Instituto Pro Bono critica decisão da OAB/SP de proibir advogados de realizar atendimentos gratuitos a pessoas físicas
http://www.probono.org.br/instituto-pro-bono-critica-decisao-da-oab-sp-de-proibir-advogados-de-realizar-atendimentos-gratuitos-a-pessoas-fisicas?pg=2
A Turma de Ética Profissional do Tribunal de
Ética e Disciplina da Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
reafirmou em ementa aprovada no mês de dezembro e divulgada hoje (06/01/2012) a
decisão de proibir que advogados defendam causas de pessoas físicas sem cobrar
por isso. A medida mantém a prática pro bono restrita apenas ao
assessoramento de Organizações Não Governamentais (ONGs).
O Instituto Pro Bono lamenta a decisão, lembrando
que os serviços do Estado destinado a atender pessoas físicas sem recursos
são insuficientes e que em muitos países a prática da advocacia pro
bono não apenas é legalizada, como é vista como uma ferramenta fundamental
para o acesso à Justiça.
"A OAB deveria estar preocupada em
democratizar o acesso à Justiça entre os mais pobres, e não em manter um
monopólio sobre a pobreza", disse Marcos Fuchs, diretor executivo
do Instituto Pro Bono.
O Instituto Pro Bono foi criado para contribuir
para a ampliação do acesso à Justiça por meio do estímulo à prática da
advocacia pro bono, da assessoria jurídica gratuita, da difusão do
conhecimento jurídico e da conscientização dos profissionais do Direito acerca
da função social da advocacia.
Segundo ementa firmada pela OAB, “a Resolução
Pro Bono destina-se, exclusivamente, a pessoas jurídicas sem fins
lucrativos”. O enunciado determina que os necessitados de assessoria
jurídica sejam encaminhados aos serviços gratuitos existentes, como a Defensoria
Pública do Estado e o convênio com a própria OAB/SP.
........................................................................................
..............A evolução:
NOVOS PARADIGMAS: A BUSCA PELA
SUSTENTABILIDADE JURÍDICA
fonte: http://www.fae.edu/sustentabilidade2008/gestao_social/Adriana%20Accioly%20e%20Roberto%20Bacellar.pdf
autores:
Adriana Accioly Gomes Massa1
Roberto Portugal Bacellar2
RESUMO
O presente artigo se propõe
apresentar novas práticas no âmbito da justiça – justiça
restaurativa e justiça comunitária –
por meio da análise sistêmica, à luz da teoria da
complexidade. Discutem-se ainda,
neste trabalho, os meios, os instrumentos para
aplicabilidade dessas práticas,
utilizando-se dos conceitos de mediação e do capital social.
Pode-se dizer que essas práticas
surgiram da necessidade de uma justiça mais próxima da
sociedade e do povo. Essas práticas
buscam construir meios de promoção de uma justiça
preventiva e restaurativa, em que as
pessoas passam a participar ativamente da resolução de
seus conflitos, prática fundamental
para a cidadania e para o desenvolvimento sustentável
local. A proposta desses modelos é,
também, conseguir a democratização da justiça,
articulando políticas
sócio-jurídicas que viabilizem direitos sociais e que respondam as
demandas sociais locais, por meio da
construção do capital social.
Palavras-chave: justiça; mediação; comunidade;
capital social.
1 Assistente Social do Poder Judiciário do Estado do Paraná.
Especialista em Dependências Químicas e
Terapia Familiar. Mestranda em
Políticas Públicas e Gestão Social do Programa Multidisciplinar em
Organizações e Desenvolvimento da
UNIFAE. E-mail: ago@tj.pr.gov.br
2 Juiz de Direito em Curitiba. Diretor-Geral da Escola da
Magistratura do Paraná. Professor. MBA em Gestão
Empresarial e Mestre em Direito
Econômico Social pela PUC-PR. E-mail: rob@emap.com.br
2
INTRODUÇÃO
A proposta deste artigo é apresentar
projetos que possibilitem uma participação mais
ativa da população na resolução de
conflitos, tornando a justiça uma dimensão mais acessível
à população, com intuito de
proporcionar uma reflexão e fomentar a construção de políticas
sócio-jurídicas que aproximem o
sistema jurídico da realidade social.
