experimental de avaliação do desempenho de grama plantada sobre camada de solo orgânico-brita. Supõe-se que o material orgânico presente nos interstícios da pedra possibilite alimentação para as raízes da grama e que o arcabouço, constituído pela pedra britada,possa absorver e transmitir as cargas das rodas, evitando o esmagamento das raízes. O percentual de pedra britada deve ser da ordem de 70% em peso, para viabilizar a transmissão das cargas oriundas das rodas do veículo através das pedras, permitindo que as raízes da grama se desenvolvam nos vazios existentes entre as pedras, onde se encontra o material orgânico.O piso de bloco de concreto vazado, preenchido com pedra britada ou grama, é uma solução que apresenta como principal limitante o custo de implantação, relativamente alto.
Figura 20 - Pavimento permeável, em que a água infiltrada
no revestimento fica retida temporariamente na base constituída
 por pedra e é gradativamente infiltrada no subleito
A execução de camada de pedra britada sobre o solo é uma solução  relativamente simples e econômica. Dependendo da espessura da camada de  pedra tem-se um efeito semelhante àquele que foi descrito na solução  anterior, de pavimento permeável, ou seja, parte da água precipitada  fica retida na camada de pedra e gradativamente se infiltra no solo.Uma  das dificuldades da solução é a manutenção, em especial as atividades de  remoção da vegetação que se desenvolve nos interstícios da pedra.
Considerações finais
A exemplo do que hoje já acontece em municípios tais como Porto  Alegre, Curitiba, São Paulo e Santo André, deverão se ampliar e  generalizar as exigências de piso permeável e de retenção temporária das  águas de chuva.Na perspectiva de redução das áreas impermeáveis e de  ampliação da infiltração da água de chuva no subsolo identificam-se  possibilidades promissoras de aperfeiçoamento dos projetos dos  estacionamentos. Os estudos até então realizados mostram que este  aperfeiçoamento pode perfeitamente compatibilizar o conforto do usuário,  a redução dos custos e a melhoria das condições ambientais, em especial  no que diz respeito a novos patamares de qualidade paisagística.
 
