quinta-feira, 24 de maio de 2012

MMA cria fundo para Unidades de Conservação



A)O Brasil receberá, dia 7 de junho, em em Washington, Estados Unidos, do secretário do Tesouro americano, Timothy Geithner, o prêmio de Projeto de Maior Impacto de Desenvolvimento na Área de Meio Ambiente ao Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa). O anúncio foi feito na tarde desta terça-feira, 22 de maio, Dia Internacional da Biodiversidade, pela vice-presidente da Rede de Desenvolvimento do Banco Mundial, Rachel Kyte, durante o lançamento do Fundo de Áreas Protegidas (FAP) no auditório do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO). O Arpa é um programa coordenado pela Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente e existe há dez anos.


B)
C)O FAP é o primeiro fundo brasileiro criado para apoiar a sustentabilidade financeira, a longo prazo, das Unidades de Conservação (UC) consolidadas pelo Programa Arpa, o Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa). Trata-se de um fundo fiduciário, de caráter permanente, que investe apenas os rendimentos reais do capital depositado, no valor de R$ 115 milhões, na manutenção das UCs.



D)
E)Os recursos são provenientes de doações do governo alemão, de instituições da União Europeia e de entidades brasileiras, e complementam os investimentos do governo federal nas UCs. Serve, também, como um piloto para o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). E as duas primeiras UCs a serem contempladas com recursos do FAP são o Parque Estadual do Cantão (do OEMA Tocantins) e a Reserva Biológica do Jaru (Rebio, do ICMBio, Rondônia). Além desses, um total de 10,8 milhões de euros também permitirá a redução do desmatamento e a conservação da biodiversidade na estação ecológica da região da “Terra do Meio”, no estado do Pará, região Amazônica.

Selva em meio ao desmatamento

Reserva Biológica resguarda floresta exuberante em Rondônia. Decisões para protegê-la são tomadas com moradores da vizinhança

A Reserva Biológica do Jaru tem 353 mil hectares de florestas povoadas por cedros, mognos, castanheiras e seringueiras, onde vivem grandes mamíferos e aves multicoloridas que revoam sobre rios e igarapés. Consolidada com recursos financeiros do Arpa, em Ji-Paraná , Machadinho D´Oeste e Vale do Anari (RO), essa unidade de conservação (UC) é cercada por fazendas, assentamentos de reforma agrária e por cidadezinhas. E todos participam de sua gestão.



Para a preservação da Rebio Jaru, que faz parte do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Programa de Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa), do Ministério do Meio Ambiente, investiu R$ 3,230 milhões, entre 2003 e 2012. Os recursos foram usados para a sua criação e também para ações fundamentais que garantiram a sua manutenção.



A Rebio foi criada pelo Decreto 83.716, em 11 de julho de 1979, protegendo uma área de 293 mil hectares. Até maio de 2006, uma linha seca fazia a divisa da reserva com uma área de 60 mil hectares que seria depois anexada. A ampliação também se deu com a contribuição de recursos do Arpa. A linha traçada apenas no mapa evidentemente seria ultrapassada se não fosse a ampliação, que transformou o rio Machado na atual divisa a oeste da unidade de conservação.

MANEJO
Durante quase 10 anos, os investimentos do Arpa foram aplicados em iniciativas como elaboração de plano de manejo, formação de conselho consultivo com participação de governo e sociedade civil, levantamento fundiário, demarcação, sinalização, apoio a pesquisas científicas, monitoramento permanente do território e financiamento a projetos de desenvolvimento sustentável em comunidades do entorno.
Localizada em um dos estados que integram a lista dos líderes de desmatamento na Amazônia, a Rebio Jaru é uma unidade de proteção integral. Ou seja, é fechada à visitação pública e não é permitido o uso direto de seus recursos naturais. Isso devido principalmente à sua localização entre as bacias do Madeira e Tapajós, uma das regiões brasileiras menos conhecidas cientificamente e apontada como uma das zonas de endemismos na Amazônia Meridional.



A Reserva Biológica do Jaru encontra-se praticamente ilhada em área de grande desmatamento, apenas conectada com as florestas da Terra Indígena Igarapé Lourdes, ao sul, onde habitam os índios Gavião e Arara. A Rebio integra o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (Snuc), Lei 9.985/2000, que representa uma das estratégias nacionais para o cumprimento dos compromissos multilaterais do Brasil para a solução de questões ambientais, entre eles a Convenção sobre a Diversidade Biológica, que visa conter a alteração de ecossistemas.

