sábado, 3 de março de 2012

Ciclista morre atropelada por ônibus na av. Paulista



Bióloga foi 'fechada', afirma testemunha

Juliana Ingrid Dias, 33, era pesquisadora do hospital Sírio Libanês, na Bela Vista, onde trabalhava com células-tronco
Acidente ocorreu a poucos metros do local onde uma outra ciclista foi atropelada e morta em janeiro de 2009


Alessandro Shinoda/Folhapress
Corpo de ciclista morta por ônibus na avenida Paulista
Corpo de ciclista morta por ônibus na avenida Paulista
AFONSO BENITES
EDUARDO GERAQUE

DE SÃO PAULO
Uma ciclista de 33 anos morreu atropelada por um ônibus na manhã de ontem, na avenida Paulista, região central de São Paulo.
Juliana Ingrid Dias, bióloga e pesquisadora do hospital Sírio Libanês, seguia de bicicleta de sua casa, na Vila Mariana, para o trabalho, na Bela Vista, quando o motorista de um carro a "fechou" na avenida Paulista no sentido Consolação. Eram 9h50.
"Ela estava entre a primeira e a segunda faixa da avenida. Quando o motorista do carro a 'fechou'. Ela gritou: 'Cuidado comigo", relatou o estudante Mateo Augusto, 17, que testemunhou o acidente na esquina da avenida Paulista com a rua Pamplona.
Logo na sequência, um ônibus que estava na terceira faixa da direita para a esquerda mudou bruscamente para a segunda faixa e "fechou" a ciclista de novo.
"Ela gritou: 'Olha eu aqui' e gesticulou, o ônibus veio de novo para cima, parecia que queria bater intencionalmente nela, mas ela perdeu o equilíbrio e caiu", afirmou o estudante Augusto, que também é ciclista e é a principal testemunha do acidente.
Quando estava no chão, um segundo ônibus passou com a roda traseira sobre sua cabeça. Juliana morreu na hora. Segundo duas testemunhas e a Polícia Militar, a bióloga ainda foi arrastado por cerca de quatro metros antes do veículo parar. Ela usava equipamentos de segurança, como capacete e colete.
O motorista do ônibus que a atropelou não teve o nome divulgado. Ele disse que não viu a mulher pelo retrovisor, que trafegava lentamente e que só percebeu o acidente quando sentiu o movimento na roda traseira do veículo.
Ao se dar conta do atropelamento, o motorista desceu do ônibus e tentou socorrê-la. Antes, porém, anotou a placa e o prefixo do ônibus que "fechou" a ciclista.
Reginaldo Santos, 36, motorista desse ônibus, foi detido e indiciado sob suspeita de homicídio culposo (sem intenção de matar). Ele pagou fiança de R$ 1.500 e foi solto. A Folha não conseguiu falar com o advogado de Santos.
Após o acidente, ciclistas se deitaram num cruzamento da Paulista, mas foram logo retirados por PMs. À noite, a avenida foi tomada por cerca de 200 de ciclistas.
Eles fecharam a Paulista, caminharam entre a rua da Consolação e a rua Pamplona, acenderam velas, plantaram duas árvores cerejeiras, deixaram flores na calçada e instalaram uma "ghost bike", uma bicicleta branca, no local onde a bióloga morreu.
O acidente que matou Juliana aconteceu a poucos metros do lugar onde outra ciclista morreu, em janeiro de 2009. Na ocasião, a vítima foi a massagista Márcia Regina de Andrade Prado, 40. Lá, também há uma "ghost bike".
Segundo amigos, Juliana era de São José dos Campos, vivia na capital havia um ano e todos os dias ia de casa para o trabalho de bicicleta. Trabalhava com pesquisas de células-tronco e atuava em movimentos ambientalistas.
"Era uma pessoa que queria fazer sua parte para mudar o mundo", disse Luiza Calandra, 26, amiga da ciclista.
Colaborou LEONARDO RODRIGUES

SP não é cidade para bicicletas, diz professor da USP

DE SÃO PAULO
São Paulo não é uma cidade para bicicletas, afirma Jaime Waisman, professor da USP e consultor. Segundo ele, o espaço físico é muito estreito para que as bicicletas disputem em segurança espaço com os carros.
Folha - O trânsito de SP é seguro para as bicicletas?
Jaime Waisman - São Paulo não é cidade para bicicletas. Os cicloativistas vão me matar, mas essa é a verdade. O sistema viário é extremamente congestionado e limitado, o que causa uma briga selvagem para conseguir andar. Nessa briga quem leva a pior? O mais fraco, que são os pedestres e as bicicletas.

É possível conciliar a bicicleta com o trânsito?
Não dá para criar mais espaço, alargar as ruas nem restringir caminhões, carros, vans. São Paulo não tem estrutura para circulação de ciclistas, infelizmente.

E onde os ciclistas podem andar, então?
Em segurança, só em ciclovia ou ciclofaixa. No meio do trânsito, os atropelamentos continuarão acontecendo. Uma solução talvez fosse não estimular as pessoas a não andar em determinadas vias porque ali a probabilidade de morte é muito grande.