Este artigo utiliza como metodologia
uma pesquisa bibliográfica com abrangência
multidimensional, apresentando os
conceitos e as propostas de atuação da justiça restaurativa,
mediação e justiça comunitária,
vistos como novos paradigmas jurídicos, com característica
participativa e visando a
democratização da Justiça.
1 CRISE DO SISTEMA OFICIAL DE
JUSTIÇA: NECESSIDADE DE NOVOS PARADIGMAS
A lógica jurídica contemporânea tem
se mostrado insuficiente frente à complexidade
das relações sociais, bem como,
torna a justiça formal inacessível à população em geral,
principalmente àquelas pessoas que
se encontram em uma situação de vulnerabilidade sócioeconômica.
A importância de mudanças
paradigmáticas, principalmente, no âmbito da justiça, torna-se
fundamental em um mundo globalizado
em que as teias relacionais são cada vez mais complexas.
O direito, então, surge como um
ordenador das relações sociais com o difícil objetivo de
compreender a complexidade das
relações para minimizar os conflitos, na esperança de que as
pessoas, com base no ordenamento
jurídico, compartilhem uma cultura de pacificação social.
A partir do direito e imaginando-se
divergências naturais no cumprimento das normas
e dificuldades humanas de manter em
harmonia a coordenação dos interesses privados,
transparece o papel dinâmico de
distribuir justiça, em outras palavras dar conta da prestação
de uma tutela jurisdicional justa.
Se o direito organiza o social,
ordena o desordenado do conflito presente no âmago da
sociedade. Ora, se o direito surge
do povo e para o povo, o direito não surge do abstrato e,
portanto, o que deve ocorrer para se
ter sistemas juridicamente sustentáveis é fomentar o autoordenamento
do social, respeitando as
diversidades locais, por meio de políticas públicas que
favoreçam a participação para um
certo grau de auto-gestão dos conflitos.
Para Grossi (2006) o direito não é
somente um ordenamento e sim, um ordenamento
observável, daí poderíamos falar da
observância no direito e não da obediência no direito. Pois
a obediência remete a passividade
psicológica, tal como, na medicina o sujeito é o paciente, ou
seja, um agente passivo a todo
conhecimento da medicina. Essa parece ser a lógica
contemporânea, em que há um detentor
da verdade que aplica seu conhecimento a um sujeito
ou uma coletividade passiva,
submissa.
A justiça pode ser considerada,
conforme Rawls, como a primeira virtude das
instituições sociais, como a
verdade. Obstante, o conceito de justiça também está atrelado ao
bem maior partilhado por todos. Nela
há de existir uma identidade de interesses, haja vista que
3
a cooperação social, segundo Rawls, “possibilita
que todos tenham uma vida melhor da que
teria qualquer um dos membros se
cada um dependesse de seus próprios esforços.”
Porém, com o avanço do mundo
moderno, as ciências foram se modernizando cada
dia mais e um traço importante da
modernidade para a ciência é o racionalismo e a
categorização da própria ciência “universal”,
fragmentando-a em saberes especializados e
descontextualizados do todo.
Com um pouco mais de lucidez, após
um período de cegueira em busca de uma
verdade indubitável, começa-se
então, no século XX, a perceber a complexidade da dimensão
jurídica e decursivamente, a crise
do Estado Moderno. Dessa crise, surge uma nova fonte
jurídica, a Constituição,
considerada sua origem emanada do povo constituinte e conforme
Grossi (2006, p.60), “é a imagem da
sociedade que se auto-ordena com base em determinados
valores metajurídicos e do
Estado/aparato que é chamada a submeter-se a eles. A
Constituição realiza, em outras
palavras, o primado da sociedade sobre o Estado.”
