Agachadinha evolutiva
Da próxima vez que vires uma galinha ou um peru, lembra-te dos dinos, ó gentil leitor. Em especial quando você estiver se deliciando com a coxa de uma dessas aves domésticas.
Pode parecer maluquice, mas até os detalhes mais bobos da anatomia desses bichos de galinheiro trazem a marca indelével de seus ancestrais do Jurássico ou do Cretáceo. Mais uma pista sobre essa relação foi publicada na edição desta semana da revista científica “Nature” pela equipe cujo líder é John Hutchinson, da Real Faculdade de Veterinária de Hatfield, no Reino Unido. E tem a ver com a postura singular de galináceos e demais aves.
É provável que você nunca tenha parado para pensar nisso, mas a posição das pernas dos nossos amigos de penas é totalmente bizarra. Repare: é como se eles estivessem permanentemente com os joelhos dobrados. Do ponto de vista biomecânico, não faz muito sentido. O gasto de energia seria bem menor se as pernas ficassem retas, tal como as nossas patas de bípedes implumes.
O pensamento evolutivo, no entanto, é ideal para resolver esse tipo de paradoxo. Todos os seres vivos são, em alguma medida, um “puxadinho”, uma solução de compromisso entre a história de seu organismo, que é difícil de mudar e começar do zero, e suas necessidades presentes.
Foi isso que Hutchinson e companhia demonstraram no caso da postura das aves. Sabe-se que a posição “agachada” é, hoje, resultado da cauda curta e dos membros anteriores — mais conhecidos como “asas” — grandalhões. Essas características fazem o centro de massa das aves se deslocar para a frente, o que força a reorganização das patas para aquela postura esquisita. Supunha-se que fosse algo estabelecido quando os ancestrais das aves modernas começaram a voar.
Mas simulações feitas com base em esqueletos de dinossauros indicaram que essa tendência já estava presente em bichos que não voavam, como o célebre Velociraptor da série “Jurassic Park”. Ele também devia andar ligeiramente agachadinho. Primeiro houve um crescimento das patas da frente e, só mais tarde, sua transformação em asas. Para quem sabe inglês, um simpático videozinho colocado no YouTube pela equipe da “Nature” dá mais detalhes sobre a pesquisa.