terça-feira, 19 de junho de 2012

Chamado na chincha:"Os ministros não vêm aqui para beber caipirinha e sentar na praia; eles vêm aqui para solucionar problemas e elevar o nível de ambição da conferência"...


Entrega do texto final da Rio+20 é adiada após intensas negociações

Países e ONGs atacam pressão brasileira para fechar documento final antes de cúpula

18 de junho de 2012 | 22h 30


Herton Escobar e Giovana Girardi, enviados especiais ao Rio
Atualizado às 7h02
RIO - Foi adiada para a manhã desta terça-feira, 19, a entrega do documento da Rio+20. Às 2h20 desta madrugada, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, informou aos delegados dos países que o novo rascunho, após a entrega, passará por avaliação em plenária às 10h30. A União Europeia é a delegação mais descontente com o desenrolar das negociações. As informações são da Rádio CBN.
A pressão do Brasil para tentar fechar o documento da Rio+20 antes da reunião de chefes de Estado, que começa amanhã, causou uma enorme insatisfação entre países da União Europeia. Após intensas negociações e a convocação, já no início desta madrugada, de uma plenária que supostamente votaria o texto final da conferência, o mais alto comissário europeu sobre os temas em discussão se mostrou atordoado com o ritmo do processo comandado pelo Brasil.
À imprensa que aguardava na frente do auditório, ele disse que sequer sabia para que tinha sido convocada a plenária. "Não queremos colocar prazo final nas negociações. Vamos discutir o quanto for necessário para ter um texto melhor. Nossa prioridade não é tempo, é conteúdo", disse Janez Potocnik, comissário europeu para o meio ambiente.
A proposta alternativa seria manter o texto em aberto para ser debatido na cúpula de alto nível, com o envolvimento de ministros e chefes Estado. Mais cedo, uma representante da delegação havia explicado o tamanho do problema. "Estamos bastante frustrados com a falta de ambição e de progresso no documento. Mas não desistimos, vamos continuar forçando para ter algo mais concreto", disse ao Estado. "Ouvimos outros grupos, entre eles a sociedade civil, e a impressão que temos é que há um grande distanciamento entre o que o mundo quer e o que o documento está mostrando."
Queixas. Os europeus se ressentem principalmente da falta de objetivos e metas que eles pedem desde o começo das negociações em áreas como energia, água e eficiência no uso dos recursos. Os temas, dizem os delegados, até aparecem no texto, mas não há objetivos concretos. "Fala-se em energia sustentável para todos, mas como, quando?", questionou a representante europeia. Mesmo que não seja possível colocar agora números sobre metas específicas, segundo ela, o documento deveria trazer, ao menos, um direcionamento mais específico sobre elas.
No caso dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), por exemplo, o texto lança um processo de negociação sobre eles, mas não faz referência a nenhum tema específico que deverá ser tratado. O Brasil, porém, estava esperançoso. "Estamos absolutamente certos de que o documento será fechado hoje (ontem) à noite", dizia o embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, chefe da delegação brasileira, em entrevista no fim da tarde.
Com relação ao desejo dos europeus de estender a discussão, comentou: "O que disse para nossos colegas é que, se compararmos a um jogo de futebol, o tempo regulamentar (das negociações) terminou com o fim do comitê preparatório (reuniões que ocorreram entre os dias 13 e 16). Agora estamos na prorrogação e ela nunca tem um tempo mais longo que o jogo propriamente dito. Há um limite de tempo, temos de fechar o texto antes da chegada dos chefes de Estado."
Ambição. Ambientalistas também criticaram a postura brasileira. "Os ministros não vêm aqui para beber caipirinha e sentar na praia; eles vêm aqui para solucionar problemas e elevar o nível de ambição da conferência", disse a coordenadora de Políticas Climáticas do Greenpeace, Tove Maria Ryding. "Esse texto é pior do que poderíamos imaginar. Essa é a hora de o Brasil mostrar liderança, reintroduzir ambição no texto e dar aos ministros uma chance de discuti-lo", afirmou Tove.
Cerca de cem chefes de Estado são esperados para a cúpula de alto nível, que começa amanhã e termina na sexta-feira, encerrando a Rio+20. Rubens Born, da ONG Vitae Civilis, também criticou o que chamou de "tentativa desesperada" dos diplomatas brasileiros de finalizar o documento antes disso.
O texto em questão foi apresentado pela diplomacia brasileira no sábado, como uma tentativa de conciliar posições e acelerar as negociações, que vinham em ritmo lento até então. Ao buscar esse consenso, porém, acabou retirando ou reduzindo a ambição de vários pontos de conflito que eram considerados essenciais para um resultado forte da conferência, especialmente em questões relacionadas ao comprometimento econômico e político dos países ricos com o desenvolvimento sustentável do planeta. "O que vai pegar é quem vai pagar a conta", resumiu ao [BOLD]Estado [/BOLD]um diplomata brasileiro. O texto fala sobre uma série de compromissos, mas não estipula nenhuma obrigação ou prazo específico para resolvê-los.
Em coletiva à imprensa, representantes da ONU afirmaram que, também para a organização, a aprovação do texto brasileiro seria um resultado forte. "O documento representa um passo de mudança para o desenvolvimento sustentável", disse Nikhil Seth, chefe do escritório do secretariado da Rio+20. As decisões da Organização das Nações Unidas têm de ser tomadas por consenso, com a anuência dos 193 países-membros envolvidos na negociação. "Na tradição da ONU, dizemos que um consenso em que todo mundo está igualmente infeliz é um bom consenso. É o denominador comum. No início, grupos tinham mais ambições, posições mais extremas, mas depois todo mundo tem de ceder", disse Nikhil Chandavarkar, chefe de comunicação da conferência. (Colaborou Lourival Sanat'anna)