As mudanças acontecem e são
fomentadas pela complexidade humana, entretanto,
mudanças paradigmáticas são mais
profundas e não basta criar alternativas sem mudar
paradigmas, é necessário um
pensamento alternativo às alternativas, pois conforme Boaventura
“temos problemas modernos para os
quais não temos soluções modernas” (2007, p.19).
2 ENSAIOS SOBRE NOVOS CONCEITOS DE
JUSTIÇA
2.1 JUSTIÇA RESTAURATIVA
Neste momento histórico, em que os
movimentos inspirados em uma política criminal
humanista são uma tendência
universal, o Brasil caminhava na contramão da história, com a
adoção de leis severas, aumento de
pena, restrição de benefícios aos criminosos e ampliação
das prisões preventivas, em respeito
a um movimento pela lei e ordem (Justiça Retributiva).
Os Juizados Especiais Criminais
Estaduais que prometiam revolucionar o sistema
judiciário com a extinção do
inquérito policial; a implantação da transação penal, da suspensão
condicional do processo, a ampliação
das hipóteses de disponibilidade da ação penal e a aplicação
de medidas alternativas, começam
agora a perceber o quão distantes estavam da população.
Acompanhando o movimento da
novíssima defesa social que defende a
descriminalização e combate o uso
indiscriminado das penas privativas de liberdade e das
prisões preventivas, além da
valorização da vítima, a Justiça Restaurativa emerge como uma
alternativa promissora.
A partir dessa idéia e no contexto
do movimento da novíssima defesa social, analisando
legislação vigente, chega-se à idéia
de uma política criminal humanista que afasta a aplicação de
pena nos delitos de menor potencial
ofensivo de competência dos juizados especiais. Mas ainda
assim, a despeito das elogiáveis
iniciativas implantadas no contexto dos juizados especiais,
percebe-se a falta de atenção
adequada de parte considerável das demandas remanescentes.
4
Se o crime é inerente à sociedade, deve-se
aprender a conviver com ele, procurando
mantê-lo em níveis toleráveis, mas
sem perder de vista a fundamental importância de valorizar
a vítima e a sociedade.
A necessidade de uma justiça mais
próxima às demandas sociais é iminente, sendo
que a justiça é atualmente uma
questão central da proposta de uma democracia participativa.
A tendência à desconsideração dos
aspectos relacionados ao fenômeno da
criminalidade – “resolvidos” pela
sociedade com privação de liberdade, mesmo com
conhecimento da ineficiência do
sistema penitenciário –, faz emergir a necessidade de adotar
políticas públicas integradas e mais
efetivas.
Ao invés de punir o criminoso, a
idéia de reparar ou amenizar os danos gerados pelo
crime e restaurar as relações já vem
sendo construída por meio do que se tem denominado de
Justiça Restaurativa, ou seja, uma
justiça mais próxima aos anseios sociais, e defendida por
vários operadores da justiça, que
acreditam que é possível construir hodiernamente novos
modelos, para que o século XXI seja
o século da justiça e da paz no planeta.
O modo de fazer justiça, em uma
perspectiva restaurativa, consiste em dar uma
resposta às infrações e suas
conseqüências, contando com a participação de todos os
envolvidos, inclusive a comunidade,
na resolução dos conflitos. As práticas de justiça com o
objetivo restaurativo identificam os
males infligidos e influem na reparação dos danos,
envolvendo as pessoas e
transformando suas atitudes. A idéia é restaurar os relacionamentos
ao invés de concentrar-se na
determinação de culpa.