RESULTADOS
“Antes do Arpa, a reserva era invadida, degradada e havia muitos conflitos sociais”, relata a chefe da Rebio, Simone Nogueira dos Santos. Ela lembra que a mais notória consequência dos investimentos do programa na reserva foi a retirada de invasores, de gado e a ampliação do território da reserva, acrescido de 60 mil hectares, em maio de 2006.



Para anexação dessas terras, que formam uma faixa de 9 km de largura e 100 km de comprimento, foram mais de dois anos de fiscalização, paciência e coragem. Nesse período, a própria Simone Santos e funcionários do ICMBio passaram muitas noites dormindo em barracas no mato e enfrentando ameaças de pessoas que eram contra a manutenção da reserva.



“A primeira atitude do Arpa foi assumir uma barreira de fiscalização que funcionou 24 horas por dia entre maio de 2006 e dezembro de 2008”, conta a chefe da Rebio. Ela conta que a barreira controlava a entrada e saída de pessoas, e proibia que levassem instrumentos agrícolas e defensivos químicos para dentro da área.

VIGILÂNCIA
Durante os dois anos, as diárias de funcionários e até mesmo policiais foram pagas pelo Arpa, para o trabalho de fiscalização, sem qualquer outra fonte de recursos (hoje não se permite o pagamento de diárias de servidores pelo Arpa, mas na época era permitido). O passivo ambiental na faixa de terra que seria anexada era significativo: 6 mil hectares de pastagens, 3,2 mil cabeças de gado e 30 famílias que moravam no local.



“Nosso papel era estrangular a economia que estava se instalando irregularmente na reserva. Conforme o tempo de nossa permanência, os moradores foram retirados. Até que, entre junho de 2008 e janeiro de 2009, finalmente todo o gado foi retirado, pacificamente, do local”, relata Simone.

Redução de queimadas e desmatamento

Um dos indicativos fundamentais dos resultados do apoio do Arpa e da ampliação da Rebio Jaru está nos índices de redução de queimadas e de desmatamento, que se encontravam justamente na faixa de terra que foi anexada à unidade de conservação.



“O desmatamento caiu de 854 hectares em 2006, no ano de ampliação da Rebio, para 51 hectares no ano seguinte”, relata o coordenador de Proteção da Reserva Biológica, Luciano Malanski, analista ambiental do ICMBio. Entre 2004 e 2005, quando iniciou o apoio do Arpa a unidade de conservação, a área desmatada chegava a 1,3 mil hectares de florestas.



O monitoramento vem sendo feito com base no Projeto de Monitoramento do Desflorestamento na Amazônia Legal, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Prodes/Inpe). “Houve uma queda em cerca de 17 vezes, depois da ampliação da UC”, observa.

INCÊNDIO
Luciano Malanski também observa que os focos de calor no interior da reserva, que ele analisa com os dados do Banco de Dados sobre Queimadas, também do Inpe (BD Queimadas), mostram uma inversão abrupta de uma média anual de 45 focos antes da ampliação de seu território para 17,75 focos de calor depois que a área anexada deixou de ter moradores e gado. Aproximadamente 60% menos focos de calor.



Embora os levantamentos mostrem que os índices de focos de incêndio tenham decrescido significativamente, a chefe da Rebio comenta que os números não foram ainda menores porque em 2010 houve um incêndio criminoso de 600 hectares da reserva. “Em 2011 não foram detectados focos de calor no interior da Rebio Jaru. Esses índices refletem a permanente vigilância da unidade por parte da nossa equipe”, ressalta Simone Santos.

Debate com a sociedade

Todos os assuntos que se referem à Reserva Biológica do Jaru são levados ao seu conselho consultivo

A ampliação do território da Reserva Biológica do Jaru foi amplamente discutida com a sociedade de Rondônia, por meio de seu Conselho Consultivo, que trata todos os assuntos que se referem à unidade de conservação. “O conselho consultivo fez parte de todo o processo de ampliação da reserva. Foram realizadas reuniões com todas as instituições para criar uma base forte. Sem isso, acho que não seria possível. Hoje, tudo funciona com base nas discussões do conselho”, relata o conselheiro Vilton Sanchotene Pinto. Ele representa a organização não-governamental Mandala, arte e ecologia, de Ji-Paraná.



Diversas reuniões foram realizadas para a retirada de pessoas da Rebio. Cerca de 19 famílias foram transferidas para o Projeto de Assentamento Florestal Jequitibá, modelo que prioriza o desenvolvimento sustentável da agricultura familiar. As demais pessoas tinham outras opções de residência.