Risco é conviver com motorista hostil, diz ativista
DE SÃO PAULO

O risco para o ciclista na cidade de São Paulo não é andar na avenida Paulista ou em outras vias muito movimentadas, mas conviver com motoristas que não aceitam a presença dele, de acordo com Willian Cruz, cicloativista e autor do site "Vá de Bike".
Folha - A avenida Paulista é perigosa para o ciclista?
Willian Cruz - As avenidas de São Paulo são perigosas. Mas a questão é que uma via como a Paulista não tem como o ciclista evitar. Ela é mais plana que as paralelas, que são cheias de subidas.

Há mais riscos?
O perigo maior é o motorista que não aceita a presença do ciclista na rua. Quando ocupamos a faixa do meio na Paulista, pode parecer antipático, mas a nossa segurança aumenta bastante. A bicicleta tem direito de andar na via. Tem muito motorista consciente já, mas ainda temos problemas de levar fechadas e de gente que não respeita a distância de 1,5 metro do ciclista prevista na lei.

Como melhorar a segurança?
Se a prefeitura sinalizasse o solo, pintando um símbolo de bicicleta como a gente fez no passado, ajudaria. E é preciso conscientizar motoristas sobre a presença de ciclistas nas ruas.


Ciclista paulistano enfrenta falta de vias exclusivas e desconhecimento sobre lei

VANESSA CORREA
DE SÃO PAULO
A cidade de São Paulo tem 50,5 km de vias exclusivas para bicicletas abertas todos os dias, para uma população de 11,2 milhões de habitantes e 1,52 mil km² de área.
Se a ideia é oferecer segurança para quem quer se locomover de bicicleta, isso é quase nada.
Cidades como Buenos Aires e Paris, que recentemente intensificaram suas políticas para bicicletas, estão muito à frente.
A capital portenha ganhou nos últimos dois anos quase 70 km de ciclovias. Não parece uma diferença muito grande, mas a população paulistana é quase quatro vezes a de Buenos Aires, vivendo em uma área sete vezes maior.
Paris foi mais longe. Implantou 260 km de ciclovias nos últimos dez anos e chegou a um um sistema de 440 km, em área que é a metade da de Buenos Aires. A meta da cidade europeia é chegar a quase 600 km de vias exclusivas para as bicis até 2014.
'VAI PRA CALÇADA'
Além de não terem um sistema interligado de ciclovias que permita o deslocamento seguro pela cidade, os ciclistas paulistanos sofrem com a ignorância de motoristas sobre a legislação de trânsito.
Pela lei, a bicicleta é um meio de transporte que deve circular na via, na mesma mão que os carros.
Devido à falta de conhecimento, quem usa a bicicleta no dia a dia reclama de ouvir com frequência exclamações do tipo "vai para a calçada".
Outra queixa comum dos ciclistas é a falta de respeito à uma determinação do Código Brasileiro de Trânsito. Pela lei, motoristas devem manter distância mínima de 1,5 metro das bicicletas, inclusive lateral, sob pena de multa.
03/03/2012 - 08h36

São Paulo tem uma morte de ciclista por semana



Um ciclista morre por semana no trânsito da cidade de São Paulo, segundo o último dado disponível da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), de 2010.

A empresa diz que ainda não concluiu a compilação dos dados de 2011.
Foram 49 mortes de ciclistas em acidentes de trânsito em 2010. O número vem caindo: em 2009 houve 61 mortes; quatro anos antes, 93.
"Estamos sofrendo um genocídio", diz a cicloativista Renata Falzoni. Ela não acredita em acidente para o que ocorreu ontem --diz que há um desrespeito constante a artigo do Código de Trânsito Brasileiro que estabelece distância mínima de 1,5 metro dos carros para as bicicletas.
Moacyr Lopes Junior/Folhapress
Manifestantes protestaram ontem (2) na avenida Paulista após uma ciclista morrer atropelada no local
Manifestantes protestaram ontem (2) na avenida Paulista, em SP, após uma ciclista morrer atropelada no local
RECICLAGEM
Segundo a prefeitura, desde maio cursos de reciclagem são promovidos para motoristas de ônibus, que miram o respeito ao pedestre e o compartilhamento da via com ciclistas.
Um motorista que se envolve em acidente é afastado, diz a SPTrans, responsável pelo transporte público na cidade. Se comprovada falha, o condutor é encaminhado para reciclagem. Há 30 mil motoristas na cidade, diz o órgão.
A tendência de as ruas ficarem cada vez mais repletas de bicicletas não mudará, segundo Felipe Aragonez, diretor do instituto CicloBR. E isso é positivo, continua, pois faz os motoristas se acostumarem às bicicletas. É necessário, diz, que motoristas compartilhem a pista e andar em velocidade adequada.
Ele cita o exemplo da avenida Paulista, por onde passaram 733 bicicletas em um dia da semana, segundo pesquisa da CicloBR em 2010.
Arte/Editoria de Arte/Folhapress