Conforme a Carta de Araçatuba,
elaborada no I Simpósio Brasileiro de Justiça
Restaurativa, realizado na cidade de Araçatuba,
estado de São Paulo - Brasil, nos dias 28, 29 e
30 de abril de 2005,
As práticas restaurativas preconizam
um encontro entre a pessoa que causou um
dano a outrem e aquela que o sofreu,
com a participação eventualmente de
pessoas que lhe darão suporte, caso
assim o desejarem, inclusive de advogados,
assistentes sociais, psicólogos ou
profissionais de outras áreas. Pautada pelo
entendimento de que o envolvimento da
comunidade é fundamental para a
restauração das relações de modo não
violento, o encontro é a oportunidade dos
afetados pelo ato de compartilharem
suas experiências e atenderem suas
necessidades, procurando chegar a um
acordo.
Na Carta de Araçatuba
estabeleceram-se os princípios norteadores do modo de
consecução da justiça, por meio de
práticas restaurativas, que são eles:
1. Plena informação sobre as
práticas restaurativas anteriormente à participação e os
procedimentos em que se envolverão
os participantes;
2. Autonomia e voluntariedade para
participação das práticas restaurativas, em todas
as suas fases;
3. Respeito mútuo entre os
participantes do encontro;
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4. Co-responsabilidade ativa dos
participantes;
5. Atenção à pessoa que sofreu o
dano e atendimento de suas necessidades, com
consideração às possibilidades da
pessoa que o causou;
6. Envolvimento da comunidade
pautada pelos princípios da solidariedade e
cooperação;
7. Atenção às diferenças
sócio-econômicas e culturais entre os participantes;
8. Atenção às peculiaridades
sócio-culturais locais e ao pluralismo cultural;
9. Garantia do direito à dignidade
dos participantes;
10. Promoção de relações equânimes e
não hierárquicas;
11. Expressão participativa sob a
égide do Estado Democrático de Direito;
12. Facilitação por pessoa
devidamente capacitada em procedimentos restaurativos;
13. Observância do princípio da
legalidade quanto ao direito material;
14. Direito ao sigilo e confidencialidade
de todas as informações referentes ao
processo restaurativo;
15. Integração com a rede de
assistência social em todos os níveis da federação;
16. Interação com o Sistema de
Justiça.
Com relação aos princípios básicos
para utilização de programas de Justiça
Restaurativa, em matéria criminal, a
Resolução 2002/12, aprovada na 37ª Sessão Plenária, em
24 de Julho de 2002, pelo Conselho
Econômico e Social das Nações Unidas recomenda a
Justiça Restaurativa para todos os
países.
Está em trâmite, conforme Comissão
de Legislação Participativa, Sugestão nº 99 de
2005, de autoria do Instituto de
Direito Comparado e Internacional de Brasília Projeto de Lei
(Rel. Deputado Leonardo Monteiro),
alterações no Decreto-Lei 2848, de 7 de dezembro de
1940, no Decreto-Lei 3689, de 3 de
outubro de 1941, e na Lei 9099, de 26 de setembro de
1995, viando facultar o uso de
procedimentos de Justiça Restaurativa no sistema de justiça
criminal, em casos de crimes e
contravenções penais.
A idéia de justiça restaurativa
representa um novo paradigma que busca restaurar
relações conflituosas, por meio do
consenso e com a participação da comunidade, amparado
por uma rede social que participa
ativamente na construção de alternativas para resolução de
conflitos. A proposta visa promover
a cura das feridas sociais, dos traumas e das perdas
causados pelo crime.
A justiça restaurativa representa,
também, um modelo para se alcançar a democracia
participativa, uma vez que a vítima,
o infrator e a comunidade participam do processo decisório
a fim de, construtivamente,
satisfazer seus interesses e alcançar a pacificação social.
Esse processo que busca resolver o
problema de fundo do conflito de forma cooperativa
e integrada, em forma de rede
social, amplia as possibilidades de se construir um verdadeiro
Estado Democrático de Direito
Social, empoderando a sociedade e desmonopolizando o papel
do Estado que porquanto atua somente
de forma retributiva.
6
Esse novo paradigma talvez consiga
restabelecer a aproximação entre o direito e a
sociedade que vive, atualmente, o
risco de uma possível separação, por ser o direito uma
dimensão muito distante da
população.