ECOSSITEMA
O Conselho Consultivo da Rebio Jaru foi criado por portaria do Ibama, em março de 2006, para que a unidade de conservação possa cumprir seu papel, que fundamentalmente é a manutenção do ecossistema. E, mesmo sendo uma unidade de proteção integral, a reserva tem ainda como objetivo resguardar os recursos naturais que indiretamente favorecem à toda a sociedade, especialmente as comunidades do entorno.



Esse fórum de debates permanente tem representantes de órgãos do governo federal, como o ICMBio, prefeituras dos municípios de seu entorno e organizações não governamentais, como sindicatos de produtores rurais, de pescadores e universidades de Rondônia. “Todos os atores interagem, e isso dá firmeza para o relacionamento das comunidades com a Rebio”, conta Vilton Sanchotene Pinto. Ele diz que os próprios conselheiros foram preparados para exercer seu papel com eficiência. Foram ainda feitas listas de locais onde cada um realizaria palestras para a conscientização das pessoas a respeito da importância da preservação ambiental.



“Nas palestras, falamos sobre a relação da floresta com as chuvas e com o calor infernal que faz em algumas cidades de Rondônia em que o desmatamento é muito grande. Os pescadores escondiam a tralha de pesca, e nós chamamos os caras para se reciclarem, para entender a importância de não se pescar de modo indiscriminado”, cita Vilton Sanchotene Pinto.

Agricultores conscientes

ICMBio era visto como opressor pelas comunidades, e hoje é parceiro de projetos com visão ecológica. Conselheiros do entorno são consultados sobre todos os investimentos do Arpa na Rebio

O processo de criação da Rebio Jaru, com a retirada de invasores e de gado de seu interior, provocou irritação nos moradores de cidadezinhas e de assentamentos de reforma agrária que vivem na região. Foi preciso um longo trabalho para que eles entendessem os benefícios da conservação da natureza em sua vizinhança.



Um importante personagem para a mudança da mentalidade dos moradores da região foi o secretário de Meio Ambiente da prefeitura do Vale do Anari, que representa o Executivo municipal no Conselho Consultivo da Rebio, Zequiel Santos. O Vale do Anari tem 9.200 habitantes e se situa às margens do rio Machado, em frente à Reserva Biológica do Jaru. Zequiel é apaixonado pela cidadezinha e pela causa ecológica. É historiador e faz doutorado em gestão ambiental. Seu projeto acadêmico trata sobre a criação de um corredor ecológico entre a Rebio Jaru e uma reserva extrativista local.



“No processo de retirada de pessoas e de gado, a imagem da Rebio ficou bem desgastada no município. Os órgãos públicos, como o ICMBio, provocavam medo e representavam a opressão”, conta o secretário de Meio Ambiente. Zequiel Santos relata que umas das iniciativas para mudança dessa situação foi a criação de um viveiro com capacidade para o plantio de 15 mil mudas por safra, no assentamento de reforma agrária Palma Arruda, financiado pelo Arpa. A experiência começou com 10 famílias, e deve ser ampliada.

EDUCAÇÃO
“Os agricultores familiares foram incentivados a recuperar áreas degradadas, a cultivarem sistemas agroflorestais e a cuidarem das margens de igarapés que deságuam no rio Machado. Fizemos palestras sobre educação ambiental nas escolas e conversamos sobre desenvolvimento sustentável na área rural e urbana do município”, conta o secretário.



Zequiel Santos diz que os conselheiros são consultados e o Arpa presta contas de todos os investimentos na Rebio, até sobre ações de fiscalização. Uma das decisões, por exemplo, foi a construção da sede da associação de produtores do assentamento Palma Arruda, que está pronta, à espera de um telecentro com acesso à internet gratuita por meio de parceria entre o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério das Comunicações.



“Agora estamos criando a identidade visual da Rebio, em conjunto, inclusive por videoconferência. Assim, as pessoas passam a fazer parte da reserva e a unidade de conservação deixa de ser vista como entrave”, comenta Zequiel.



MENTALIDADE
O trabalho no Vale do Anari trouxe resultados significativos. “Não ficou nenhuma mágoa. Entendemos a visão ecológica e hoje a gente tem outra cabeça. Hoje nos sentimos privilegiados por morar perto da reserva, e ter aqui um clima melhor, o vento que vem de lá é mais fresco”, exclama Geraldo Ferreira, presidente da Associação de Pequenos Produtores Rurais do Projeto de Assentamento Palma Arruda, que tem cerca de 200 associados.