2.2 JUSTIÇA COMUNITÁRIA
A proposta da Justiça Comunitária é
otimizar a conciliação/mediação das partes
envolvidas num conflito, aproximando-se
das demandas sociais locais, mediante a utilização de
métodos alternativos e
não-adversariais, além de disseminar direitos e, principalmente,
construir uma cultura de paz, por
meio da participação comunitária na resolução de conflitos,
visando à emancipação social e
redução da violência.
Nesse modelo de justiça, a sociedade
civil exerce participação direta no que concerne à
solução dos conflitos, pois serão
eleitos, entre os membros, agentes de justiça e cidadania.
Esses agentes serão selecionados,
dentre pessoas interessadas da comunidade que
posteriormente, receberão
capacitação e supervisão de uma equipe especializada (pública ou
privada) para atuar como mediador e
disseminar a cultura de pacificação social. Parcerias
poderão ser construídas com
instituições de ensino, Tribunais, OSCIP, dentre outras instituições.
A Justiça Comunitária é uma proposta
de justiça acessível, mais democrática, com o
intuito de minimizar os conflitos
locais e auxiliar o sistema judiciário a tornar-se mais célere. É
um projeto de acesso à Justiça a
todos os cidadãos, principalmente aqueles que, por diversos
obstáculos sociais, econômicos,
culturais, dentre outros, estão mais distantes da Justiça.
A base da Justiça Comunitária é
proporcionar caminhos mais acessíveis e
participativos, pois não é possível
construir uma justiça mais próxima da comunidade sem a
participação de todos. Para isso é
recomendável a formação de uma rede social entre Estado,
Municípios, sociedade civil e
terceiro setor para a sua melhor efetivação, construindo, dessa
forma, o capital social de
fundamental importância para o desenvolvimento sustentável local.
A justiça comunitária nasce das
discussões em torno de uma proposta de atendimento
mais acessível à população, que
responda as demandas sociais e que possibilite a
democratização da justiça.
A complexidade das relações sociais
presentes na sociedade, o crescimento da
desigualdade econômica, a
concentração e má distribuição da renda, o difícil acesso à justiça,
o desconhecimento dos direitos
sociais de uma parcela significativa da população expande a
situação de vulnerabilidade dos
sujeitos e ocasiona o aumento dos conflitos locais.
A estrutura dos órgãos oficiais de
resolução de disputas não está preparada para
atender a todos os reclamos da
população e nem pode recepcionar a crescente judicialização
das relações sociais.
Diante do aumento desses conflitos,
a justiça oficial não tem dado respostas efetivas
às demandas sociais, ressaltando
assim, o distanciamento construído entre o direito e a
sociedade, além da inoperância do
Estado. Nesse contexto necessário se faz a construção de
novos modelos de justiça, partindo
da democratização, da participação popular, da construção
7
de redes sociais que tornem a
justiça acessível e sustentável. A implementação de um projeto
de Justiça Comunitária poderá
contribuir com o desenvolvimento sustentável da comunidade
que empoderada, esclarecida de seus
direitos e deveres, ciente de suas responsabilidades
será LIVRE, como defende Amartya Sem
(2000), para se desenvolver em condições dignas.
Ressalta-se aqui o fundamento
antropológico comum a todos os princípios constitucionais
inseridos no art. 1º da nossa
Constituição da República que é a dignidade da pessoa humana.
São poucos os estudos sobre justiça
comunitária, destacando-se algumas poucas
experiências no território
brasileiro. Essa proposta teve início no Distrito Federal com apoio do
Ministério da Justiça e Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD. No
Município de São Paulo ocorre uma
elogiável capacitação de mediadores comunitários que
atendem os Centros de Integração e
Cidadania (CIC) localizados em comunidades carentes.
Esses modelos de justiça funcionam
no seio da comunidade e são administrados
localmente por líderes comunitários,
que exerceram o papel de mediadores dos conflitos, além
de educadores e disseminadores da
cultura de pacificação social, por meio do conhecimento
dos direitos sociais e comunitários.
Além de atuar como mediadores de
conflitos, esses agentes comunitários colaboram na
formação e ampliação da rede social
entre Estado, Municípios, sociedade civil e terceiro setor.
Segundo Gláucia Foley (2006), do
Distrito Federal, coordenadora nacional do
programa justiça comunitária, “diante
de um cenário de profunda fragmentação do tecido
social, todas as experiências que
busquem a animação das redes sociais, o estímulo ao
diálogo solidário e a reflexão
coletiva, são indispensáveis”. (Foley, 2006).
A justiça comunitária, portanto,
deve ser interpretada como complementar ao sistema
oficial e ainda, como importante
instrumento de realização de justiça, apto a integrar um projeto
emancipatório. A promoção da
emancipação social, por meio do projeto, redimensiona o direito,
articula-o sob uma nova relação
entre ética e justiça e reconhece desta forma, os indivíduos como
sujeitos de direitos, ou seja,
verdadeiros cidadãos, e protagonistas de sua própria história.
Portanto, um modelo de
desenvolvimento comunitário, sustentado e integrado, precisa
ter as seguintes características,
segundo Neto e Froes (2002):
a) Desenvolvimento de dentro para
fora, valorizando o indivíduo e sua capacidade
para inovar, transformar e
empreender;
b) Desenvolvimento de baixo para
cima a partir da mobilização das pessoas que
vivem em uma comunidade;
c) Ter como referência os potenciais
de cada integrante da comunidade;
d) É centrado nas pessoas e nos
grupos sociais e os vê como os únicos sujeitos
legítimos para seu desenvolvimento;
e) É baseado em valores de
cooperação, partilha, reciprocidade, complementaridade
e solidariedade;
f) Seus principais ativos são as
qualidade humanas e os recursos materiais e
naturais disponíveis na dimensão
local.
8
3 COMO OPERACIONALIZAR OS NOVOS
CONCEITOS? QUAIS OS INSTRUMENTOS
EMPREGADOS?
3.1 MEDIAÇÃO
Como uma primeira noção de mediação,
pode-se dizer que é arte e técnica de resolução
de conflitos intermediada por um
terceiro – mediador (agente público ou privado) – que tem por
objetivo solucionar pacificamente as
divergências entre pessoas, fortalecendo suas relações (no
mínimo, sem qualquer desgaste ou com
o menor desgaste possível), preservando os laços de
confiança e os compromissos
recíprocos que as vinculam (BACELLAR, 2003).
Como arte, a mediação poderá ser
bonita, serena, tranqüila, de acordo como lhe fizer
o artista (mediador). Por isso a
importância de se capacitarem pessoas da comunidade local
estimulando-as a perceber a
fundamental necessidade de estimular a solidariedade e a visão
de interdependência entre seus
membros.
A concretização da mediação, bem
desenvolvida, sempre trará ganhos recíprocos e,
mesmo considerada “a pior” das
hipóteses exteriorizadas na noção preliminar (menor desgaste
possível no relacionamento), ainda é
possível a manutenção da confiança entre os
interessados e a perspectiva de
futuros e promissores relacionamentos.
A mediação pode ser definida como
técnica “lato senso” que se destina a aproximar
pessoas interessadas na resolução de
um conflito e induzi-las a encontrar, por meio de uma
conversa, soluções criativas, com
ganhos mútuos e que preservem o relacionamento entre elas.
Foi possível perceber pela definição
genérica da mediação que é possível em face de sua
amplitude aplicação em causas
diversas (civis, penais, trabalhistas, familiares, condominiais, de
vizinhança) e em locais dos mais
variados. Líderes comunitários, tabeliães, empresários, diretores
de órgãos públicos e ou privados, os
chefes de departamentos, entre outros, poderão valer-se da
técnica para solucionar não só suas
questões internas, como as que surgirem em seus contatos
profissionais externos.