A mulher dele, Regina Araújo Ferreira, que é também é liderança na comunidade, conta que outra estratégia foi a aproximação com as mulheres por meio de cursos de artesanato com materiais nativos, como folhas da palmeira buriti. “O curso de artesanato abriu as portas para que a gente fizesse palestras. Antes eram só os homens que participavam dos encontros, as mulheres sempre diziam que tinham uma roupa pra lavar, e nunca vinham quando se chamava para as reuniões”, relata Regina. “Elas aprenderam a fazer luminárias, e agora querem mais. Querem novos cursos, pra aprenderem a fazer cestos e peneiras”.



As famílias de agricultores também estão interessadas em novos incentivos para que as mudas nativas possam ser comercializadas. Eles plantam jacarandá, cupuaçu, tamarindo, jatobá, ingá, açaí, entre outras espécies. Geraldo conta que ficaram especialmente interessados no viveiro depois de serem levados para visita ao Projeto Reca (Reflorestamento Econômico Consorciado Adensado), desenvolvido em sistema agroflorestal em municípios entre Rondônia e Acre, que tem cerca de 20 anos de produção e nasceu da necessidade de alternativas de sobrevivência de agricultores, como eles, migrantes de outras regiões e assentados pelo Incra. Hoje o Reca é uma das experiências de produção e preservação ambiental mais bem sucedidas e premiadas do Brasil.

Pesca controlada

O controle da pesca não foi fácil. Pescadores foram obrigados a abandonar a atividade onde mais havia peixes. Mas entendem que vale a pena

Os pescadores também fazem parte do Conselho Consultivo da Rebio Jaru, e participam das reuniões e tomadas de decisões. Depois que passaram a integrar esse fórum de debates, eles mudaram de atitude. Deixaram de capturar espécies indiscriminadamente e entenderam a necessidade de preservarem o ecossistema.
“Se não fosse o controle, acho que não tinha mais peixe no rio Machado”, estima o presidente da Colônia de Pescadores Z9, da região do entorno da reserva, Manoel Batista Dantas. Ele calcula que há dez anos o estoque pesqueiro caiu cerca de 30%, e só depois das restrições começa a se recuperar.



São aproximadamente 180 pescadores profissionais que pescam em média 80 kg por mês cada um. Os principais abates são de pescada, pintado, tambaqui, pacu e jaú. Antes das restrições impostas pela criação da Rebio, eles tinham 280 km livres para a captura, ao longo da divisa ao oeste da reserva, hoje só podem trabalhar na margem esquerda do rio, que é o lado em que o Machado banha as comunidades. Também tiveram que abandonar o melhor local em que trabalhavam, que são 18 km de corredeiras onde se concentra o maior número de cardumes, na extremidade sul da reserva, onde deságua o Córrego Azul, que faz divisa com a terra indígena.

PESCADORES
“Caiu bastante a renda do pescado. E com o desmatamento, as águas do Machado ficaram barrentas. É importante aceitar as regras.



Essa região de corredeiras do Machado e a reserva são o berçário dos peixes. E hoje os pescadores entendem isso. Os peixes estão onde encontram alimentos, e a reserva é importante para a sua alimentação e reprodução”, relata Manoel Dantas.



As restrições à pesca foram feitas com base nas discussões no Conselho Consultivo e também nas legislações que proíbem a captura durante o defeso, período de reprodução, que dura quatro meses, entre 15 de novembro e 15 de março, quando os pescadores recebem seguro do governo federal para compensar os dias parados.
Mas essas datas podem mudar. Devido à observação dos profissionais da pesca, a Universidade Federal de Rondônia (Unir) está desenvolvendo um projeto que poderá alterar o período de defeso. Os estudos, feitos com recursos do Arpa, vão resultar em um diagnóstico sobre ambientes aquáticos e terrestres da reserva.

PESQUISA
“A pescaria fecha em novembro, mas em setembro alguns peixes há estão ovados, como o tucunaré, a pescada, o piau, o pacu. A gente vê isso na hora de limpar, quando encontramos cheio de ovas”, explica Manoel Dantas.



O coordenador da pesquisa, Rinaldo Ribeiro Filho, professor do Departamento de Engenharia de Pesca da Unir, explica que “a época do defeso talvez esteja sendo escolhida de modo errado, pois a base do ordenamento pesqueiro de Rondônia está sendo feita com base em outros estados”.



Rinaldo Filho relata que a pesquisa está em seu sexto mês de coleta e vai diagnosticar as espécies que vivem no local, a sua alimentação e zonas de reprodução. Também será analisada a qualidade da água, com o uso de sondas computadorizadas, e observada a vegetação das matas ciliares. O trabalho será executado em dois anos, com primeiros resultados divulgados ainda em 2012.


Autor: Rondonoticias