Qualquer pessoa que deseje pode
aprender mediação. O mediador não nasce pronto
e pode ser formado. A prática da
mediação faz os melhores mediadores.
Independentemente do local onde ela
venha a ser aplicada, ressalta como característica
da mediação a busca de um diálogo
assistido por um terceiro (mediador), tendente a propiciar
acordos satisfatórios para os
interessados (por eles desejados), preservando-lhes o bom
relacionamento. Algumas vezes, o
diálogo direto entre as pessoas encontra-se comprometido por
fatores emocionais, como rancor,
insegurança, indiferença, desprezo, ódio, entre outros. Nesses
casos, até que cessem as tensões, a
comunicação entre os contendores fica prejudicada e para
restabelecê-la é fundamental a ajuda
de um terceiro – mediador, que será o ponto neutro, porém
ativo, na inter-relação.
Ao conhecimento teórico necessário à
formação dos mediadores comunitários deve se
somar efetiva atuação em casos
simulados e depois em casos reais.
9
A mediação pode ser um dos
importantes instrumentos para alcançar a restauração de
relações conflituosas, até mesmo,
como vimos, as decorrentes de infrações penais, a fim de
resgatar alto estima da vítima e
despertar mudanças cognitivo-comportamentais por parte do
infrator, bases de uma Justiça
verdadeiramente Restaurativa.
3.2 REDES SOCIAIS E CAPITAL SOCIAL
As redes sociais consistem em um
aglomerado de pessoas de natureza cooperativa.
Pessoas que se reúnem periodicamente
para discutir e propor soluções para os problemas que
afetam seus bairros, distritos ou
localidades. Pessoas que se mobilizam para alcançar o bemestar
coletivo e individual, conscientes
que são elas próprias os atores principais do seu
desenvolvimento.
É somente pela construção de redes
sociais, por meio do esforço coletivo e
cooperativo, que se gera um capital
social para uma sociedade e, que segundo Alva (1997) as
cidades insustentáveis não possuem
essa capacidade endógena de gerar mudanças e de
capital social.
O capital social de uma sociedade é
construído a partir da sua capacidade em
estabelecer laços de confiança
interpessoal e rede de cooperação com vistas à produção de
bens coletivos. Podendo ser
considerado ainda, a acumulação de experiências participativas e
organizacionais que ocorrem em sua
base.
A formação do capital social se dá a
partir da capacidade de uma sociedade em
associar as pessoas por meio da
subordinação de interesses individuais aos coletivos, do
compartilhamento de normas e
valores. Da-se ainda por meio dos conhecimentos e aptidões
comuns e complementares de seu povo,
de objetivos comuns e de disponibilidade de recursos
sociais. Ademais só é possível com a
combinação dos fatores relacionados a seguir.
DIAGRAMA 1 - FATORES ESSENCIAIS PARA
O CAPITAL SOCIAL
FONTE: NETO; FROES (2002)
A organização, participação,
cooperação, solidariedade, confiança e iniciativa constituem
a base de um novo modelo de
desenvolvimento: o desenvolvimento sustentável.
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O centro da questão é o tipo de
relação, de parceria que confere a “capacidade de
comunidade” e decorre, por um lado,
de um padrão de organização social, que deveria estar
presente em regiões ou subconjuntos
da sociedade para que o fenômeno ocorra numa
dimensão social e não apenas
individual ou interpessoal. É este o padrão de rede, na qual se
estabelecem laços horizontais de
interdependência entre seus membros.
Comunidades deveriam ser
redefinidas, a partir desse ponto de vista, como conjuntos
de elementos ligados por
interdependência. Isto é, pessoas conectadas com pessoas, a partir
de um padrão de rede, geram normas e
instituições capazes de consolidar e reproduzir, numa
dimensão social, as virtudes
atribuídas ao Capital Social (FRANCO, 2001, p.57). O Capital
Social, portanto, diz respeito a
virtudes sociais, virtudes encarnadas em coletividades humanas.
Para Franco (2001), o Capital Social
se refere à “capacidade de constituir
comunidades”. Quanto mais
comunidades existirem numa sociedade, mais Capital Social será
produzido, acumulado e reproduzido
socialmente. Comunidades podem ser definidas como
unidades sociais onde existam:
- valores compartilhados;
- sentido de identidade e
pertencimento;
- cultura e atividades econômicas e
políticas comuns;
- coordenação de atividades voltadas
para propósitos coletivos;
- algum grau de autogoverno.
A tendência espontânea para cooperar
entre seres humanos é refreada por sistemas
de hierarquização (materializa uma
atitude de heteronomia diante do poder) e separação entre
inferiores e superiores (política
autocrática – correspondente a uma atitude monárquico-militar
diante da política como modo de
regulação).
Quando temos a hierarquia como forma
de relacionamento e a autocracia como forma
de regulação são os dois obstáculos
à produção, acumulação e reprodução do Capital Social.
É por isso que o Capital Social tem
a ver com poder e com política. (FRANCO, 2001).
Somente uma atitude de autonomia
diante do poder por formas não-hierárquicas de
relacionamento humano e uma relação
democrática diante da política podem favorecer o
Capital Social.
Quanto menos hierarquia e
autocracia, maiores as condições da coletividade humana
constituir-se como COMUNIDADE,
produzindo e acumulando Capital Social e quanto mais se
reproduzirem as relações horizontais
em rede, mais forte será a COMUNALIDADE, que
significa a expressão da comunidade
enquanto entidade socialmente ‘viva’, complexa no
sentido de diversidade,
conectividade e de organização do que há de vivo nos conjuntos
humanos. (FRANCO, 2001).
A ampliação social da cooperação é o
que se chama de Capital Social. Existe uma
propensão básica do ser humano para
cooperar.
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CONCLUSÕES
A pretensão deste artigo é
demonstrar a iminente necessidade de novos paradigmas
sócio-jurídicos, apresentando alguns
modelos de justiça – restaurativa e comunitária, recentemente
construídos, e que tem por
finalidade democratizar a justiça por meio de uma emancipação
sócio-política.
A dimensão jurídica e política são
extremamente relevantes para a sustentabilidade, haja
vista que são essas dimensões que
constroem o ordenamento das relações sociais e para tanto se
faz necessário o entendimento da
complexidade relacional na sociedade contemporânea.
O capital social construído a partir
da emancipação social e comunitária é que gerará a
sustentabilidade social e local, sem
perder de vista as dimensões econômicas, sociais, culturais,
locais, ambientais, éticas,
políticas e jurídicas.
Novos modelos precisam ser
construídos, não mais enraizados apenas na razão e na
verdade absoluta, mas respeitando a
diversidade e complexidade do tecido social, que ainda
apresenta-se como uma “colcha de
retalhos”.
A mudança é necessária bem como o
investimento individual e coletivo, que partindo
do sentimento de
co-responsabilidade, podem construir uma sociedade melhor para se viver
hoje e amanhã, ou seja, mudar a
construção da história humana, implantando uma cultura de
pacificação social.
A pacificação social não tem sido
alcançada no modelo atual e a justiça oficial não tem
dado respostas adequadas aos
interesses decorrentes das demandas sociais. O direito
aplicado pelo operador
técnico-jurídico está longe do direito que emerge da sociedade fazendo
ressaltar a inoperância do Estado em
perceber a realidade.
Só novos modelos de justiça
estabelecidos fora dos paradigmas do ambiente oficial
poderão promover a emancipação e o
desenvolvimento sustentável da comunidade em
condições dignas.
E, finalmente, lembrando Thomas
Jefferson, cabe ressaltar que “é tola uma sociedade
que tenta manter velhas idéias, como
é tolo um homem adulto tentar vestir suas roupas de
criança”.
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